Ineficiências provocadas pelas normas: uma reflexão necessária

As normas têm um papel fundamental na sociedade ao moldar comportamentos e influenciar a economia. No entanto, quando mal formuladas, podem gerar ineficiências e impactos negativos no bem-estar social.

Recentemente, publicamos artigo no Instituto Esfera de Estudos e Inovação[1] contendo ensinamentos sobre como evitar ineficiências geradas por normas. Tal conteúdo deve sempre ser difundido de maneira que se mitigue efeitos colaterais indesejados por parte da atuação do Estado.

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As normas são interferências do Estado na sociedade e devem ser justificadas por uma necessidade real, como a correção de falhas de mercado. Quando a intervenção estatal é excessiva ou inadequada, podem surgir efeitos colaterais indesejados, reduzindo a eficiência econômica.

O conceito de estado regulador surgiu para equilibrar o livre mercado e o interesse público, mas enfrenta desafios, como influências políticas e problemas administrativos. O estudo propõe avaliar os impactos das normas e sugerir melhorias para o ambiente negocial.

As falhas de governo ocorrem quando as intervenções estatais criam distorções maiores do que os problemas que deveriam resolver. Isso pode ocorrer por falta de informações adequadas, custos elevados de implementação ou rigidez burocrática.

Na literatura econômica, tem-se o chamado Efeito Peltzman[2], que descreve situações em que regulações geram comportamentos inesperados e contraproducentes. Exemplos históricos no Brasil incluem o Plano Cruzado, que resultou em desabastecimento de produtos, afetando negativamente toda a população.

O abuso regulatório, por sua vez, é caracterizado por normas que restringem a concorrência, impedem inovação e aumentam custos sem justificativa. A Lei 13.874/2019 (Lei de Liberdade Econômica) estabeleceu diretrizes para evitar abusos regulatórios, prevenindo barreiras ao empreendedorismo e ao desenvolvimento econômico.

Os impactos negativos de um ambiente regulatório problemático são evidentes: o Brasil ocupa posições desfavoráveis em rankings de competitividade, transparecendo o prejuízo para o ambiente negocial. Além disso, o custo elevado de conformidade com regulações afeta a produtividade das empresas e reduz a atratividade do país para investimentos.

A legística é um campo de estudo que busca garantir a qualidade das normas, tanto em seu conteúdo quanto em sua formulação técnica. Para evitar falhas regulatórias, é essencial realizar análises prévias (ex ante) sobre a necessidade e os impactos de novas regulações. Nesse sentido, a Análise de Impacto Regulatório (AIR) foi implementada para tornar o processo decisório mais racional e embasado em evidências.

Novas alternativas à regulação tradicional ganham espaço justamente para se evitar os efeitos colaterais negativos das normas. Uma delas é a conhecida soft regulation, que utiliza instrumentos mais flexíveis e menos coercitivos.

O caso da Austrália no início dos anos 2000 é um exemplo bem-sucedido. O governo australiano decidiu na época substituir a regulação de preços das tarifas aeroportuárias por um modelo mais soft. Em um contexto de dificuldades financeiras geradas pelos atentados de 11 de setembro, o governo desregulamentou diversos aeroportos e submeteu sete deles a um regime de “regulação por monitoramento (ou por ameaça)”.

Havia, então, a percepção dos reguladores australianos de que dificuldades informacionais estavam gerando um alto risco de falhas regulatórias, que distorciam decisões das empresas, desestimulando a inovação e os investimentos (falhas de governo).[3] 

No texto publicado no Instituto Esfera, exemplificam-se algumas ineficiências existentes por nomas atualmente em vigência, havendo, portanto, espaço para melhoria:

  • A legislação atual restringe a venda de Medicamentos Isentos de Prescrição (MIPs) a farmácias e drogarias, mas estudos indicam que permitir sua comercialização em supermercados aumentaria a concorrência, reduziria preços e ampliaria o acesso dos consumidores. A regulação da Anvisa já garante a segurança desses medicamentos, tornando injustificável a restrição vigente;
  • Existe a exigência de um leiloeiro pessoa física para a realização de leilões de veículos, conforme norma de 1932. Isso cria um custo desnecessário e reduz a liquidez do mercado. Reformular essa regulamentação permitiria maior eficiência e competitividade no setor;
  • Algumas profissões possuem restrições à publicidade, o que dificulta o acesso dos consumidores a informações e encarece os serviços. Estudos mostram que a flexibilização dessas restrições resultaria em preços mais baixos e maior inovação, beneficiando a sociedade; e
  • A lei que impede o funcionamento de bombas de autosserviço nos postos de combustíveis é obsoleta e impõe custos desnecessários aos postos, impactando o consumidor. A justificativa original de segurança carece de reavaliação diante dos avanços tecnológicos.

Em todos os casos, percebe-se claramente que há oportunidades para reduzir ineficiências, modernizar regulamentações e aumentar o bem-estar da população sem comprometer a segurança ou a qualidade dos serviços.

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Em síntese, a formulação de normas eficazes é essencial para o desenvolvimento econômico do Brasil. Regulações excessivas ou mal planejadas geram custos desnecessários e ineficiências, prejudicando empresas e consumidores.

A solução passa pela adoção de boas práticas regulatórias, como a Análise de Impacto Regulatório e a utilização de regulações mais flexíveis. Ao aprimorar a qualidade normativa e evitar abusos regulatórios, o Brasil pode criar um ambiente de negócios mais dinâmico e competitivo, promovendo o crescimento econômico e o bem-estar social.


[1] MENEGUIN, F. B.; RESENDE, C. C. Ineficiências provocadas pelas normas. São Paulo: Instituto Esfera de Estudos e Inovação. Fevereiro, 2025. Disponível em https://esferabrasil.com.br/instituto-esfera/

[2] PELTZMAN, S. Regulation and the Wealth of Nations: The Connection between Government Regulation and Economic Progress. New Perspectives on Political Economy, v. 3, n. 3, p. 185-204, 2007

[3] RESENDE, C. C.; FONSECA, R. S.; CALDEIRA, T. C. M. Aeroportos competem? Revisão da Literatura e Opções Regulatórias Brasileiras. Revista do Cade, v.4, n. 2, 2016

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