Enquanto aprofunda a bolsonarização de sua mensagem nas redes e nos discursos, Romeu Zema (Novo) compra briga com uma das bases mais fiéis ao ex-presidente Jair Bolsonaro. Ao não prever reajustes para a Polícia Militar este ano, o governador atraiu a fúria dos representantes fardados na Assembleia Legislativa de Minas, que agora ameaçam a renegociação da dívida do estado.
O deputado Sargento Rodrigues, vice-líder do PL, disse que pode obstruir a tramitação do Programa de Pleno Pagamento de Dívidas dos Estados (Propag), que estaria prestes a ser enviado pelo governo, caso o reajuste proposto aos professores não seja estendido aos policiais.
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Este é só um dos casos que governadores que miram o Planalto têm de arbitrar na relação com os servidores, enquanto tentam indicar ao mercado um contraste com o governo Lula.
Com o argumento de que as contas do estado estão comprimidas pela necessidade de pagar parcelas da dívida com a União, Zema não previu reajustes lineares aos servidores neste ano, depois de ter concedido reajustes intermitentes e pequenos desde 2019.
A ponta solta que os policiais tentam puxar é do reajuste obrigatório aos professores, para atender as regras do Fundeb. Eles pedem a equiparação, com argumentos legais e políticos que ganham eco na oposição da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, onde estão os representantes políticos dos professores.
Mesmo para a educação o efeito do reajuste em Minas é atenuado. No estado, a carga horária dos professores é reduzida, e o pagamento do piso nacional é feito proporcionalmente.
Tarcísio divide para conquistar
Em um estado no qual os servidores são proporcionalmente menos relevantes na massa salarial, Tarcísio de Freitas (Republicanos) tenta ganhar dos dois lados. O governo dosa reajustes lineares a servidores apenas para repor a inflação e bate tambor para divulgar aumento real do salário mínimo paulista, que vale para todos os trabalhadores, em especial os privados.
Para dentro do governo, há perdedores e ganhadores, o que divide a capacidade de mobilização.
Os policiais penais, por exemplo, estão há meses em campanha para serem equiparados aos policiais militares em salário e benefícios. E não estão sozinhos: os policiais civis também se sentem deixados para trás em comparação com os colegas fardados, base bolsonarista cortejada pelo governador Tarcísio de Freitas e representada no primeiro escalão pelo secretário Guilherme Derrite.
A insatisfação é maior entre os que não portam armas: professores, base clássica da esquerda, tentam articular paralisação para os próximos dias contra a proposta de reajuste enviada pelo governo. Uma das reclamações é que o índice escolhido para os servidores (5%) é metade dos 10% proposto pelo governo estadual para corrigir o salário mínimo paulista.
O deputado Carlos Giannazi (PSOL) tem usado a tribuna e as redes para denunciar que nem o reajuste inflacionário será feito de forma integral, porque o cálculo teria sido feito com base em índices do início do ano, e o novo valor só passaria a valer um mês depois de aprovado. Ou seja: o governo teria economizado quase meio ano ao empurrar a discussão para maio. A oposição, no entanto, indica ter pouca esperança de unir policiais e professores contra o governo.
Disputa legal
As oposições argumentam, em vão, que governos estaduais desrespeitam a Constituição Federal, que prevê ao menos a recomposição anual da inflação. A interpretação literal do texto já foi superada por sucessivas decisões do STF (como a súmula vinculante 42 e a ADI 4582), que destacaram a autonomia federativa e a necessidade de haver viabilidade orçamentária para reajustes.
A vitória mais recente na Justiça foi do Paraná, governado por outro presidenciável (ou vice-presidenciável), Ratinho Júnior (PSD).
Em abril, a 2ª Turma do STF cassou decisão do Tribunal de Justiça do Paraná que poderia ter impacto de R$ 13 bilhões, nas contas do governo paranaense. Os ministros votaram pela legalidade da suspensão do reajuste anual em 2017, decidida em um momento de crise fiscal.
O enfraquecimento legal dos reajustes anuais em datas-base, em todos os níveis federativos, está na mira de representantes dos servidores públicos. O JOTA apurou que sindicatos elencaram como prioridade para este ano a pressão para que o governo federal encaminhe ao Congresso a proposta de regulamentação da Convenção 151 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
A regulamentação prevê a definição de uma data-base para a negociação anual de reajustes salariais no funcionalismo. O próprio governo Lula, que celebrou no 1º de Maio, reajustes para mais de 1,2 milhão de servidores públicos federais civis da ativa, o fez destacando que a política de recomposição e aumento havia sido abandonada após 2016, o que reforça a fragilidade legal dos servidores diante das mudanças políticas.
Embora o governo federal tenha patrocinado esse debate, por meio de um Grupo de Trabalho que funcionou até meados de 2024, a proposta ainda não foi encaminhada ao Congresso.
O Executivo deseja que a negociação coletiva seja debatida em conjunto com o detalhamento do direito de greve no serviço público. Hoje, os limites para as paralisações acabam sendo definidos pela própria Justiça.