Federação União Progressista é marco do fim da Nova República no Brasil

A federação formada entre União Brasil e o Partido Progressista (PP) marca o fim definitivo da Nova República no Brasil. Isso porque a agora chamada União Progressista reúne os dois braços daquele que foi o partido de sustentação da ditadura militar e cuja ruptura foi fundamental para a transição democrática à brasileira, com a eleição indireta de Tancredo Neves como presidente da República pelo colégio eleitoral em 1985.

O então Partido Democrático Social (PDS), que entre a instituição do bipartidarismo em 1966 e o retorno ao multipartidarismo de 1979 tinha sido a Aliança Renovadora Nacional, acabou por se fragmentar. De um lado, ficou o PDS, que mudaria de nome sucessivas vezes até virar PP. Do outro, a chamada Frente Liberal uniu forças ao então PMDB — menos por apreço à democracia e mais pelo instinto de sobrevivência política — após romper com o regime já nos seus dias finais para apoiar a candidatura de Tancredo.

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Entre os dissidentes, estava José Sarney, ex-presidente do PDS, que viria a ser indicado a vice na chapa vencedora. Por obra do destino — ou da falta de sorte do Brasil — Sarney acabou virando o presidente da República com o falecimento de Tancredo, que adoecera na véspera da posse, marcada para 15 de março de 1985.

A Nova República — período de quatro décadas entre aquele ano e 2025 — caracterizou-se pelo domínio do centro para a esquerda, exceto com as vitórias de Fernando Collor e Jair Bolsonaro nas eleições de 1989 e 2018, respectivamente.

Collor, recentemente preso por corrupção pós-presidência, governou sob uma perspectiva de centro-direita que teve à sombra forças significativas de centro e uma esquerda em ascensão, as quais culminaram no duopólio formado por PSDB e PT nas eleições presidenciais de 1994 a 2014.

Após aquele ano, observamos transformações sociais — notadamente a expansão dos evangélicos — associadas à transformação no modo de fazer política, com redução progressiva da relevância do rádio e da TV à medida que as redes sociais se consolidaram como canal de comunicação. O bolsonarismo, entendido como movimento de extrema direita, surfou nessa onda, vendendo uma noção antissistêmica de política, tendo como alvo-mor a ordem constitucional de 1988.

A ascensão do bolsonarismo eclipsou aquilo que faltava à Nova República: um partido conservador de massas no Brasil, coisa que o PSDB nunca foi. A história, aliás, há de mostrar que tucanos sempre foram centristas que jamais poderiam ter sobrevivido à era de polarização assimétrica entre centro-esquerda democrática e extrema direita.

O PSL, partido pelo qual Bolsonaro chegou ao poder, demonstrava ser essa força de direita com propostas de fato liberais na economia e conservadoras nos costumes. Faltou combinar com o capitão, que não aceitou se subordinar aos liberais e implodiu o partido e ficou sem agremiação política até encontrar guarida no PL, outrora fisiológico e hoje baluarte do golpismo. Por sua vez, o PSL uniu-se aos Democratas (DEM), que era herdeiro do PFL, formado pelos egressos do PDS, conforme explicado acima.

De fato, a reunião daquele que foi o partido de sustentação da ditadura militar pode indicar no primeiro momento uma propensão ao autoritarismo. Este, porém, está hoje representado à direita pelo PL, que hospeda o bolsonarismo, notório por se opor até mesmo a uma noção mínima de democracia, com eleições diretas livres e justas em meio a uma competição multipartidária.

Sempre me lembro de, após Bolsonaro perder para Lula em 2022, Ciro Nogueira, presidente do PP e então chefe da Casa Civil do presidente que buscava a reeleição, sugerir que haveria transição de poder pacífica numa coletiva realizada no Palácio da Alvorada, em que anunciava que a chapa vencedora formaria um governo de transição, e a lei seria cumprida.

Ali, a direita histórica brasileira traçou uma linha clara em relação ao bolsonarismo. Assim, a União Progressista pode ser aquilo que nossa democracia precisa e a Nova República não foi capaz de oferecer: hoje uma federação, quiçá no futuro um partido único de direita conservadora, com posturas liberais na economia em contraponto ao estatismo servido pela ditadura, mas que haverá de respeitar as regras do jogo sem golpismo.

Mais do que uma expressão da sobrevivência política e busca por fundos partidários, a União Progressista assemelha-se a uma resposta democrática — ainda que prenhe de clientelismo — à demanda por um conservadorismo que não se confunde com golpismo. Se tiver aprendido algo com o bolsonarismo no poder, a esquerda poderá descrever essa federação de qualquer forma menos como fascista, alcunha que já foi dedicada aos tucanos. A democracia agradece.

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