Em ofício encaminhado ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, 12 entidades da sociedade civil pediram o veto a dois artigos do PL 4.015/2023, que reconhece as atividades da magistratura e do Ministério Público como de risco permanente. Segundo as entidades, os dispositivos tem como “finalidade real criar obstáculos à transparência sobre a remuneração de membros do Poder Judiciário e do MP e “promoverem retrocessos na transparência e fragilizarem os mecanismos de controle da administração pública”.
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O PL 4.015 teve sua votação definitiva no último dia 8 de abril. Entre outros dispositivos, prevê a possibilidade de medidas protetivas, como escolta, o uso de colete à prova de balas e veículos blindados, trabalho remoto e remoção temporária com apoio logístico para o servidor e seus dependentes, quando houver requerimento fundamentado. Também classifica como homicídio qualificado e crime hediondo o assassinato de juízes, promotores, policiais e outras autoridades do sistema de justiça.
Porém, na avaliação das entidades, dois dispositivos, o artigo 14-A e seu parágrafo único, além do §2º do artigo 52, inserem na Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) “justificativas indevidas para a recusa de acesso a dados remuneratórios de agentes públicos”. O projeto afirma que no tratamento dos dados pessoais dos membros do Judiciário, do MP e dos oficiais de Justiça “sempre será levado em consideração o risco inerente ao desempenho de suas atribuições”.
Também afirma que “qualquer vazamento ou acesso não autorizado que possa representar risco à integridade de seu titular será comunicado à autoridade nacional, a quem competirá, em caráter de urgência, a adoção das medidas cabíveis a fim de reverter ou mitigar os efeitos do incidente.”
Para as entidades, esses dispositivos fazem parte de uma “manobra legislativa que, na prática, reforça o uso equivocado e oportunista da LGPD como instrumento de restrição ao direito de acesso à informação”, consagrado pela Constituição e regulamentado pela Lei de Acesso à Informação. A existência desses dispositivos no projeto de lei foram noticiados pelo jornal O Estado de S. Paulo.
A aprovação do projeto ocorreu em meio às discussões sobre a regulamentação dos pagamentos indenizatórios que podem ficar acima do teto constitucional, e na esteira da aprovação de uma série de pagamentos indenizatórios e, eventualmente, retroativos aos membros da Justiça e do MP.
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Embora os artigos mencionados citem especificamente “membro do Poder Judiciário ou do Ministério Público e de oficial de justiça”, a caracterização de risco permanente foi ampliada na votação no Senado para incluir membros da Advocacia-Geral da União, os procuradores estaduais e do Distrito Federal e os defensores públicos.
As entidades que assinam o ofício sustentam que “o ordenamento jurídico já prevê mecanismos adequados de proteção da segurança de agentes públicos, como a permissão para restringir o ‘acesso a informações nos casos em que sua divulgação possa comprometer a segurança da sociedade ou do Estado, desde que haja motivação específica e análise do caso concreto’”. E complementam: “Por sua vez, a LGPD não se destina a proteger dados com base em critérios de segurança pública, mas sim à proteção da privacidade dos cidadãos, o que torna os dispositivos em questão incompatíveis com a lógica e os objetivos da legislação”.
“É notório que a LGPD tem sido deturpada, por parte de algumas autoridades, para fundamentar negativa de transparência quanto a dados públicos, especialmente no que se refere à remuneração e a benefícios recebidos por agentes estatais. A sanção desses dispositivos agravará ainda mais esse cenário, comprometendo o controle social e a fiscalização cidadã dos gastos públicos”, reforça o documento encaminhado à Presidência.
Subscrevem o ofício a Associação Fiquem Sabendo, a Open Knowledge Brasil, a Transparência Brasil, a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), o Fórum de Direito de Acesso a Informações Públicas, a Plataforma Justa, a República.org, o Movimento Pessoas à Frente, a Associação Livres, o Centro de Liderança Pública, a Transparência Internacional no Brasil e o Instituto OPS.