Conforme é de conhecimento geral, as empresas podem abater da base de cálculo do Imposto de Renda e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) perdas no recebimento de crédito de devedor insolvente. A questão em debate seria entender qual o procedimento que o contribuinte deve seguir para validar essa despesa. Deve esperar 5 anos? Pode se antecipar e já lançar como despesa? Qual procedimento deve seguir? Se não seguir nenhum procedimento e, após o transcurso de 5 anos de inadimplência, já pode tratar como despesa?
O Conselho de Administração de Recursos Fiscais (Carf) vem julgando casos de auto de infração lavrados em virtude de a fiscalização entender como infração as deduções do lucro real, referente a perdas que não atendem aos requisitos exigidos pelo artigo 9° da Lei 9.430/96. O referido artigo 9º dispõe que o contribuinte deve provar que interpôs ação judicial para fazer jus às despesas, conforme será abaixo demonstrado.
Conheça o JOTA PRO Tributos, plataforma de monitoramento tributário para empresas e escritórios com decisões e movimentações do Carf, STJ e STF
Ocorre que muitos contribuintes enfrentam uma realidade de gestão extremamente complexa e burocrática, e entendem que entrar com ação judicial em face de centenas e talvez milhares de devedores evidentemente insolventes seria um custo desnecessário com custas judiciais, advogados e custos com controle gerencial. Nesse cenário, estrategicamente esperam transcorrer os 5 anos, para evidenciar que o crédito não será pago pelo devedor e, com isso, lançam as despesas.
Todavia, a fiscalização federal, dentro de seu legítimo e honrado papel, entende que devem ser lavrados autos de infração para o lançamento de IRPJ e CSLL decorrentes de perda no recebimento de créditos se não forem obedecidos os precisos critérios do artigo 9º , seguindo o entendimento de que para a determinação do lucro real e da base de cálculo da contribuição social sobre o lucro líquido somente podem ser deduzidos como despesas os créditos decorrentes das atividades das pessoas jurídicas para os quais tenham sido cumpridos os requisitos previstos no art. 9º da Lei n° 9.430. de 27 de dezembro de 1996, ainda que vencidos há mais de cinco anos sem que tenham sido liquidados pelo devedor.
No mesmo entendimento da fiscalização, existem decisões do Carf no sentido de que para que haja essa dedução, faz-se necessário que efetivamente haja perdas nessas operações, ainda que essas perdas não sejam definitivas e a comprovação efetiva dessas perdas somente poderia ser realizada por meio do cumprimento do artigo 9º. Ou seja, para a caracterização como despesa, nesse entendimento, há de observar os limites de valores dos créditos não percebidos, o tempo em que as dívidas estejam em aberto e, também, os procedimentos de cobrança administrativa ou judicial exigidos pelo artigo 9º da Lei 9.430/96.
No entanto, com todo respeito, há mais de 5 anos, as glosas de perdas em operações de crédito são justificadas, via Auto de Infração, sob o fundamento de que o contribuinte não observa as condições dispostas no artigo 9º, parágrafo 1º, incisos II, “c” e III da Lei 9.430/96 abaixo transcrito:
Art. 9º As perdas no recebimento de créditos decorrentes das atividades da pessoa jurídica poderão ser deduzidas como despesas, para determinação do lucro real, observado o disposto neste artigo.
- 1º Poderão ser registrados como perda os créditos:
I – em relação aos quais tenha havido a declaração de insolvência do devedor, em sentença emanada do Poder Judiciário;
II – sem garantia, de valor:
- a) até R$ 5.000,00 (cinco mil reais), por operação, vencidos há mais de seis meses, independentemente de iniciados os procedimentos judiciais para o seu recebimento;
- b) acima de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) até R$ 30.000,00 (trinta mil reais), por operação, vencidos há mais de um ano, independentemente de iniciados os procedimentos judiciais para o seu recebimento, porém, mantida a cobrança administrativa;
- c) superior a R$ 30.000,00 (trinta mil reais), vencidos há mais de um ano, desde que iniciados e mantidos os procedimentos judiciais para o seu recebimento;
II – com garantia, vencidos há mais de dois anos, desde que iniciados e mantidos os procedimentos judiciais para o seu recebimento ou o arresto das garantias;
Ora, a existência da ação de cobrança é apenas uma das alternativas para validar a despesa. Seria uma autorização legal de validar a despesa de maneira antecipada, vez que a perda ainda não restaria caracterizada como definitiva na situação tratada pelo artigo nono.
Por outro lado, entendo que o artigo 10, parágrafo 4º, da Lei 9430 tem o condão de substituir os comandos do artigo 9º, parágrafo 1º, incisos II, “c” e III da Lei 9.430/96 após o transcurso do tempo e, com isso, viabilizar a caracterização da despesa mesmo sem a existência de ação judicial de cobrança.
Inscreva-se no canal de notícias tributárias do JOTA no WhatsApp e fique por dentro das principais discussões!
Ora, o artigo 10, parágrafo 4º da Lei 9430 autoriza a baixa DEFINITIVA do crédito registrado contabilmente, quando vencidos 5 anos. O transcurso do tempo é tratado pelo direito como um fator de definição de situações não definidas. A isso se denomina ordem pública.
Ou seja, enquanto não transcorrer o prazo de 5 anos os contribuintes podem utilizar a regra do artigo 9º, parágrafo 1º, incisos II, “c” e III da Lei 9.430/96. As exigências de referido artigo, como a existência de ação judicial, seriam uma maneira de permitir o apontamento como despesa ENQUANTO não transcorrer o período de 5 anos.
APÓS o transcurso do prazo de 5 anos, o contribuinte tem o direito de aplicar a regra do artigo 10, parágrafo 4º da Lei 9430/96 e, com isso, não precisar mais demonstrar a existência de ações judiciais.
Existem vários fundamentos para seguir esse entendimento, e para mim, o maior deles é a questão de Ordem Pública. Ora, se o contribuinte não conseguir recuperar o crédito a seu favor no período de 5 anos, fatalmente não conseguirá mais fazê-lo em face do instituto da prescrição, cujo prazo de 5 anos abrange a maioria dos títulos a serem cobrados.
Com isso, a norma tributária reconheceu essa inviabilidade presumida de recuperação de crédito em face do transcurso de tempo, vindo a liberar o contribuinte do ônus de provar a existência de um debate judicial.
Entendo que a lei (art. 10 da Lei 9.430/96) considera como perda definitiva, e não mais presumida, o crédito vencido há pelo menos 5 anos. A evidência disso é o § 4º do art. 10 da Lei 9.430/96. Este diz que a perda presumida se torna perda definitiva, baixando-se definitivamente o crédito (pelo débito na conta redutora em contrapartida a crédito na conta que registra o crédito.
Poderíamos seguir com mais fundamentos para ilustrar a aplicação da prescrição, mas entendo que não se faz necessário porque, no meu entendimento, e os termos do 10 são claros no sentido de reconhecer a despesas após o transcurso do prazo de 10 anos, senão vejamos a redação vigente na época dos fatos:
Art. 10. Os registros contábeis das perdas admitidas nesta Lei serão efetuados a débito de conta de resultado e a crédito:
I – da conta que registra o crédito de que trata a alínea a do inciso II do § 1º do artigo anterior;
II – de conta redutora do crédito, nas demais hipóteses.
- 1º Ocorrendo a desistência da cobrança pela via judicial, antes de decorridos cinco anos do vencimento do crédito, a perda eventualmente registrada deverá ser estornada ou adicionada ao lucro líquido, para determinação do lucro real correspondente ao período de apuração em que se der a desistência.
- 2º Na hipótese do parágrafo anterior, o imposto será considerado como postergado desde o período de apuração em que tenha sido reconhecida a perda.
- 3º Se a solução da cobrança se der em virtude de acordo homologado por sentença judicial, o valor da perda a ser estornado ou adicionado ao lucro líquido para determinação do lucro real será igual à soma da quantia recebida com o saldo a receber renegociado, não sendo aplicável o disposto no parágrafo anterior.
- 4º Os valores registrados na conta redutora do crédito referida no inciso II do caput poderão ser baixados definitivamente em contrapartida à conta que registre o crédito, a partir do período de apuração em que se completar cinco anos do vencimento do crédito sem que o mesmo tenha sido liquidado pela devedor.
Desta maneira, entendo que o artigo 9º da Lei 9430/96 deve ser aplicado como alternativa de provisão antecipada enquanto ainda existir a possibilidade jurídica do crédito ser cobrado judicialmente. Por sua vez, o artigo 10 reconhece que o transcurso do prazo de 5 anos torna definitiva, por presunção, as perdas. Esse entendimento coaduna com a premissa do direito de harmonizar o contencioso social por meio do transcurso do tempo e, no presente caso, a norma do artigo 10 me parece ser uma norma de reconhecimento de prescrição de cobrança de crédito, uma norma portanto de
Diante o exposto, venho votando, nos julgamentos que participo, no sentido de que o artigo 10 da Lei 9.430/96 permitiu o reconhecimento da dedução das perdas das empresas em face do transcurso do prazo de 5 anos de que trata o parágrafo 4º do artigo 10 de mencionada Lei 9.430/96.
Penso que a legislação dá ao contribuinte o direito de antecipar os efeitos da perda de um devedor seguindo norma rígida no sentido de demonstrar, via exposição judicial, que a relação de recebimento de não recebimento do crédito é ´publica.
Todavia, após transcurso de 5 anos, o não recebimento do crédito passa ser evidenciado pelo próprio transcurso de tempo.
Assine gratuitamente a newsletter Últimas Notícias e receba as principais notícias jurídicas e políticas do dia no seu email
Com isso, a norma tributária, no meu entender, permite que o contribuinte planeje se deseja interpor ação judicial para evidenciar a despesa, arcando, para tal com as despesas do contencioso no Poder Judiciária ou esperar 5 anos que as despesas se evidenciem pelo transcurso do tempo.
Ao contribuinte deve ser dada essa oportunidade de decidir qual caminho seguir. Entendo ser contra o princípio da eficiência concluir que o único caminho seja o de interpor ação judicial de cobrança contra devedor insolvente, visto que na maioria dos casos sabe-se que o devedor não terá condições de pagar o valor devido. Com isso, o objeto real da ação judicial (reaver o valor) deixa de existir. Isso faz nascer além do ônus de custas, honorários de advocados, o dever do contribuinte de fazer a gestão de milhares de ações judiciais, aumentando o trabalho do Poder Judiciário, somente para evidenciar o não recebimento do crédito.