A discussão quanto ao regime prescricional que incide sobre o processo de contas não é tema recente para esta coluna. Desde a decisão do Supremo Tribunal Federal em repercussão geral no RE 636.886, em 2020, em que se afastou a presunção geral de imprescritibilidade da ação de ressarcimento de dano ao erário, a questão evolui e é acompanhada por nós, como aqui, aqui e aqui.
Seria possível supor, inclusive, que a edição da Resolução TCU 344/2022, na qual o TCU cedeu à virada da jurisprudência do STF e regulamentou a incidência da prescrição em seu procedimento, encerraria a discussão. Não foi o que aconteceu. A questão continua viva, com a natural interpretação da resolução pelo próprio TCU e, também, com o controle judicial dessa interpretação pelo Supremo – órgão revisor direto da atividade da Corte de Contas por meio de mandado de segurança.
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E é nesse controle judicial do regime prescricional aplicável pelo TCU em que, hoje, há instabilidade. Aqui, de certo modo, aplica-se a percepção de que nossa Suprema Corte seria composta por 11 ilhas, com a coexistência de diversas correntes jurisprudenciais para a mesma questão.
Há controvérsia quanto a diversos pontos. É possível mandado de segurança contra decisão de citação em processo que já estaria prescrito, ou a medida importaria em supressão da atividade dos tribunais de contas? Qual exatamente é o termo inicial da contagem prescricional: omissão da prestação de contas, ocorrência da ilicitude ou o conhecimento da ilicitude pelo tribunal de contas? É possível a aplicação dos diversos termos interruptivos da Lei nº 9.873/99 mais de uma vez no mesmo processo, ou incidiria o princípio da unicidade prescricional?
Se, por um lado, as turmas do Supremo começam a ser acionadas em agravos regimentais para consolidar essas questões, recentes decisões monocráticas adotadas pelo ministro Edson Fachin[1] acendem um alerta: a complexidade das regras prescricionais do TCU, seja nos termos da Resolução 344/2022, seja na interpretação dada pelo próprio Supremo, pode estar afastando o controle realizado pelo Supremo por meio da via do mandado de segurança.
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Nesses recentes julgados, em juízo de reconsideração após a interposição de agravos regimentais pela União – que, alerta-se, provavelmente ainda serão objeto de apreciação de turma –, o Min. Fachin concluiu que, “à vista de todas essas nuanças que orlam a controvérsia (…), entendo restar inviável sua análise em mandado de segurança, rito no qual é imprescindível a formação de pronta convicção com arrimo em prova pré-constituída acerca do alegado direito líquido e certo, descabendo dilação probatória”.
Em outras palavras: o regime prescricional do processo de contas pode ter se tornado tão complexo, envolvendo questões fáticas que extrapolam o próprio processo de contas (como existência de ação penal ou de improbidade sobre os mesmos fatos), que “a estreita via do writ” seria inadequada. Perde o jurisdicionado, limado de um importante meio de questionamento das decisões do TCU.
[1] Agravo Regimental nos Mandados de Segurança nº 38.502, 38.846, 39.068, 39.523, 38.774, 39.529 e 39.062/DF, do Ministro Edson Fachin