‘Democracia sem igualdade de gênero é um projeto inacabado’, diz Aline Osório

A luta por direitos femininos na política e justiça passa por desafios estruturais que dificultam a equidade de gênero nos espaços de decisão. Nesse sentido, a Casa JOTA debateu no painel “Igualdade como ingrediente da democracia” formas de fortalecer a representatividade feminina no judiciário, garantir igualdade na política e combater retrocessos na democracia. 

O encontro “Mulheres, Justiça e Igualdade”, promovido pelo JOTA e pelo projeto Substantivo Feminino, do YouTube, ocorreu nesta quarta-feira (19/3) e teve como objetivo fomentar debates sobre questões de gênero e temas relevantes da sociedade, tendo como foco a importância da equidade de gênero para uma democracia sólida. O primeiro painel contou com a participação de Aline Osório, secretária-geral do STF; Andréa Maciel Pachá, secretária-geral do TSE; e Karina Natércia Lopes, procuradora da democracia e consultora jurídica da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República.

Para Aline, a democracia sem igualdade de gênero continua sendo um projeto inacabado. Ela aponta que apenas 17,7% dos parlamentares na Câmara dos Deputados são mulheres. Em alguns países da América Latina, essa participação chega a 50% graças ao sistema de lista fechada e ao modelo de alternância de gênero, o que para ela, seria um modelo adequado de participação em espaços de poder. “Nosso desafio é tornar a eleição de mulheres não uma escolha, mas uma consequência do sistema eleitoral”, disse.

Andréa Maciel Pachá, secretária-geral do TSE, ao microfone. Imagem: Romulo Serpa/JOTA

A baixa representatividade feminina também no Judiciário impacta diretamente a agenda pública e a distribuição de recursos. No Brasil, apenas 24% dos desembargadores e 18% dos ministros da justiça são mulheres. 

Karina destacou que a desigualdade de gênero também reflete um momento de recessão democrática, impulsionado pelo crescimento da misoginia online. Ela alertou que as redes sociais se tornaram espaços hostis para as mulheres, dificultando sua participação no debate público e intensificando os ataques aos direitos conquistados. 

“Estamos em um momento de recessão da democracia e impulsionado pela tecnologia digital. As redes sociais têm sido, infelizmente, locais antidemocráticos de discurso de ódio. Precisamos melhorar a comunicação e enfrentar a misoginia online. A igualdade de gênero é estrutural na democracia. A democracia é sempre um edifício em construção”, pontua.

Panfleto do Substantivo Feminino. Imagem: Romulo Serpa/JOTA

A advogada ainda lembrou de uma situação ocorrida no período pós pandemia, quando foi observado um aumento significativo do ingresso de homens na magistratura e uma diminuição elevada de mulheres. Durante a reclusão provocada pelo Covid-19, um levantamento constatou que os homens passaram a trabalhar e estudar mais em casa, enquanto as mulheres tiveram que ter suas atenções divididas entre estudo, trabalho e cuidados da família e do lar, no período. “Acredito que o cenário pode mudar com mais políticas públicas. Sem concretude, não vai poder mostrar na prática que as mulheres são competentes”, afirmou Karina.

Para a juíza Andréa Maciel Pachá, o país ainda está longe de ter um modelo democrático verdadeiro, já que existem obstáculos no próprio sistema eleitoral. Por isso, a magistrada enfatizou que a permanência das mulheres nos espaços de poder é tão importante quanto a conquista inicial desses espaços. 

“Não consigo imaginar um modelo que seja democrático que não tenha a voz e interferência de pessoas que vivem no mesmo grupo social, e estamos a anos-luz disso. Lutamos pela permanência das mulheres nos espaços. Mais do que discursos, precisamos de ações concretas. Precisamos de políticas mais efetivas para garantir a igualdade de gênero no sistema eleitoral. Além disso, o aumento da violência contra as mulheres exige uma resposta firme da sociedade e do Judiciário”, frisou.

Adicionar aos favoritos o Link permanente.