Diversidade não é tirania

A promessa de Donald Trump de pôr fim à chamada “tirania da diversidade”, feita em discurso no Congresso americano, sinaliza um novo e preocupante capítulo na crescente reação contra as práticas ESG – sigla em inglês para ambiental, social e governança.

Nos Estados Unidos, epicentro desse movimento, empresas de grande porte vêm revisitando suas políticas de diversidade, inclusão e sustentabilidade, cedendo às pressões de acionistas, de políticos e de correntes conservadoras que acusam tais agendas de serem excessivamente ideológicas e contrárias aos interesses financeiros.

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Esse retrocesso pode desencadear um efeito cascata global, atingindo também o Brasil e colocando em risco avanços conquistados nas últimas décadas em responsabilidade corporativa.

Gigantes como McDonald’s, Meta, Microsoft, Walmart e Disney já demonstraram sinais de afastamento de suas agendas de Diversidade e Inclusão (D&I). A Microsoft, por exemplo, anunciou no ano passado a demissão de sua equipe de DEI (Diversidade, Equidade e Inclusão), alegando ajustes nas necessidades de negócio. A Walmart, por sua vez, optou por descontinuar treinamentos de equidade racial e retirar critérios de gênero e raça na seleção de fornecedores.

A questão atingiu as gigantes do setor de bebidas, que agiram de forma distinta. Enquanto a Pepsico cortou as metas de representatividade em cargos de gerência ou entre os fornecedores, a Coca-Cola, na contramão e numa resposta direta à concorrente, utilizou seu relatório anual para alertar que os negócios da empresa podem ser afetados de forma negativa se a companhia for incapaz de atrair funcionários que reflitam a diversidade do público que consome seus produtos.

Em um contexto político polarizado, movimentos conservadores intensificaram suas críticas às iniciativas de ESG, acusando as empresas de “wokeismo” ou de focarem em pautas ideológicas em detrimento de resultados financeiros. Além disso, executivos têm enfrentado pressão de acionistas que questionam os custos associados às práticas de diversidade e sustentabilidade, argumentando que tais iniciativas podem comprometer a competitividade.

Decisões assim, além de refletirem um retrocesso, preocupam investidores e acionistas, que reconhecem o valor estratégico de tais práticas. Segundo uma análise publicada pelo The Wall Street Journal, metas relacionadas à diversidade estão desaparecendo dos relatórios anuais de diversas corporações.

No entanto, tal movimento não se limita apenas ao campo social. A urgência climática e os compromissos ambientais também correm risco de serem negligenciados, o que pode trazer graves consequências para empresas e para o planeta.

Em novembro, a COP 30 será realizada no Brasil, colocando o país sob os holofotes do mundo em relação às práticas de sustentabilidade. Para as empresas, esse é o momento de demonstrar compromissos reais com as agendas ESG. Discursos vazios ou iniciativas superficiais serão rapidamente identificados e criticados por consumidores e stakeholders.

O abandono dessas práticas representa um risco significativo para a reputação corporativa. Em tempos de volatilidade econômica e transformações radicais, a confiança do público e a percepção de responsabilidade são mais importantes do que nunca. Empresas que optam por recuar em questões ESG correm o risco de perder a fidelidade de consumidores e investidores. Adotar uma abordagem inclusiva, transparente e alinhada com valores sustentáveis pode diferenciar empresas em mercados altamente competitivos.

Diversidade não é tirania. Mais do que uma tendência, o ESG é um caminho necessário para a sustentabilidade e longevidade dos negócios.

No Brasil, um país marcado por desigualdades estruturais e polarizações políticas, manter o compromisso com essa agenda exige coragem e consistência. Resistir à maré conservadora é uma oportunidade para liderar pela transformação. Negócios verdadeiramente sustentáveis são aqueles que se mantêm fiéis aos seus valores, mesmo em tempos de turbulência. As empresas podem não apenas sobreviver, mas prosperar como agentes de mudança em um mundo que demanda cada vez mais responsabilidade e autenticidade.

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