Apesar de avanços científicos, acesso a novas terapias é grande dilema no Brasil

A medicina tem testemunhado avanços impressionantes na busca por tratamentos inovadores para diversas doenças raras. Entre esses avanços se destacam os que buscam tratar os problemas que atingem o sistema nervoso, como a recente descoberta de um tratamento capaz de atravessar a barreira hematoencefálica e tratar os efeitos neurológicos de uma doença ultrarrara chamada Mucopolissacaridose tipo II (MPS II) ou Síndrome de Hunter.

Progressos como esse representam um marco histórico na medicina. Entretanto, apesar das evidências científicas, essa terapia ainda não está disponível aos pacientes brasileiros devido às longas tramitações regulatórias e às barreiras para o acesso.

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Um dos maiores obstáculos para o tratamento de doenças neurológicas é a barreira hematoencefálica (BHE), comumente conhecida como barreira sangue-cérebro. A BHE é uma estrutura biológica essencial que protege o cérebro de substâncias nocivas, mas que acaba também impedindo que muitos medicamentos administrados por via oral ou injetados na corrente sanguínea alcancem o sistema nervoso central.

Isso atrapalha o tratamento das manifestações neurológicas da MPS II, decorrente da degradação ineficaz de glicosaminoglicanos (GAGs) no sistema nervoso, levando a danos graves e irreversíveis.

Novas formulações de medicamentos, como é o caso de uma terapia aprovada no Japão em 2021 e em via de aprovação no Brasil, demonstraram ser capazes de atravessar a barreira hematoencefálica (BHE) e atuar diretamente no cérebro, reduzindo significativamente os níveis de glicosaminoglicanos no tecido nervoso e reduzindo os impactos neurológicos da MPS II nos pacientes, garantindo uma maior qualidade de vida.

O Brasil participou ativamente de estudos clínicos dessa nova terapia para MPS tipo II, a qual apresentou resultados muito promissores, como destacado em um episódio dedicado para as inovações em doenças raras da plataforma Educare. Os biomarcadores da doença demonstraram uma redução significativa no sangue, na urina e, principalmente, no líquido cefalorraquidiano, indicando que o medicamento de fato atinge o sistema nervoso central, embora seja administrado por via intravenosa. Além disso, há relatos de melhoria na capacidade cognitiva, funções motoras e respiratórias, aumentando a qualidade de vida dos pacientes.

Falta de acesso: primeiro obstáculo a ser superado

Apesar das evidências científicas comentadas, o medicamento ainda não está disponível para a população brasileira, aguardando aprovação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Enquanto isso, pacientes que poderiam se beneficiar dessa terapia continuam a sofrer com o agravamento da doença. O longo processo e os desafios regulatórios impedem que essa revolução científica se traduza rapidamente em melhorias concretas para quem mais precisa.

Observando outras perspectivas e trajetórias, a demora na aprovação de novas terapias não é um problema exclusivo da MPS tipo II. Outras doenças raras também enfrentam desafios semelhantes, em que sabemos que o tempo é um fator crucial. Cada dia sem acesso ao tratamento representa uma perda irreversível de um pouco da sua saúde para pacientes que, muitas vezes, têm uma expectativa de vida já reduzida.

Para que constantemente profissionais e pesquisadores batalhem por tratamentos inovadores é necessário que o avanço da ciência esteja diretamente acompanhado por um ecossistema que garanta que seus benefícios alcancem a sociedade de forma eficaz. A colaboração entre pesquisadores, instituições de saúde, indústrias farmacêuticas, órgãos reguladores e a sociedade civil deveria ser um compromisso primordial para garantir que futuras terapias inovadoras não fiquem restritas às prateleiras da pesquisa e cheguem até seus pacientes.

Batalhar por uma implementação de processos regulatórios mais ágeis para doenças raras, ampliação do acesso via políticas públicas e o incentivo à conscientização são passos essenciais nessa direção. O Brasil tem um papel ativo no desenvolvimento dessas terapias e precisa estar na vanguarda também na garantia de seu acesso.

O conhecimento avança, a tecnologia está disponível, e os resultados são concretos, a ciência está cumprindo seu papel ao desenvolver soluções inovadoras para doenças raras como a MPS II. Agora, o próximo passo é garantir que os frutos da ciência estejam ao alcance de todos os pacientes que deles tanto necessitam. Nenhuma descoberta tem impacto real se não puder ser aplicada na vida de quem precisa.

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