Direitos autorais em 2025: o que esperar

Os debates sobre os direitos autorais efetivamente retornaram à agenda política. Diversas iniciativas regulatórias, nacionais e internacionais, buscam enfrentar os desafios que se acumulam.

Afinal, no Brasil, até recentemente, desde o Marco Civil da Internet e do advento da Lei 12.852/13, que trouxe uma perspectiva de regulação na gestão coletiva destes direitos, nada de fato avançou no plano legislativo. No plano internacional, o último movimento expressivo foi a aprovação do Tratado de Marraqueche na Organização Mundial de Propriedade Intelectual (OMPI) em 2013. 

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A disponibilização dos sistemas de inteligência artificial generativa (IAG), com o lançamento do ChatGPT em novembro de 2022, é representativo deste novo momento tecnológico e catalisador desta renovada atenção. Assim, temas antigos se somam às novas discussões e alimentam um debate essencial, que esperamos ser positivamente encaminhados.

Afinal, quando falamos de direitos autorais, estamos de fato tratando do controle sobre o conteúdo, e a receita, do que é produzido e circula online (e offline). Aqui destacamos alguns dos temas de especial importância para acompanhar em 2025.

Inteligência artificial e direitos autorais

Aprovado no Senado em dezembro de 2024, o PL 2338/23, que regulamenta os sistemas de IA, entra em nova etapa da discussão na Câmara dos Deputados. Todo o debate anterior, ocorrido na Câmara dos Deputados entre 04/02/2020 e 29/09/2021, que resultou no PL 21/2020, foi sumariamente descartado quando chegou ao Senado. O que retorna à Câmara é outro projeto, substancialmente diferente. O capítulo de direitos autorais é uma das novidades.

A regulamentação dos sistemas de IA é complexa, mas urgente e necessária. A incerteza quanto ao funcionamento e profundos impactos sociais, econômicos, políticos e jurídicos antecipam desafios inéditos e oportunidades únicas. 

O temor real da substituição funcional atormenta autores e artistas. Os efeitos sobre as indústrias culturais e criativas não podem ser menosprezados. Ao mesmo tempo, os direitos autorais, ao longo de sua história, sempre estiveram vinculados às inovações tecnológicas, e estes receios não são inéditos, o que não diminui nem sua importância nem sua severidade. 

A pesquisa também sai prejudicada, ao restringir excessivamente quem pode e as fontes de financiamento, impactará negativamente as relações entre universidade e indústria, elemento crucial do ecossistema de inovação vigente.

Sobre os dilemas das interfaces entre IA e direitos autorais, destacamos aspectos que julgamos mais relevantes no estudo Inteligência Artificial e Direitos Autorais: contribuições ao debate regulatório no Brasil que, em síntese, conclui que “os temas trazidos e incorporados ao PL 2338/23 a partir de abril de 2024 são relevantes e em sintonia com os debates regulatórios e iniciativas legislativas em diversas jurisdições. Como toda e qualquer proposta normativa, contém imprecisões, omissões e inadequações. Nenhuma, contudo, que não possa ser superada“.

No entanto, como praticamente todo debate público contemporâneo, enfrenta o problema da desinformação e mistificação, e a discussão corre o risco de ser reduzida a um diálogo sentimental e fundamentalista, ou seja, em um não-diálogo! Neste cenário, criação e inovação se antagonizam e se excluem mutuamente, embora possam, e devam, como mostra a história, compor. 

Vídeo on demand, Condecine e cotas de tela

Aprovado no Senado em 25 de abril de 2024, o PL 2331/22 foi encaminhado para a Câmara dos Deputados em agosto do mesmo ano. Trata de três assuntos diversos: regulamenta o vídeo on demand; estabelece cotas de tela para esta janela de exibição; e amplia a incidência da Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional (Condecine).

Este PL está em análise na Comissão de Cultura sob relatoria da deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ). Ao mesmo tempo, um outro projeto (PL 8.889/17), igualmente busca regulamentar o streaming e está pronto para votação no plenário. Este segundo PL trata especificamente da cota de tela nos serviços de streaming e é bem mais generoso para a produção brasileira, atualmente em alta.

Remuneração residual ou adicional 

No apagar das luzes de 2024, o senador Rodolfo Rodrigues propôs o PL 4.968/24, que altera a Lei de Direitos Autorais (Lei 9.610/98) em aspectos essenciais e declara ter por “objetivo principal do projeto de lei ora proposto é o de garantir uma remuneração, de caráter compensatório, para autores e artistas pela utilização de suas obras, fonogramas, interpretações e execuções no âmbito dos provedores de internet”.

O ideal é nobre e merece aclamação. Mas, como sempre, os detalhes…. e as questões que saltam em cada proposta são: (1) como os reais criadores e artistas serão efetivamente remunerados?; (2) os usos essenciais à criação (educação, preservação, pesquisa, etc.) serão garantidos? 

Sem se esquecer de se perguntar sobre o elemento essencial de qualquer proposta regulatória: quem (que grupos) de fato ganha ou perde com a proposta. Em um rápido olhar, nota-se a gritante ausência do interesse público (educação, pesquisa, preservação, etc.), que deveria estar refletido dentre as limitações e exceções, mas que, foi simplesmente desconsiderado em sua totalidade, como em várias outras propostas regulatórias. 

Fazer esse mecanismo funcionar de fato em favor de autores e artistas, na legislação e na realidade fática, é um desafio, e os ideais, infelizmente, podem se revelar como uma mera ilusão. Existem diversos outros PLs sobre direitos autorais, a ver se haverá tração.

Tratado de Radiodifusão

Parecia morto por inanição, pois a proteção às organizações de radiodifusão está em discussão na Standing Committee on Copyright and Related Rights (SCCR) na OMPI desde a sua primeira reunião, em 1998, a discussão sobre um Tratado de Radiodifusão recebeu renovada energia e, com isso, retornou como elemento central nos debates. Alguns países defendem e esperam que seja encaminhado para aprovação final em conferência diplomática já na próxima reunião da SCCR (46), em abril de 2025. 

Seus efeitos são incertos, pois originalmente cuidava unicamente da renovação da proteção aos sinais das radiodifusões, principalmente as retransmissões ao vivo (shows, esporte, etc.). 

Porém, sem garantias quaisquer de que o domínio público, os usos livres (excessivamente minguados no Brasil, como a preservação, educação e pesquisa) e as obras não protegidas não serão extraídos do uso por todos, este tratado é torna um enorme problema para a cultura e a liberdade de criação. 

Conclusão 

Parece de fato haver um foco político específico direcionado às grandes empresas de tecnologia, que indubitavelmente devem assumir inúmeras responsabilidades em razão dos efeitos de seus produtos e serviços, principalmente quando substitutivos. Rupturas tecnológicas causam estragos em vidas reais, que não podem ser negligenciadas. 

No entanto, nos parece ser preciso refletir a respeito do caso dos direitos autorais e IA mais profundamente, particularmente dos efeitos regulatórios sobre todo o ecossistema, principalmente quanto às pessoas físicas, sejam autores, artistas ou públicos (que é de onde surgem os autores). Afinal, se não for para assegurar a dignidade da vida, em seu sentido pleno, que são sempre por e em razão de pessoas físicas, sobre o que será?

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