Advocacia pública, um projeto constitucional inacabado

Em um discurso de redenção do povo brasileiro, ao promulgar a Constituição de 1988, o presidente da Assembleia Nacional Constituinte, Ulysses Guimarães, abordou conquistas e, acima de tudo, todos os simbolismos que se materializaram no documento. A evolução enquanto sociedade, a consolidação da democracia plena, o fortalecimento das instituições, “a luz ainda que de lamparina na noite dos desgraçados” que a Carta representou. Principalmente, a sua confessa imperfeição e necessidade de atualização, com o passar dos anos.

Um novo país não se fez da noite para o dia. Nossa democracia é um edifício em constante construção e cada geração tem sua missão. A Constituição restaurou a democracia, fortaleceu instituições, estruturou as funções essenciais à Justiça, mas foi o primeiro tijolo de um longo caminho. O texto foi pensado para evoluir conforme as necessidades do país.

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Passados quase 40 anos e 135 emendas constitucionais daquele 5 de outubro de 1988, a advocacia pública se volta ao Parlamento com o intuito de sensibilizar parlamentares diante da importância de se equacionar uma de suas lacunas: a estruturação adequada das carreiras. Responsável pela defesa do Estado e da sociedade, a advocacia pública tem a missão de prevenir desperdícios e garantir que as decisões administrativas sejam tomadas dentro da legalidade.

A gestão orçamentária é um pilar fundamental para o cumprimento dessa missão, vital para a proteção do interesse público. Atualmente, a advocacia pública é a única função essencial à justiça – com o mesmo peso constitucional de todas as outras – que não detém autonomia sobre as próprias contas.

Ela depende do Poder Executivo para definir a alocação de todos os seus recursos. Em outras palavras, as procuradorias dependem de um intermediário para direcionar e investir seus orçamentos, um claro enfraquecimento em comparação com as outras funções essenciais à justiça. Essa autonomia garantiria a eficiência para uma atuação sem amarras, voltada diretamente ao melhor interesse da população.

Os constituintes de 1988 tiveram a nobre missão de reconstruir a democracia brasileira. Desde então, o Congresso Nacional tem complementado esse trabalho, ajustando e regulamentando aspectos fundamentais da nossa Constituição, sendo um agente ativo na modernização das instituições democráticas. Agora, chegou a vez de fazer da advocacia pública um projeto acabado, finalizado.

E a Proposta de Emenda à Constituição 17/2024 faz parte desse processo: ela não cria uma estrutura, mas completa uma lacuna histórica. Ajustes na Constituição são necessários para refletir a realidade administrativa do país e garantir que as instituições desempenhem seu papel de maneira plena. O atual modelo de dependência orçamentária impõe barreiras inaceitáveis ao desempenho eficiente da função pública, prejudicando a própria administração e, por consequência, a sociedade.

O fortalecimento da advocacia pública significa um Estado mais eficiente, transparente e comprometido com o bem comum. Ao garantir autonomia orçamentária às procuradorias, o Brasil dará mais um passo rumo a um modelo administrativo moderno, onde as instituições públicas funcionam com a liberdade necessária para defender os interesses da população.

A história nos mostra que grandes avanços foram conquistados com luta, coragem e visão de futuro. A aprovação da PEC 17/24 será um desses momentos. Pelo segundo ano consecutivo, procuradores federais, dos estados e do Distrito Federal irão à Brasília, em maio, pedir aos congressistas que façam avançar essa proposta. Uma oportunidade de o Congresso Nacional transformar em realidade a advocacia pública desenhada pela Constituição de 1988.

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