Governo ameaça com redução de Imposto de Importação para baratear alimentos e afasta heterodoxias

Depois de assustar o mercado financeiro com a discussão sobre o que fazer com os preços dos alimentos, o governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi mais taxativo nesta sexta-feira (24/1) em dizer que não vai lançar mão de soluções heterodoxas ou que pressionem de forma relevante as contas públicas.

Os ministros da Casa Civil, Rui Costa, da Agricultura, Carlos Fávaro, e do Desenvolvimento Agrário, Paulo Teixeira, conversaram com a imprensa após a reunião com o presidente Lula na qual o tema foi debatido. Além de descartarem subsídios ou desonerações substanciais, anunciaram que o governo pode lançar mão de redução de imposto de importação (um tributo de natureza regulatória e não arrecadatória) para reduzir eventuais distorções de preços que têm competição no mercado internacional, como o milho.

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Esse é um recurso frequentemente utilizado pelos governos para conter altas de preços no mercado interno e é uma medida que faz muito mais sentido do que outras ideias ventiladas, como supermercados populares ou estatização de vales alimentação/refeição.

Costa disse, porém, que a discussão sobre medidas para reduzir custos relativos aos vales (que estão no Programa de Alimentação do Trabalhador) seguem no governo, mas disse que é um tema que ainda está em análise na Fazenda.

Ao JOTA, o diretor-presidente da Associação Brasileira de Benefícios ao Trabalhador (ABBT), Lucio Capelleto, disse que, em meio ao crescimento do debate sobre as taxas cobradas pelas operadores desses vales, o setor deve apresentar ao governo no curto prazo uma proposta para redução de taxas das principais empresas, de forma geral e também, de forma mais específica, para os estabelecimentos que comprarem alimentos originados de agricultura familiar.

O setor também se mostra favorável à interoperabilidade do uso desses cartões nas máquinas de restaurantes e supermercados, o que, em sua visão, vai ajudar a ampliar a competição. Para ele, essas medidas podem ajudar a reduzir preços, mas ponderou que o tamanho do setor e o impacto que a diminuição de taxas pode ter é bem menor do que vem sendo ventilado pelo setor de supermercados.
No fim das contas, a entrevista de Rui Costa e dos demais ministros reforça o cenário de aposta nos impactos da supersafra e da continuidade da queda do dólar para a reversão da alta de preços alimentícios, defendido pela equipe econômica.

Ainda assim, o Planalto avalia que, para conter a perda acelerada de popularidade de Lula e neutralizar a máquina de comunicação da oposição nas redes, o governo precisa pelo menos mostrar que está agindo sobre o que hoje é visto como o maior problema percebido pelos brasileiros.

A preocupação do governo é evidente. Nos Estados Unidos, a alta dos preços foi um fator crucial no desgaste da gestão de Joe Biden, contribuindo diretamente para a derrota de Kamala Harris frente a Donald Trump. O episódio ressalta como a inflação pode ter impactos políticos significativos, um risco que pode se repetir no Brasil em 2026.

A estabilidade de preços é uma “cláusula pétrea” para os eleitores. A história econômica do Brasil, marcada por períodos de hiperinflação, tornou a população especialmente sensível a qualquer sinal de descontrole inflacionário, vendo na estabilidade de preços um dos maiores legados de governos bem-sucedidos.

Dados do instituto Paraná, coletados entre janeiro de 2024 e janeiro de 2025, mostram que, em apenas um ano, a percepção de que os preços das compras de supermercado aumentaram cresceu mais de 17 pontos percentuais.

O aumento do custo de vida, especialmente em itens básicos como alimentos e transporte (está crescente a pressão do mercado e dos importadores por reajuste nos preços dos combustíveis), não apenas gera insatisfação imediata e pressiona a avaliação do presidente, mas também alimenta a narrativa negativa de uma oposição crescente e cada vez mais hostil nas redes sociais.

Por isso, há consenso no Planalto de que superar esse problema é crucial para a estratégia de reconquistar a confiança do eleitor. E, se não há espaço para medidas efetivas, o governo pelo menos tenta mostrar que não vai tolerar abusos e que busca corrigir distorções, enquanto espera os produtos terem seus preços derrubados pela safra e pelo câmbio.

Aprovação de Lula em queda

O consenso das pesquisas aponta que, em dezembro, 46% dos brasileiros aprovavam o presidente Lula, enquanto 47% desaprovavam. Hoje, a aprovação caiu para 44% e a desaprovação subiu para 48%, ampliando o saldo negativo de -1 para -4 pontos. Os dados são do agregador de pesquisas do JOTA, atualizados nesta sexta-feira (24/1).

O movimento sinaliza uma intensificação na perda de apoio ao presidente neste início de ano, mas ainda não representa uma retração significativa, já que o piso de apoio permanece relativamente elevado, próximo da marca de votos totais que o petista recebeu no segundo turno de 2022. Lula foi eleito com 50,9% dos votos válidos, equivalentes a 46,3% dos votos totais do pleito.

Embora o governo tenha oferecido muita munição à oposição neste início de ano, com a crise do Pix e agora no bate-cabeça sobre as medidas para reduzir o preço dos alimentos, a piora nos índices de popularidade reflete uma insatisfação crescente que já vinha ao longo de 2024, intensificada no último trimestre pela alta do dólar e dos preços dos alimentos.

Apesar dessa trajetória de deterioração, é importante ponderar que a base de apoio popular ao governo permanece significativamente elevada.

Nos primeiros anos do mandato, Lula entregou PIB em crescimento, desemprego nos menores níveis históricos e a inflação se manteve em padrão relativamente controlada em termos históricos. Ao fim de 2024, o chamado índice de miséria – soma da inflação e do desemprego – atingiu os menores patamares da história, refletindo exatamente os objetivos que o governo pretendia alcançar.

Mesmo assim, o impacto positivo sobre a popularidade do presidente ficou aquém do esperado. Na verdade, Lula perdeu mais apoio do que conquistou em todos os segmentos do eleitorado nessa primeira metade do mandato, mostra o consenso das pesquisas.

Se o governo já atingiu o auge do ciclo econômico com a expansão fiscal na primeira metade do mandato, mas falhou em aumentar a popularidade presidencial necessária para uma reeleição tranquila, a próxima metade do mandato começa sob um sinal de alerta.

Afinal, 2025 começa com juros em alta e sem espaço para políticas fiscais expansionistas, dado que a recente escalada da inflação precisa ser combatida. Por ora, a equipe econômica acredita que o PIB até deve esfriar e convergir para uma taxa ao redor de 2%, o que não pressionaria de forma relevante o nível de emprego e ajudaria a acalmar a inflação sem maiores prejuízos políticos.

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Mas se a perda de vigor da atividade à frente for mais intensa do que o cenário base e bater com força no desemprego, sem uma contrapartida de queda mais significativa da inflação, o desgaste político tende a ser ampliado. Como o governo vai reagir a uma eventual materialização de um cenário pior é a grande incógnita. Fontes da área econômica garantem que caso a atividade piore mais que o desejado, a inflação deve cair também, o que abriria espaço para queda dos juros pelo BC, sem necessidade de partir para uma expansão fiscal ou parafiscal mais forte. O problema é que a política monetária demora mais que o fiscal para surtir efeito na economia, e a eleição de 2026 estará próxima. Até lá, o governo será permanente escrutinado.

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