O deputado federal Luiz Gastão (PSD-CE), presidente da Frente Parlamentar Católica na Câmara dos Deputados, considera que não faz sentido separar a religião da atividade política. “Se você é católico, você deve levar Cristo em todos os lugares que anda. Você não deixa de ser católico porque está fazendo o seu trabalho. E assim é em todos os lugares, em qualquer ponto, inclusive dentro do Congresso. Sermos cristãos e sermos políticos não tira uma coisa da outra”, afirmou em entrevista ao JOTA.
Gastão é um dos autores do requerimento de voto de pesar na Câmara em memória do Papa Francisco, morto na segunda-feira (21/4). O deputado também integra a comitiva do presidente Lula (PT) que embarcou na noite de quinta-feira (24/4) ao Vaticano para o funeral do pontífice. Para o parlamentar, Francisco deixou um legado enquanto líder político, mas ele discorda de que seja possível rotular sua atuação ou ainda de que haja uma influência do atual contexto geopolítico na escolha do sucessor do Chefe da Igreja Católica.
Conheça o JOTA PRO Poder, plataforma de monitoramento que oferece transparência e previsibilidade para empresas
Especulações em torno do conclave, a reunião do colegiado de cardeais que vota no novo Papa, consideram a influência de questões políticas no processo de escolha. Há quem afirme que o poder econômico e simbólico do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e do seu vice, J.D. Vance, que é católico, pode pesar no ritual. Também está em jogo uma perspectiva de continuidade da atuação do Papa Francisco, que se mostrou mais aberto a temas considerados polêmicos à religião, como aborto, divórcio e homossexualidade.
Mas Gastão rejeita o peso desses aspectos. Para ele, as tensões atuais entre globalismo e soberania nacional, por exemplo, podem moldar o cenário mundial, mas não alteram os fundamentos da Igreja. Ele também discorda de classificações ideológicas ao Papa: “pensar em uma pessoa que daria uma continuidade ao legado de Francisco, não é pensar em termos de conservador ou progressista, mas em alguém que dê continuidade ao legado de Jesus Cristo”.
O deputado considera que o título de “progressista” dado a Francisco está associado à sua atuação “mais humilde”, que “abraçou a todos”, mas, ele diz que a postura do pontífice nunca representou uma “conivência com pecados”.
Para o líder católico na Câmara, os rótulos políticos não alteram a religião. “Existem pessoas que acham que defender a Igreja é defender o mais pobre e outras que acham que defender a Igreja é combater o comunismo. Mas não é. Essas são coisas que não vão mudar a concepção da fé”, afirma.
Católicos no Congresso
A Frente Parlamentar Católica Apostólica Romana foi criada em 2023 na Câmara. Luiz Gastão é presidente desde fevereiro deste ano. O grupo é composto por 192 deputados, majoritariamente de partidos ligados à direta, como PP e PL, mas também tem a subscrição de parlamentares do campo da esquerda, como Sâmia Bomfim (PSol-SP) e Nilto Tatto (PT-SP).
A Proposta de Emenda à Constituição 164/12, chamada por representantes religiosos de “PEC da Vida”, é o projeto mais importante para a frente no momento, segundo Gastão. O texto prevê a garantia da inviolabilidade do direito à vida desde a concepção do feto e não do nascimento. Na prática, a PEC proíbe o aborto no Brasil em situações, hoje, já autorizadas por lei (quando há risco de morte para a gestante, gravidez resultante de estupro e anencefalia fetal). Parlamentares e entidades ligados à esquerda, por sua vez, chamam o projeto de “PEC do Estuprador”.
Em novembro do ano passado, a proposição foi aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara por 35 votos a 15. Dos 50 membros da comissão que votaram, 27 são signatários da Frente Católica. Quase todos foram favoráveis ao projeto. As únicas exceções vieram dos deputados Bacelar (PV-BA), Patrus Ananias (PT-MG) e Laura Carneiro (PSD-RJ). A matéria aguarda instalação de comissão especial temporária para a discussão do tema.
A PEC é também uma prioridade para os parlamentares evangélicos. Além da questão do aborto, o alinhamento entre católicos e evangélicos também está presente em outros temas. “Diria que temos uma convergência de 99%. Tem muito diálogo”, indica Gastão.
Assine gratuitamente a newsletter Últimas Notícias do JOTA e receba as principais notícias jurídicas e políticas do dia no seu email
Há cinco frentes religiosas em atividade no Congresso. A Frente Parlamentar Evangélica, na Câmara, é a maior delas, com cerca de 220 parlamentares e em funcionamento desde 2003. O deputado Gilberto Nascimento (PSD-SP) é o presidente. Instalada na Câmara e com participação de deputados e senadores, há também a Frente Parlamentar Mista Cristã e da Defesa da Religião, presidida por Cezinha de Madureira (PSD-SP).
O Senado também tem uma frente católica, sob o comando de Marcos Pontes (PL-SP), e uma evangélica, coordenada por Carlos Viana (Podemos-MG). Gastão diz que é importante que os grupos religiosos sejam organizados nas duas Casas, já elas que possuem dinâmicas de tramitação e articulação próprias, e que a atividade dele e Marcos Pontes se complementam.
Em comparação aos evangélicos, os católicos demoraram para se organizar formalmente no Congresso. A bancada evangélica na Câmara é, hoje, uma das principais do Legislativo Federal e tem tido destaque no debate político há cerca de 20 anos.
Sobre essa predominância evangélica, Gastão considera que há uma diferença na atuação entre as Igrejas. “Acontece que na Igreja Católica, quando a gente fala em política, você não vê dizendo vote em candidato fulano de tal. A Igreja Católica, em relação à política, tem um posicionamento diferente dos evangélicos”, afirmou. A atuação da Frente, segundo ele, também tem o intuito de desmistificar e incentivar a relação entre católicos e a política.