Recentemente o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região confirmou decisão de primeira instância que validou a conversão de uma dispensa imotivada para uma dispensa por justa causa, diante da falta grave cometida pelo empregado, ato contínuo da comunicação de dispensa[1]. A falta se consubstanciou por dois fatos graves: (i) envio de documentos do empregador para email pessoal e (ii) deleção de documentos no computador até então utilizado.
Infelizmente situações como a retratada no acórdão são bastante corriqueiras.
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Pessoas reagem de diversas maneiras a más notícias e isso vale para os comunicados de dispensa. A depender do perfil, momento pessoal, dentre outras questões, há empregados que reagem extremamente mal ao comunicado de dispensa, mesmo que imotivada e com o pagamento de todas as verbas rescisórias previstas na legislação.
Uma das formas de equivocadamente reagir, no entanto, consiste em prejudicar o empregador e/ou tentar levar consigo aquilo que não lhe pertence.
Toda e qualquer ferramenta de trabalho, disponibilizada para o desempenho das atividades inerentes ao cargo/função, pertence exclusivamente ao empregador. Isso não inclui apenas os bens móveis, como telefone, computador e veículo.
As informações do empregador, contidas em documentos e/ou arquivos, físicos ou eletrônicos, emails, apresentações, assim como os dados dos empregados, clientes, fornecedores, prestadores de serviços, planos de negócios, contratos, projetos, prospecções etc. igualmente não pertencem ao empregado e não podem ser – em nenhum momento contratual, incluindo na dispensa por qualquer motivo – enviados a emails/servidores pessoais e/ou deletados, sem prévia e expressa autorização.
No caso em comento, o empregado, ato contínuo à reunião de desligamento, retornou à sua estação de trabalho e não só enviou emails com documentos da empresa para seu email pessoal, como também deletou emails e documentos que estavam em seu computador.
Ainda que a empresa, muitas vezes, tenha condições tecnológicas para recuperar os documentos deletados, a conduta representa uma falta grave e autoriza a conversão da dispensa imotivada para uma dispensa motivada, com base no arts. 482, alíneas g (violação de segredo da empresa) e h (ato de indisciplina ou de insubordinação) e 491 da CLT.
Este último prevê que o empregado que, durante o prazo do aviso prévio, comete qualquer falta considerada pela lei como justa para a rescisão, perde o direito ao restante do respectivo prazo.
A jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho já se consolidou no sentido de serem indevidas quaisquer verbas rescisórias de natureza indenizatória nesse cenário, tais como férias proporcionais, aviso prévio e a multa de 40% sobre o FGTS (é o teor da Súmula 73: Despedida. Justa Causa. A ocorrência de justa causa, salvo a de abandono de emprego, no decurso do prazo do aviso prévio dado pelo empregador, retira do empregado qualquer direito às verbas rescisórias de natureza indenizatória).
A gravidade do envio de documentos da empresa para o email pessoal também decorre do art. 195 da Lei de Propriedade Industrial, que trata do crime de concorrência desleal e prevê, no inciso XI, que comete o referido crime aquele que divulga, explora ou utiliza-se, sem autorização, de conhecimentos, informações ou dados confidenciais, utilizáveis na indústria, comércio ou prestação de serviços, excluídos aqueles que sejam de conhecimento público ou que sejam evidentes para um técnico no assunto, a que teve acesso mediante relação contratual ou empregatícia, mesmo após o término do contrato.
Por fim e não menos oportuno, a tese defensiva da empresa quanto à correção da justa causa aplicada é ainda mais robusta se restar provado que havia cláusula de confidencialidade no contrato de trabalho ou em políticas divulgadas e assinadas pelo empregado.
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Quanto mais claro estiver para o empregado questões relacionadas a propriedade das informações da empresa; necessidade de confidencialidade sobre todas as informações a que tem/teve acesso durante o contrato e a impossibilidade de copiar, deletar ou manter posse de tais informações (por qualquer meio), sem expresso e prévio consentimento do empregador, melhor será para demonstrar a efetiva violação ao contrato caracterizada pela deleção de documentos (ainda que passíveis de recuperação) ou pelo envio de documentos e/ou emails corporativos para servidor alheio ao do empregador.
Cláusulas contratuais, códigos de conduta, políticas internas (inclusive sobre a necessidade de devolução de todos os bens do empregador, incluindo documentos, sempre que requerido) e treinamentos a respeito do tema auxiliam o empregador na cobrança de boas práticas de seus empregados (a qualquer momento da relação mantida) e na validade da aplicação de medidas disciplinares, quando pertinentes. A depender do caso concreto, outros desdobramentos (incluindo ação de reparação de danos sofridos pelo empregador) podem ser avaliados.
[1] Autos 1000157-21.2024.5.02.0264