O juiz Guilherme Bassetto Petek, da 5ª Vara do Trabalho de Campinas, deferiu, nesta quarta-feira (11/6), um pedido de tutela de urgência proposta pela Associação dos Procuradores dos Correios (Apect) para determinar que os Correios se abstenham de impor o retorno presencial compulsório aos advogados da empresa, representados pela associação, mantendo assim as condições atuais de teletrabalho até decisão definitiva ou revisão. O magistrado fixou uma multa diária de R$ 10 mil em caso de descumprimento da decisão, limitada inicialmente a 30 dias.
Na ação coletiva, a associação questiona a legalidade do retorno compulsório e indistinto ao regime de trabalho presencial, determinado pelos Correios a partir de 23 de junho, abrangendo inclusive os empregados que se encontravam regularmente em teletrabalho.
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Em e-mail datado do dia 12 de maio, a empresa comunicou aos funcionários que, para reverter o cenário de desafios, estaria implementando uma série de estratégias para ampliar receitas e gerar novos negócios, bem como reduzir despesas e reforçar a capacidade de investimentos dos Correios. Dentre as ações, constava justamente a convocação de todos os funcionários para o retorno ao regime de trabalho presencial a partir do dia 23 de junho, com exceção dos que são protegidos por decisões judiciais.
A Apect aponta a violação ao contrato de trabalho e também da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT). Segundo a entidade, a alteração do regime de trabalho remoto para presencial foi feita de forma unilateral, em desrespeito ao artigo 468 da CLT, que veda mudanças lesivas sem consentimento do empregado. Além disso, afirma que o teletrabalho foi implementado mediante instrumentos normativos internos (Manpes) e aditivos contratuais, configurando cláusula contratual mais benéfica.
Também pontua que a revogação do teletrabalho impacta de forma desproporcional trabalhadores vulneráveis, ferindo a Lei Brasileira de Inclusão (Lei 13.146/2015), assim como diz que a decisão administrativa foi tomada de maneira genérica e abrupta, ignorando situações pessoais e familiares dos trabalhadores – e sem apresentar análises técnicas ou justificativas individualizadas para a medida. A associação ainda pede a condenação de indenização por danos morais coletivos no valor de R$ 500 mil.
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Na avaliação de Petek, os Correios impuseram o retorno ao trabalho presencial indistintamente, sem análise das atribuições desempenhadas ou das condições pessoais e familiares dos empregados. De acordo com o magistrado, a alteração do regime de trabalho pode configurar mudança contratual prejudicial ao trabalhador e, como tal, exige o consentimento deste. A modificação unilateral do regime, segundo ele, se realizada sem previsão contratual ou normativa, pode ser considerada ilícita.
Segundo o juiz, documentos juntados nos autos do processo revelaram a inexistência de infraestrutura mínima em unidades dos Correios para acolher os empregados, o que comprometeria a eficiência, a saúde e a dignidade dos trabalhadores. “Ainda que se trate de empresa pública, devem ser observados os princípios atinentes à administração pública”, destacou.
Como exemplo, menciona o Ofício 58365134/2025, enviado pela superintendência estadual de Brasília, em que revela a informação de que a empresa não conta com espaço físico e material suficiente para todos os empregados, de modo que demandaria reforças e compra imediata de material para todos. Na visão do magistrado, a medida vai de encontro ao princípio da eficiência, “sobretudo em se tratando da Empresa Brasileira de Correios que está com déficit financeiro, como amplamente divulgado pela mídia e reconhecido no Ofício Circular 57665450/2025”.
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Assim, observou que, de forma contraditória, este ofício menciona o retorno presencial de todos os trabalhadores como economia. “Entrementes, é de conhecimento notório que o trabalho presencial gera maiores gastos, seja com o uso de equipamentos, seja com pagamento de vale-transporte, seja com uso de energia elétrica etc”, ressaltou.
Petek destacou, ainda, que a imposição genérica poderia violar cláusulas do Termo de Conciliação Judicial firmado com o Ministério Público do Trabalho (MPT). Além disso, lembrou que a jurisprudência dos tribunais é no sentido de restringir a alteração contratual lesiva ao trabalhador, sem o seu consentimento, nos termos do artigo 468 da CLT, para os casos de retorno do teletrabalho para o trabalho presencial.
Por fim, concluiu que “o perigo de dano decorre da iminência da medida (retorno em 23/06/2025), do potencial impacto à saúde física e mental dos substituídos e da instabilidade jurídica gerada pela quebra contratual abrupta, com riscos reais de adoecimento e prejuízo funcional”. Por outro lado, afirmou que a medida não causa impacto irreversível nos Correios, pois apenas mantém a condição atual.
Segundo Muriel Carvalho Garcia Leal, presidente da Apect, a decisão é resultado direto da união dos advogados. “Somente com mobilização conseguimos demonstrar à Justiça a gravidade do cenário e conter o avanço da precarização. A luta agora é seguir juntos para impedir novos retrocessos e pedidos de demissão”, disse ao JOTA.
Para Danila Borges, responsável pela defesa da Apect no caso, a decisão do magistrado vai além de manter o teletrabalho: ela reconhece o grave quadro de adoecimento já existente entre os advogados da empresa, marcado por sobrecarga, transtornos psíquicos e precarização. “A medida dos Correios foi uma tentativa velada de pressionar por demissões, criando um ambiente insustentável. A liminar evita esse cenário e dá um fôlego necessário aos profissionais”, afirmou.
Procurados, os Correios não retornaram ao contato do JOTA até o fechamento desta reportagem.
A ação coletiva tramita sob o número 0011163-76.2025.5.15.0092 no Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (TRT15).