Fiesp desiste de ser amicus curiae no STF em processo sobre alienação de controle

A Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) retirou o pedido feito ao Supremo Tribunal Federal (STF) no mês passado para ser admitida como amicus curiae na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7.714, sob relatoria do ministro André Mendonça. A ação, proposta pela Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), questiona a interpretação feita pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) do artigo 254-A da Lei das Sociedades por Ações (Lei 6.404/1976), que trata da obrigação de realização de oferta pública de aquisição (OPA) em casos de alienação de controle de companhias abertas. 

A desistência se deu “por razões supervenientes à formalização do seu pedido”, segundo o documento apresentado ao Supremo. A Fiesp era a única a se manifestar no Supremo a favor da interpretação do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que ampliou o entendimento acerca de alienação de controle, e, por consequência, acerca da necessidade de realização de Oferta Pública de Ações (OPA) para acionistas minoritários. 

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A interpretação expansiva da corte veio em uma reviravolta na longa batalha judicial entre a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) e a Ternium, siderúrgica italiana, que disputam a interpretação do dispositivo legal no caso Usiminas. Com a decisão do STJ em embargos de declaração, a CSN levou a vitória, apesar das decisões anteriores tanto do Judiciário quanto da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) terem sido no sentido contrário.

Contatada acerca dos motivos da desistência, a Fiesp não retornou. O espaço segue aberto. Segundo reportagem do Valor Econômico, a decisão se deu depois de uma reunião com associados da Fiesp na última segunda-feira (9/5), quando a maioria se posicionou pela saída da federação do processo, por preocupações em relação à segurança jurídica de fusões e aquisições.

O que é discutido no processo no STF

Na solicitação ao Supremo, a Fiesp defendia a constitucionalidade do artigo 254-A e afirmava que o conceito de controle deve abranger tanto a transferência formal quanto a “de fato”. “A imposição da OPA a posteriori pelo art. 254-A da LSA […] é indispensável para minimizar as distorções do mercado de capitais nacional, caracterizado por baixa dispersão acionária e concentração de controle”, sustenta.

“A tentativa de flexibilizar ou esvaziar o alcance desse dispositivo legal […] coloca em risco não apenas os direitos dos acionistas minoritários, mas também a credibilidade do marco regulatório societário brasileiro”, argumenta a Fiesp no documento. Segundo a federação, o artigo 254-A é um “pilar de proteção dos investidores minoritários” que garante isonomia em operações de mudança de controle e impede manobras societárias artificiais.

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Além disso, a Fiesp também defendia que a ADI deve ser extinta sem julgamento de mérito. A federação sustentava que a AEB não possui legitimidade para ajuizar ações de controle concentrado de constitucionalidade. “A pluralidade heterogênea de seus associados impede qualquer pretensão de representatividade classista coesa”, segundo a Fiesp.

Saídas do processo

Não é a primeira vez que um amigo da corte pede para sair do processo. Em outubro, a Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan) protocolou um pedido de desistência. Segundo a coluna de Guilherme Amado, no site Metrópoles, a entidade desistiu de participar como amicus curiae após diretores da Firjan se reunirem com representantes da CSN, incluindo o advogado Walfrido Warde.

Durante a reunião, a CSN teria apresentado evidências de que era associada a um sindicato que, por sua vez, estava vinculado à Firjan.  Ao Metrópoles, a assessoria do advogado afirmou que “Warde jamais fez qualquer pressão ou pedido à Firjan, e poderá prová-lo. Essa é mais uma tentativa desesperada de instrumentalizar a jurisdição constitucional e a Suprema Corte. Warde continuará a exercer suas prerrogativas com fidelidade, destemor e fidalguia”.

Participam do processo como amigos da corte: Associação de Terminais Portuários Privados, Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais, Confederação Nacional dos Transportes, Associação Comercial e Empresarial de Minas Gerais e Previdência Usiminas. 

Entenda o caso

O caso remonta à aquisição de ações da Usiminas em 2011 pela Ternium. A controvérsia é se essa operação configuraria uma alienação de controle acionário, obrigando a realização de uma oferta pública de aquisição (OPA) aos acionistas minoritários (condição da CSN na Usiminas), como definido pelo artigo 254-A da Lei das S.A.

Em 2023, a 3ª Turma do STJ, por 3 votos a 2, negou o recurso especial da CSN na disputa com a ítalo-argentina, confirmando o entendimento das outras instâncias e da CVM. No entanto, em junho, uma mudança de composição na turma que apreciou o caso – provocada pela morte do ministro Paulo de Tarso Sanseverino e pela declaração de impedimento de Marco Aurélio Bellizze, que havia votado no mérito – foi determinante para a decisão favorável à CSN com a indenização

No mesmo julgamento, foram decididos honorários advocatícios de 10% do valor do proveito econômico, ou seja, de aproximadamente R$ 500 milhões a serem pagos aos advogados da CSN, que é representada por diversos escritórios, como o Warde Advogados, Ernesto Tzirulnik Advocacia e pelo ex-ministro do STJ Cesar Asfor Rocha. 

A decisão foi reformada em dezembro, quando a 3ª Turma do STJ acolheu parcialmente os embargos de declaração apresentados no caso. O colegiado manteve a decisão, mas modulou os efeitos de julgados anteriores, alterando critérios para a apuração do valor indenizatório de estimados R$ 5,5 bilhões para cerca de R$ 3,1 bilhões (R$ 1,9 bilhão a ser pago pela Ternium Investments, R$ 0,7 bilhão a ser pago pela Ternium Argentina, subsidiárias do Grupo Ternium envolvidas no processo, e R$ 0,5 bilhão a cargo da Tenaris). O valor dos honorários também foi reduzido de R$ 500 milhões para R$ 5 milhões.

Em setembro, a AEB protocolou no STF uma ADI para questionar a interpretação do STJ sobre o artigo 254-A. A associação argumenta que a decisão sobre o tema, feita no caso da Ternium e CSN, é inconstitucional e “frontalmente divergente em relação àquela fixada pela CVM [Comissão de Valores Mobiliários] no exercício de sua competência”.

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