A Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove) protocolou no Supremo Tribunal Federal (STF) uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) contra a Lei 12.475/2025, do estado do Maranhão, que estabelece critérios para a concessão de incentivos fiscais e concessão de terrenos públicos para empresas do setor agroindustrial, com o objetivo de promover a livre iniciativa, o desenvolvimento dos municípios e a redução das desigualdades sociais e regionais. A ADI 7823 é de relatoria do ministro Edson Fachin.
A lei maranhense proíbe benefícios fiscais e a concessão de terrenos públicos a empresas que participem de acordos, tratados ou quaisquer outras formas de compromissos – nacionais ou internacionais – que imponham restrições à expansão da atividade agropecuária em áreas não protegidas por legislação ambiental específica, ou que restrinjam mercado a toda produção de propriedades rurais que operam legalmente.
Esta reportagem foi antecipada a assinantes JOTA PRO Tributos em 3/6. Conheça a plataforma do JOTA de monitoramento tributário para empresas e escritórios, que traz decisões e movimentações do Carf, STJ e STF
Segundo a Abiove, a norma é a versão do Maranhão de leis de outros estados, envolvidos na “verdadeira cruzada de proprietários rurais em áreas do Bioma Amazônico contra o selo verde da moratória da soja”. Para a associação, embora a lei não mencione explicitamente a “moratória da soja”, é contra esse “selo verde” que ela se volta. Assim, afirma que a lei ocasiona perda de competitividade do produto maranhense e obstrução ao desenvolvimento econômico e social dos municípios.
A moratória da soja, conforme ilustra a Abiove, é um programa multissetorial firmado em julho de 2006 pelo Poder Executivo, sociedade civil e entidades, recomendando a não comercialização de soja produzida em áreas desmatadas do bioma Amazônico após 22 de julho de 2008. Ou seja, trata-se de uma certificação ambiental, ou “selo verde”, que atesta o atendimento a práticas sustentáveis e de menor impacto ambiental. “É evidente, portanto, que a moratória da soja viabilizou o crescimento da oferta de soja no mercado – e especialmente da soja produzida na própria Amazônia”, afirma.
Desse modo, sustenta que, por meio da lei, as empresas comercializadoras de soja que participam da mencionada “moratória da soja” passaram a estar proibidas de ter benefícios fiscais e de receberem terrenos públicos em concessão. Por isso, diz que é possível concluir que serão negados benefícios tributários às empresas que utilizam do selo verde da moratória para demonstrar compromisso ambiental a seus clientes.
“O objetivo final disso resta evidente: forçar que as empresas adquirentes de soja (e eventualmente de outros produtos) abandonem o selo, para com isso facilitar vendas de soja oriunda de áreas desmatadas da floresta Amazônica”, diz a Abiove em trecho da ação, que é assinada pelos advogados Pedro Guilherme Accorsi Lunardelli e Jimir Doniak Junior, do escritório Advocacia Lunardelli.
A Abiove reitera que ao tentar alcançar a certificação da moratória da soja e encará-la como um acordo ou compromisso, a lei pode acarretar a perda de benefícios fiscais pelas empresas do setor agroindustrial certificadas e a revogação da concessão de terrenos públicos. Além disso, sustenta a associação que a norma maranhense incorre em inconstitucionalidades, dentre elas a violação aos diversos dispositivos constitucionais que impõem a proteção ao meio ambiente, preocupação expressiva da Constituição, que permeia todo o seu texto e evidencia a relevância atribuída ao tema pelo Constituinte.
A Abiove argumenta ainda que é competência comum da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios proteger o meio ambiente e é competência concorrente dos mesmos entes legislar sobre florestas e proteção do meio ambiente. Também pondera que o tratamento constitucional e os precedentes do STF apontam não ser admissível o estado utilizar seu poder de legislar para desestimular – negando benefícios tributários e concessão de terrenos – e com isso combater uma iniciativa alinhada com o meio ambiente.
Assine gratuitamente a newsletter Últimas Notícias do JOTA e receba as principais notícias jurídicas e políticas do dia no seu email
“Por isso, vedar benefícios fiscais e a concessão de terrenos públicos a empresas que participem de acordos e compromissos como a certificação pela moratória da soja é contrariar não só os diversos dispositivos constitucionais em prol do meio ambiente, mas é contrariar frontalmente o § 3º do artigo 145 da Constituição Federal”, sustenta a Abiove.
Declara, ainda, que a lei maranhense é inconstitucional por violar o princípio da isonomia e estabelecer discriminação entre os contribuintes, de modo a negar a alguns deles a concessão de incentivos fiscais e de terrenos públicos. “Em casos assim, deve-se averiguar se a discriminação imposta está concorde com a Constituição, que prescreve a isonomia, de modo geral e de modo especial para fins tributários”, afirma.
‘Versão maranhense de leis de outros estados’
Ao requerer a declaração de inconstitucionalidade da Lei 12.475, a Abiove menciona que ela é a versão maranhense de leis equivalentes dos estados do Mato Grosso (Lei 12.709/2024) e de Rondônia (Lei 5.837/2024), com teores praticamente idênticos. Assim, ressaltou que ambas as legislações foram questionadas no STF, nas ADIs 7774 – de relatoria do ministro Flávio Dino – e 7775, do ministro Dias Toffoli.
Ambas as ações haviam sido protocoladas pelo Partido Comunista do Brasil (PCdoB), Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), Partido Verde (PV) e Rede Sustentabilidade (Rede). Nelas, as siglas questionavam a proibição de incentivos a toda cadeia de soja vinculada a acordos de política sustentável nos estados.
Inscreva-se no canal de notícias tributárias do JOTA no WhatsApp e fique por dentro das principais discussões!
Por essa razão, havia solicitado que a ADI 7823 fosse distribuída por prevenção ao ministro Flávio Dino, relator da ADI 7774, na qual determinou a suspensão da lei mato-grossense. Entretanto, a ação proposta pela entidade foi distribuída ao ministro Fachin, por sorteio.
Na decisão que suspendeu a lei de Mato Grosso, Dino concluiu que a norma afronta princípios constitucionais, como a livre iniciativa, a livre concorrência e a isonomia, ao punir essas empresas. O ministro ressaltou ainda que, “ao vedar a concessão de incentivos fiscais e benefícios econômicos a pessoas jurídicas que adotam livremente determinadas políticas de compras, a lei penaliza empresas que voluntariamente privilegiam fornecedores comprometidos com a preservação ambiental”.