O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu, por meio de uma reclamação constitucional, um acórdão do Tribunal Superior do Trabalho (TST) que havia estabelecido que os valores indicados na petição inicial de uma reclamatória trabalhista configurariam mera estimativa, não limitando a condenação.
A decisão é a primeira que se tem notícias neste sentido, e, caso passe a virar tendência no Supremo em outras reclamações constitucionais, poderia coibir decisões da Justiça do Trabalho que tem afastado a limitação das condenações aos valores pedidos nas iniciais, como prevê a CLT, após a Reforma Trabalhista.
Conheça o JOTA PRO Trabalhista, solução corporativa que antecipa as movimentações trabalhistas no Judiciário, Legislativo e Executivo
No caso, uma ex-funcionária do banco Itaú entrou com processo pedindo a integração de prêmios e bônus pagos como participação de resultados, PLR e outros recebidos durante o contrato de trabalho no cálculo das férias mais um terço, nos décimos terceiros salários e em todas as verbas rescisórias (aviso prévio indenizado, aviso prévio CCT, férias mais um terço e 13º salários), além do FGTS e multa de 40%. Ela atribuiu R$ 30 mil ao valor da causa como estimativa aproximada.
Ao ser condenado, o Itaú alegou a necessidade de a condenação se limitar ao valor total “estimado”. Na sentença, o juiz da 18ª Vara do Trabalho de São Paulo/SP (Zona Sul) entendeu que a premissa prevista no parágrafo 1ª, do artigo 840 da CLT, estabelecida com a Lei da Reforma Trabalhista (Lei nº 13.467, de 2017) ao dispor que a reclamação escrita deverá conter a indicação do valor do pedido, refere-se a uma mera estimativa. A decisão então foi mantida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT2), em São Paulo, e depois pela 5ª Turma do TST.
A 5ª Turma do TST destacou na decisão que o tema foi afetado ao Pleno do TST no dia 06/02/2025. O Recurso de Revista Repetitivo, Nº 35, contudo ainda está pendente de julgamento. Porém, como o relator, ministro Alexandre Ramos, não suspendeu os processos em andamento, a turma decidiu por aplicar ao caso decisão da Subseção I de Dissídios Individuais (SDI-1), que entendeu que esses valores são meras estimativas.
- Diante disso, a defesa do banco decidiu entrar com reclamação no Supremo dizendo que o TST, ao autorizar a condenação em valor superior ao limite indicado na petição inicial, negou vigência do parágrafo 1º, do artigo 840, da CLT, sem declarar expressamente a sua inconstitucionalidade. E que com isso, teria desrespeitado a Súmula Vinculante nº 10 do STF.
A súmula diz que “Viola a cláusula de reserva de plenário (CF, artigo 97) a decisão de órgão fracionário de tribunal que, embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público, afasta sua incidência, no todo ou em parte”. Ou seja, somente o Pleno ou Órgão Especial poderia dizer sobre inconstitucionalidade e afastar sua aplicação. Assim, pediu a cassação da decisão do TST e a limitação da condenação ao valor da causa.
Decisão
Ao analisar o caso, o ministro Alexandre de Moraes deu razão ao banco. De acordo com Moraes, o TST afastou a incidência do parágrafo 1º, do artigo 840 da CLT, em afronta à Súmula Vinculante 10. “Ou seja, sob o pálio da argumentação constitucional da aplicação dos princípios da inafastabilidade da jurisdição (art. 5º, XXXV, da CF), dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF) e proteção social do trabalho (art. 1º, IV, da CF), afastou a incidência do art. 840, § 1º, da CLT, especialmente naquilo que expressamente modificado pelo legislador com a edição da Lei 13.467, de 13 de julho de 2017, isto é, na parte em que expressamente consignado o dever do autor de formular pedido “que deverá ser certo, determinado e com indicação de seu valor”.
Neste sentido, acrescentou que “a inconstitucionalidade total ou parcial de lei ou ato normativo estatal só pode ser declarada pelo voto da maioria absoluta da totalidade dos membros do tribunal ou, onde houver, dos integrantes do respectivo órgão especial, sob pena de absoluta nulidade da decisão emanada do órgão fracionário (turma, câmara ou seção), em respeito à previsão do art. 97 da Constituição Federal”.
Por fim, determinou a cassação da decisão por violação à Súmula Vinculante nº 10, do STF, e que nova decisão seja proferida observando esses parâmetros. (RCL 79034)
Repercussão
Segundo o advogado que assessora o banco, Maurício Pessoa, do Pessoa Advogados, “limitar a condenação ao pedido é uma forma de moralizar o processo e obedecer ao mandamento básico da segurança jurídica. Isso vai além da Reforma Trabalhista. Embora a decisão do STF tenha sido procedimental, não consigo imaginar uma resposta ao tema fora dos legítimos limites da Constituição relativos ao contraditório e a ampla defesa”.
A decisão difere da posição consolidada pelo TST e poder abrir um novo campo de embate entre os dois Tribunais, segundo o advogado Alexandre Lauria Dutra, do Pipek Advogados, “embora seja cedo para afirmar isso por ser uma decisão monocrática e inédita”, diz.
O advogado Maurício Reis, do Lobo de Rizzo Advogados, afirma que a decisão do ministro Alexandre de Moraes nada mais fez do que assegurar vigência ao disposto no artigo 97, da Constituição Federal e à Súmula 10, do STF. “Assim, em nossa opinião, agiu corretamente ao impedir que um órgão fracionário do TST (no caso, a 5a Turma), declarasse a inconstitucionalidade do artigo 840, parágrafo 1º, da CLT”.
Para Reis, “em resumo, reforça a importância da cláusula de reserva de plenário, o que confere maior segurança jurídica e previsibilidade às relações sociais e processuais”. O advogado ainda destacou que ao contrário do que ocorreu nas discussões de terceirização e pejotização, a questão meramente trabalhista ou processual, nesta decisão, ficou em segundo plano, pois trata-se de matéria eminentemente constitucional.