TST cassa liminar que obrigava plano a cobrir internação em clínica de obesidade

Na contramão de decisões anteriores, a Subseção II Especializada em Dissídios Individuais (SDI-2) do Tribunal Superior do Trabalho (TST) decidiu, por unanimidade, cassar uma liminar que obrigava o plano de saúde da Petrobras a cobrir a internação de uma funcionária em uma clínica para tratamento de obesidade. O entendimento, registrado em acórdão publicado em abril, difere do adotado em outras decisões do colegiado, proferidas entre 2018 e 2023.

No julgamento recente, os ministros entenderam que não cabia a tutela de urgência ao pedido, uma vez que, embora o plano não custeie a internação, dispõe de um corpo clínico especializado para o tratamento da doença. Sendo assim, não vislumbraram risco de “efeitos corrosivos do tempo sobre possíveis direitos da parte, tampouco prejuízo ao resultado útil do processo”. (Processo nº 1121-34.2022.5.05.0000).

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Sob análise da SDI-2, estava recurso da trabalhadora contra decisão monocrática da ministra Liana Chaib, também relatora. Com o resultado, o colegiado manteve a decisão da ministra, que havia denegado a segurança e cassado a tutela de urgência – que foi concedida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região (TRT5), na Bahia.

Conforme os autos, a funcionária alega ser portadora de obesidade mórbida em grau III, classificada como doença crônica, e sofrer de comorbidades agravadas pela patologia. O pedido de internação foi justificado com base em um laudo assinado por um endocrinologista, no qual o médico solicitou a internação por período inicial de 140 dias e manutenção do tratamento pós alta – consistente em dois dias de internação por mês, por 18 meses.

A idade da paciente e a fase processual da ação matriz foram levadas em conta na análise da SDI-2. No acórdão, os ministros ressaltaram que, conforme o relatório médico presente nos autos, a funcionária tinha apenas 25 anos quando ajuizou a ação, sendo então considerada jovem, e não possuía indicativos de um quadro de impossibilidade de locomoção para realizar o tratamento. Também pontuaram que o processo original ainda está na fase de produção de perícia técnica, o que, para os ministros, reforça o entendimento de que o pedido não configura por ora um direito líquido e certo.

Mudança de jurisprudência

Ao interpor o recurso, a defesa da trabalhadora alegou, entre outros pontos, que a decisão monocrática foi “em sentido contrário à jurisprudência da SDI-2”. A diferenciação foi confirmada pelo acórdão publicado em abril, que, no entanto, manteve o entendimento.

“Em que pese o direcionamento desta Subseção, com todas as vênias, entendo que não se encontram presentes, na hipótese, os requisitos da tutela de urgência, sobretudo porque a Associação Petrobras de Saúde-APS dispõe de corpo clínico especializado no tratamento da obesidade”, escreveu Chaib, relatora do acórdão da SDI-2.

No documento, foram citados três precedentes distintos do entendimento agora adotado. Em 2023, a SDI-2 negou recurso semelhante da Associação Petrobras de Saúde (APS) que também visava derrubar decisão do TRT5, que havia deferido liminar para determinar o custeio da internação de uma funcionária em uma clínica especializada no tratamento de obesidade grau III.

Na ocasião, sob relatoria do ministro Alberto Bastos Balazeiro, o colegiado, por unanimidade, entendeu que foram preenchidos os requisitos para a tutela de urgência – a demonstração da probabilidade do direito e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo. Para os ministros, a prova pré-constituída dos autos, assim como o relato da trabalhadora, davam conta de se tratar de um “grave quadro clínico, com alto risco de vida”.

Embora tenham ponderado que não existe consenso sobre a superioridade do tratamento em clínica, quando comparado ao ambulatorial, ressaltaram que caberia ao médico que acompanha a paciente indicar qual a melhor metodologia de tratamento.

Também afirmaram que a AMS é um plano de assistência à saúde de autogestão, mas equiparada aos planos e seguros privados de assistência à saúde, logo se submete a Lei nº 9656/98, que prevê a possibilidade de internação dentro do plano referência de assistência à saúde, sobretudo quando à classificação da obesidade mórbida. Além disso, pontuaram que o tratamento de emagrecimento no caso não tinha finalidade estética, por isso não estaria entre os procedimentos previstos no rol de exclusões da cobertura (Processo nº 1219-19.2022.5.05.0000)

Um ano antes, em 2022, sob fundamentos similares, a subseção também negou recurso, desta vez da Petrobras, contra decisão do TRT5 em caso semelhante (Processo nº 30-40.2021.5.05.0000).

Já no precedente de 2018, sob relatoria do ministro Alexandre Luiz Ramos, o motivo para recusar o pedido da Petrobras, que visava reformar decisão do mesmo TRT, foi a perda do objeto. No caso, o TRT negou mandado de segurança para suspender decisão da 23ª Vara do Trabalho de Salvador, que havia deferido liminar para manter a internação de uma funcionária em uma clínica para tratamento de obesidade. A perda de objeto se deu porque, meses antes, foi proferida decisão definitiva no processo original, na qual os pedidos formulados foram julgados procedentes e foram confirmados os efeitos da tutela antecipada concedida (Processo nº 0000178-21.2017.5.05.0023)

O que dizem os envolvidos

Em nota, a Petrobras afirmou que o Saúde Petrobras assegura a cobertura de todos os tratamentos previstos no rol da ANS e de procedimentos extra rol, mas que o tratamento pleiteado não se enquadra entre eles.“Internações em estabelecimentos com características de SPA não estão previstas no rol da ANS, no regulamento [do Plano AMS] ou em ACT [Acordo Coletivo de Trabalho das patrocinadoras]. Por esse motivo, a solicitação de cobertura citada na ação judicial foi negada, decisão corroborada pela Justiça do Trabalho em todas as instâncias, confirmando por diversas vezes a legalidade da negativa. A natureza de SPA foi confirmada em perícia, que constatou que a estrutura física do estabelecimento não se assemelha a um hospital, e sim a resorts de padrão internacional”, disse.

A empresa declarou também que reafirma seu compromisso em “proporcionar serviços de saúde de qualidade às pessoas beneficiárias, incluindo tratamentos terapêuticos eficazes para o combate à obesidade, com abordagem multidisciplinar, o que foi claramente expresso e confirmado pela Justiça do Trabalho na sentença da ação judicial”. Observou ainda que possui, em sua rede, credenciados de diversas especialidades (psicólogos, psiquiatras, endocrinologistas, nutrólogos, terapeutas), além da possibilidade de solicitar reembolso em caso de atendimento com profissionais não-credenciados.

Também disse que oferece “linha de cuidado focada em sobrepeso e obesidade por meio do Programa Cuidar | Atenção Primária, com acesso a um time de saúde multidisciplinar, sem custo adicional algum para o beneficiário. Por meio do Benefício Farmácia, há ainda cobertura de medicamentos para tratamento da obesidade, condicionada a critérios técnicos”.

Ressaltou, por fim, que é uma operadora de saúde de autogestão sem fins lucrativos, em que “os custos são compartilhados entre todos os beneficiários, o que torna fundamental o equilíbrio financeiro e a sustentabilidade do benefício”.

O JOTA também entrou em contato com o escritório que realizou a defesa da trabalhadora, mas não houve retorno até esta publicação

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