Por unanimidade, a 4ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT4) condenou a rede de farmácias São João a indenizar em R$ 10 mil por danos morais uma ex-gestora que foi orientada por coordenadora a contratar apenas pessoas “bonitas” e a rejeitar candidatos homossexuais, acima do peso, tatuados e com piercings.
A relatora, desembargadora Ana Luiza Heineck Kruse, entendeu que a orientação discriminatória da empresa, determinando critérios estéticos e de identidade pessoal, configurou ato ilícito, com a violação do princípio da igualdade e da não discriminação. Alegou ainda omissão em prevenir e reprimir condutas discriminatórias. Leia a íntegra da decisão.
“A reclamante, como gestora, foi destinatária de uma orientação discriminatória, que a colocou em uma posição conflituosa e contrária aos princípios basilares do direito do trabalho. Além disso, o conteúdo do áudio ganhou ampla repercussão, tanto no ambiente corporativo quanto fora dele, agravando a exposição e o abalo moral da reclamante”, escreveu Kruse na decisão.
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Para desembargadora, a coordenadora extrapolou os limites do seu poder diretivo e que a responsabilidade da empresa não recai apenas sobre o “ato individual e isolado”, mas também na omissão em prevenir e reprimir condutas discriminatórias.
‘Áudios de Whatsapp’
O caso veio a público quando os áudios enviados pela coordenadora, em um grupo de WhatsApp com gestores da rede, repercutiram nas redes sociais e na imprensa em outubro de 2021. Na gravação, ela orientava os gestores a recrutarem “gente com a aparência boa” e a evitarem a contratação de pessoas homossexuais, obesas e com piercings ou tatuagens.
“Vamos cuidar muito nas nossas contratações. Pessoas muito tatuadas, vocês sabem que a empresa não gosta. A questão de piercing na língua, no nariz, na testa, não pode, a gente lida com saúde. Pessoas muito gordas, vocês sabem que… Então, assim, cuidem as aparências”, afirmou a ex-coordenadora no áudio.
Em outro trecho, a ex-coordenadora sugeriu que os gestores não contratassem homossexuais afeminados. “Se pegar alguém, com todo o respeito, ‘veado’ e tudo mais, tem que ser uma pessoa alinhada, que não vire a mão, não desmunheque”, disse a ex-funcionária.
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A decisão confirma a sentença da juíza Marinês Denkievicz Tedesco Fraga, do Posto da Justiça do Trabalho de Tramandaí (RS). A ex-gestora, contudo, recorreu ao TRT4 pedindo a majoração da indenização para pelo menos R$ 100 mil, alegando que o valor fixado foi insuficiente “diante da severidade dos fatos narrados e comprovados nos autos”. O pedido de majoração foi negado pelo tribunal.
Por outro lado, a rede de farmácias São João recorreu para afastar a condenação, alegando que a ex-gestora não comprovou os fatos alegados e que o incidente foi um “episódio isolado, ocorrido em grupo de WhatsApp não oficial, criado sem autorização da empresa e contrário às diretrizes institucionais”.
Disse ainda que o caso não representa valores da instituição e que instaurou sindicância interna para apurar o caso, que resultou na demissão por justa da causa da coordenadora que enviou os áudios. E informou que Apresentou cartilhas sobre respeito e diversidade, criadas após o episódio, e uma nota pública divulgada à época.
No caso de condenação, requereu a alteração dos critérios de correção monetária e juros da indenização, pedido que foi acolhido pelo colegiado.
O JOTA tentou contato com a rede de farmácias, mas não obteve retorno. O espaço segue aberto. O processo tramita com o número 0020389-30.2023.5.04.0271 no TRT4.