Imagine a seguinte cena: é uma sexta-feira chuvosa e você está na empresa, atendendo o RH, mais uma vez explicando que não é possível demitir o colaborador que acabou de retornar de um afastamento.
De repente, um colega de trabalho comenta que viu um vídeo de uma startup que faz “mágica” com inteligência artificial: ela responde mil ofícios por minuto, com 100% de assertividade! Ele está tão empolgado quanto naquela época em que recebeu um aumento.
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Diante disso, qual a primeira coisa que passaria pela sua cabeça? “Será? Poxa, mil? IAs alucinam muito, nunca substituirão o advogado”.
E se, você tiver pensado: “essa IA faz sentido para a nossa realidade?”. É sobre isso que nós dois, um empresário e uma advogada, falaremos neste artigo.
A necessidade de transformação
Ao analisar a reação espontânea à promessa tecnológica, podemos identificar um pano de fundo comum: estamos inseridos em uma cultura empresarial que exige que todas as áreas sejam rentáveis. Cada área é parte vital da engrenagem corporativa e deve ser gerido com a mesma atenção dada a qualquer unidade de negócios.
Este é o principal desafio dos jurídicos modernos: abandonar o papel de centro de custo e assumir a posição de área promotora de valor estratégico. Isso exige atuação proativa, colaborativa e integrada ao core business da empresa.
Bem, é bastante plausível, que surja a dúvida: “se não gero receita diretamente, como posso contribuir para o ROI (Retorno sobre o Investimento) da empresa?
E a resposta para isso é: cost avoidance.
Evitar custos, reduzir riscos e estruturar processos que blindem a empresa juridicamente são formas poderosas de agregar valor econômico – mesmo que não figurem nas linhas de receita.
Comece pelo começo
Ok, mas qual o primeiro passo: gerir o Jurídico como se gere uma empresa.
Você precisará mapear seu atual cenário. Considere, sempre, qual o tamanho da sua área. Jurídicos pequenos não são justificativas para má gestão. Grandes departamentos (budgets) não significam dinheiro sobrando. Portanto, seja realista e a partir desse realismo crie controles.
- Custo operacional: quanto o seu departamento custa para a companhia?;
- Produção: quantas demandas e de quais naturezas seu time trata mensalmente?;
- Capacidade produtiva: qual a performance sua e do seu time? Ela é compatível com a produção necessária?; e
- Produção x produtividade: o time atual é o suficiente para a demanda?
Se para a pergunta 4 a resposta for não: qual é a sua resposta à pergunta 3? E como irá solucionar? São necessárias mais pessoas? Ou é necessário melhorar o ambiente e as ferramentas disponíveis.
E por fim, analise o seu time: ele é capaz de levar a sua área para o próximo nível?
Ao organizar informações, medir desempenho e agir com base em dados, o jurídico deixa de ser visto como custo obrigatório e passa a ser reconhecido como ativo estratégico.
Assim, antes de concluir qual tecnologia faz sentido para o seu contexto, avalie primeiro se o seu próprio departamento já opera com uma mentalidade de negócio.
Este é o verdadeiro ponto de partida para qualquer transformação tecnológica ou estrutural.
Como isso é percebido pelo jurídico?
Embora o jurídico atue, em geral, na prevenção de perdas e na mitigação de riscos, ou seja, nem sempre gerando diretamente “dinheiro no caixa”, ainda assim é possível calcular seu ROI, como citado, através do cost avoidance.
Outros custos, além dos de gestão citados anteriormente, são:
- Desembolsos relacionados a salários internos;
- Honorários de escritórios terceirizados; e
- Softwares e tecnologias
Se esse investimento for bem planejado, com uma metodologia adequada de gestão, há grande potencial de retornos, como êxito em litígios, recuperação e prevenção de perdas financeiras, além de contratos mais bem elaborados e gerenciados.
A lógica é, quanto mais se investe em pessoas, processos e tecnologia bem definidos, maior tende a ser o ganho em eficiência. Isso se traduz diretamente no valor que a empresa deixaria de gastar caso não houvesse uma atuação jurídica estratégica, preventiva e muito bem estruturada.
Recentemente, em um benchmark com um banco, discutimos a gestão de ofícios. Chamou muita atenção quando contaram que o time responsável por essa demanda é formado, em sua maioria, por profissionais que não são advogados. Inicialmente isso causou um certo questionamento: será que conseguiríamos falar a mesma língua?
Não apenas falamos a mesma língua, como ficou claro que há um olhar extremamente qualificado vindo de fora da nossa realidade tradicional.
É claro que o papel do advogado nesse contexto continua sendo fundamental, mas, sem sombra de dúvidas, contar com um engenheiro de processos na equipe, por exemplo, traz ganhos significativos.
Já ficou no passado a ideia de que o jurídico deve atuar apenas de forma técnica e reativa. As exigências hoje são outras.
Vamos ser sinceros: no departamento jurídico atual, os números muitas vezes falam mais alto do que uma boa tese.
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O que define um jurídico de negócio
Talvez o jurídico nunca vá “vender” diretamente como o comercial. Mas pode, sim, contribuir diretamente para o resultado da empresa: evitando litígios, reduzindo contingências, melhorando contratos, etc.
De forma simples, a provisão financeira de litígios representa o valor que a empresa deve reservar em caixa para cobrir eventuais perdas decorrentes de processos judiciais em andamento. Com previsibilidade adequada, o controle financeiro passa a impactar diretamente nos resultados corporativos e saúde financeira da organização, trazendo estabilidade e suporte à tomada de decisões estratégicas. Em outras palavras, podemos concluir que a gestão de litígios é, também, uma forma de gestão financeira.
É justamente essa visão que consolida o jurídico como uma unidade de negócio estratégica e indispensável para a sustentabilidade da empresa.