EUA, Brasil e as respostas às tentativas de autogolpe

Em 6 de janeiro de 2021, radicais do Partido Republicano, apoiadores de Donald Trump, invadiram o Congresso dos Estados Unidos. Dois anos depois, em 8 de janeiro de 2023, uma cena similar ocorreu em Brasília: uma multidão de bolsonaristas tentou destruir, com certo sucesso, o Congresso Nacional, o Palácio do Planalto e o Supremo Tribunal Federal.

Trump e Bolsonaro passaram suas campanhas presidenciais em 2020 e 2022 semeando desconfiança nas eleições, alimentando teorias conspiratórias e encorajando seus seguidores a rejeitar os resultados das urnas e participar de protestos antidemocráticos.

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Trump conclamou a multidão a “marchar para o Capitólio” no dia da certificação da vitória de Joe Biden (Partido Democrata). Bolsonaro, por sua vez, declarou que “ou fazemos eleições limpas no Brasil ou não temos eleições” e, depois da derrota, evitou reconhecê-la, incentivando protestos que culminaram no 8 de janeiro.

Ambos fizeram tentativas de autogolpe, manifestações físicas da erosão democrática comandada por líderes de extrema direita. Mas a resposta das instituições aos ataques em cada país seguiu caminhos diferentes.

A reação norte-americana foi marcada pela impunidade. Houve centenas de prisões de participantes diretos – mais de 1.500 pessoas foram indiciadas por crimes federais. Os tribunais condenaram cerca de 1.270 réus, mas as penas foram leves.

Os políticos por trás da tentativa de autogolpe ficaram fora do alcance da lei por bastante tempo. Somente em 2023, mais de dois anos após o ataque, Trump foi acusado em âmbito federal, e ainda assim nada impediu sua candidatura (e nova vitória) presidencial. A Suprema Corte bloqueou iniciativas que buscavam excluí-lo das cédulas com base na 14ª Emenda. A Seção 3 desta emenda constitucional proíbe que qualquer pessoa que tenha jurado apoiar a Constituição e posteriormente se envolvido em insurreição contra o país ocupe cargos públicos.

Esta emenda, ratificada em 1868, foi criada para impedir que antigos líderes políticos e militares dos estados sulistas que haviam lutado pela Confederação — os ex-confederados — ocupassem cargos federais, mas ganhou nova relevância nos debates sobre a inelegibilidade de Trump após os ataques ao Capitólio.

A reação brasileira, ao contrário, foi rápida e decisiva. Cerca de 1.500 pessoas foram presas nos dias seguintes aos ataques, sendo cerca de 300 detidas durante os atos e outras 1.200 no dia seguinte, durante a desmobilização do acampamento em frente ao Quartel-General do Exército. Mais de 2.180 pessoas foram presas por participarem dos ataques, e mais de 1.300 respondem a processos criminais. O STF instaurou inquéritos abrangentes que alcançam não apenas manifestantes, mas financiadores, organizadores e políticos.

Em pouco tempo, o Tribunal Superior Eleitoral julgou e condenou Bolsonaro, declarando-o inelegível por oito anos. O ex-presidente corre risco real de prisão em ao menos três frentes: a mais grave é o inquérito sobre a tentativa de golpe de 8 de janeiro, pelo qual foi indiciado por tentativa de abolir o Estado Democrático de Direito e por organização criminosa.

O contraste entre as trajetórias de Trump e Bolsonaro revela abordagens diferentes para enfrentar ameaças à democracia. A via brasileira priorizou a proteção do sistema democrático, impedindo que o líder que insuflou ataques às instituições volte ao poder. Nos Estados Unidos prevaleceu o entendimento de que impedir um candidato de concorrer seria antidemocrático, deixando a decisão para as urnas e o rito penal comum.

Se os norte-americanos tentarem solucionar “males republicanos” com “soluções republicanas”, como queriam os Federalistas, terão sérias dificuldades.

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