O desembargador Valdir Florindo, presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT2), afirmou, nesta segunda-feira (28/4), que a suspensão nacional dos processos envolvendo pejotização gera insegurança social e restringe a competência da Justiça do Trabalho. A declaração foi feita na abertura da sessão plenária do Órgão Especial da Corte, responsável pela jurisdição trabalhista na Grande São Paulo e em parte da Baixada Santista.
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A fala faz referência à decisão monocrática do ministro Gilmar Mendes, que suspendeu todas as ações trabalhistas sobre pejotização e trabalhadores autônomos até uma definição do plenário do Supremo Tribunal Federal (STF). Para o presidente do TRT2, a pejotização é uma tentativa de dissimular vínculos de emprego e uma tentativa de negar direitos sociais em nome de “uma nova forma de trabalho”. O posicionamento do desembargador foi respaldado pelo plenário do colegiado.
O desembargador afirma que vê “com esperança” projetos em tramitação no Congresso Nacional que pretendem ampliar a competência da Justiça do Trabalho. Atualmente, tanto na Câmara dos Deputados como no Senado, discute-se a possibilidade de permitir que a Justiça do Trabalho passe a julgar as ações que envolvam qualquer relação de trabalho e não somente aquelas previstas na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), de 1943.
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Florindo também sustentou que os juízes do Trabalho não confundem o fenômeno da terceirização com a pejotização, destacando que a Justiça do Trabalho é especialista na matéria. Ele também destacou que a Justiça do Trabalho tem, como fundamento, observar a primazia da realidade e não se limita a examinar a formalidade de contratos, rótulos e protocolos burocráticos.
“A história nos ensina que a Justiça do Trabalho sempre enfrentou resistências. E o fizeram porque nossa missão sempre foi cumprida – e isso não é fácil –, mas cumprida com eficiência. Ninguém ataca instituições que não dão resultados. Nenhum inseto se guia para onde não há luz. Nascemos sob desconfiança, amadurecemos sob questionamentos e resistimos a todas as tentativas de diminuição. E sempre vencemos.”, declarou.
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Além disso, o desembargador pontuou que as decisões judiciais devem ser cumpridas, se referindo às posições do STF sobre a validade dos contratos de terceirização da atividade-fim. Contudo, ele afirma que também se deve cumprir “valores sociais do trabalho como um dos fundamentos da República” e o “artigo 9º da CLT, em plena vigência, que declara nulos os contratos que visem fraudar a legislação trabalhista”.
O desembargador Valdir Florindo concluiu o discurso ao afirmar que a Justiça do Trabalho continua sendo indispensável como instrumento para a concretização da Constituição.
Leia o discurso na íntegra:
“DEFESA DO DIREITO DO TRABALHO E DA JUSTIÇA DO TRABALHO
Senhoras e Senhores Desembargadores, magistrados, servidores, advogados, representantes da sociedade civil e todos que nos acompanham,
Dirijo-me hoje a esta Corte, em sessão plenária, para reafirmar valores que nos são caros e que fundamentam a razão de ser da Justiça do Trabalho e do Direito do Trabalho no Brasil.
Todos os dias, ao julgarmos os litígios que nos são confiados, lidamos com valores. Não apenas com valores monetários, como poderia sugerir, à primeira vista, o resultado econômico de muitas de nossas decisões.
Nossa atuação vai muito além. A Justiça do Trabalho tutela diretamente direitos fundamentais: a isonomia e a igualdade de oportunidades; a liberdade – do combate ao trabalho escravo à garantia de liberdade de associação; a saúde e a segurança no trabalho, por meio de tutelas de urgência que protegem a vida e a integridade física do trabalhador, entre diversos outros exemplos, de amplo conhecimento.
Contudo, mesmo quando a decisão judicial determina reparação pecuniária, cada valor fixado expressa, na verdade, o reconhecimento de um direito violado. Assim, se a Justiça do Trabalho recebe mais de 4 milhões de processos por ano, não é porque há muitos direitos trabalhistas, mas sim porque, infelizmente, ainda há muita violação de tais direitos. E não se procura uma instituição na qual não se confia. Daí a nossa importância, que é inarredável: nós protegemos diuturnamente bens jurídicos de valor inestimável, que sustentam a democracia e garantem a dignidade da pessoa humana. A Justiça do Trabalho, cumpre dizer, não concede direitos. Faz cumprir as leis e assegura esses direitos — diga-se, de passagem, plenamente vigentes.
Entretanto, a conjuntura atual revela desafios institucionais que não podemos ignorar. Em decisões recentes, a competência da Justiça do Trabalho vem sendo questionada e, por vezes, restringida. A mais recente determinação de suspensão nacional dos processos que discutem a chamada “pejotização” revela essa tendência.
A Justiça do Trabalho, especialista que é na matéria, não confunde pejotização com terceirização, fenômenos distintos, como sabemos. A pejotização, na verdade, não é relação entre pessoas jurídicas, que tanto afirmam. É neologismo que representa a tentativa de dissimulação de verdadeiros vínculos de emprego, negando direitos sociais em nome de uma suposta nova forma de trabalho. A suspensão nacional de processos — sob o argumento da segurança jurídica — gera, paradoxalmente, insegurança social, “data vênia”.
A Justiça do Trabalho não se limita a examinar a formalidade dos contratos, rótulos e protocolos burocráticos, absolutamente! Com fundamento em um dos princípios mais caros ao Direito do Trabalho, o da primazia da realidade, analisamos a substância das relações e aplicamos a lei atendendo aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum, como dispõe o art. 5º da Lei de Introdução ao Direito Brasileiro, aliás, não só para a Justiça do Trabalho, mas para todos os juízes e tribunais brasileiros.
É certo que decisão judicial se cumpre, claro. Mas a Constituição e as leis também. Cumpre-se o artigo 1º, inciso IV, da Constituição, que coloca os valores sociais do trabalho como um dos fundamentos da República. Cumpre-se o artigo 9º da CLT, em plena vigência, que declara nulos os contratos que visem fraudar a legislação trabalhista. Defender o Direito do Trabalho e a missão da Justiça do Trabalho é, portanto, ato de defesa da Constituição, da democracia e da dignidade do ser humano.
A história nos ensina que a Justiça do Trabalho sempre enfrentou resistências. E o fizeram porque nossa missão sempre foi cumprida – e isso não é fácil –, mas cumprida com eficiência. Ninguém ataca instituições que não dão resultados. Nenhum inseto se guia para onde não há luz. Nascemos sob desconfiança, amadurecemos sob questionamentos, e resistimos a todas as tentativas de diminuição. E sempre vencemos.
Hoje, vemos, com esperança, projetos em tramitação no Congresso Nacional que visam ampliar nossa competência. Isso demonstra que a sociedade brasileira reconhece, no cotidiano de suas relações de trabalho, o valor da Justiça que entrega dignidade, proteção e segurança jurídica.
Por isso, não há espaço para desalento. Há espaço para a entrega de resultados. Há espaço para reafirmação. Reafirmação de que a dignidade, a igualdade, a liberdade, a inclusão e a justiça são valores fundamentais e permanentes da nossa democracia e da nossa República.
Renovemos, assim, o nosso compromisso de sermos agentes da Justiça, instrumentos para a concretização da Constituição. Sigamos firmes, serenos e convictos: o futuro só se constrói com respeito ao trabalho humano. E a Justiça do Trabalho é a instituição para assegurar sua proteção. A importância da Justiça do Trabalho não está somente na sua história de compromisso com a entrega da justiça social, mas sim da sua indispensabilidade. Por isso, reafirmo: continuamos sendo indispensáveis.
Muito obrigado.”