Brasil é referência mundial em descarbonização da cadeia de óleo e gás

Em tempos de transição energética, a produção de petróleo e gás natural ainda está longe do fim. Nas estimativas mais ambiciosas, prevê-se a necessidade de uso de combustíveis fósseis até 2050, segundo meta estabelecida na COP28, em 2023. Nesse sentido, o Brasil vem ocupando lugar de destaque na adoção de estratégias de descarbonização com potencial para entregar um petróleo competitivo, de boa qualidade e ao mesmo tempo descarbonizado, avalia Ricardo Ardenghy, presidente do Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP).

“Quando as empresas de petróleo vêm para o Brasil, elas também vêm para aprender”, afirma. Um dos motivos que colocam o Brasil nesta posição é o fato de que o país está entre os com menores emissões de gás carbônico por barril de petróleo produzido. Segundo dados da Petrobras, são emitidos no Brasil cerca de 14,2 quilos de CO2 por barril. A média global – calculada a partir de dados da British Petroleum (BP) – fica em torno de 20 quilos de emissão de gás carbônico (CO2) por barril.

Do ponto de vista da Agência Nacional do Petróleo (ANP), “as tecnologias de descarbonização representam uma oportunidade estratégica para a indústria de petróleo e gás brasileira”, afirma em posicionamento enviado ao Estúdio JOTA. Isso, entende o órgão do governo, permitirá que a indústria nacional se mantenha competitiva “em um cenário internacional cada vez mais orientado por critérios de sustentabilidade”.

A agência também fez a ressalva de que a descarbonização traz desafios de adaptação e inovação, incentivando o desenvolvimento de soluções que reduzam emissões ao longo da cadeia de valor. “Isso é particularmente relevante em um país com grande potencial de energias renováveis e experiência consolidada em regulação ambiental e energética”, completa.

A posição do Brasil

A ANP aponta ainda que a intensidade de carbono do barril produzido no pré-sal é menor do que a meta da O&G Climate Initiative (OGCI). Segundo a agência, isso “coloca o Brasil em uma posição favorável visto que a intensidade de carbono do O&G produzido será um novo fator de competitividade”.

O número brasileiro é especialmente relevante ao se considerar que a maior parte dos combustíveis fósseis produzidos aqui vem da exploração offshore, ou seja, no mar, como é o caso do pré-sal na Bacia de Santos (SP). Essa forma é mais complexa quando comparada à exploração em terra, exigindo uma logística com mais gasto energético e, portanto, mais emissão de CO2.

Este conteúdo faz parte do Joule, editoria especial com matérias e podcast do setor de energia do JOTA, feito em parceria com o Instituto Brasileiro de Transição Energética (Inté).

Além disso, a ANP também indica que “o país se encontra à frente em algumas soluções, como produção de biocombustíveis, e ainda em desenvolvimento de outras, como captura e armazenamento de carbono (CCS) em larga escala e produção de hidrogênio de baixa intensidade de carbono.”

Esse resultado é fruto de investimentos que devem ser mantidos ao longo dos próximos anos. O plano de negócios da Petrobras de 2025 a 2029 prevê 15% de investimentos em baixo carbono – um aumento em relação aos 11% do plano anterior – incluindo projetos de energias renováveis e de captura de carbono.

Ao Estúdio JOTA, a Petrobras explica que a descarbonização das operações passa pelo aumento da eficiência operacional e energética dos nossos processos, pela maior utilização de geração renovável, pelo uso de combustíveis sustentáveis, além de tecnologias de captura e utilização de carbono (CCUS).

A empresa também reafirma o desejo de atender demandas energéticas até 2050 com petróleo de boa qualidade e baixo carbono. “O petróleo a ser produzido pela Petrobras a partir de novas descobertas, com baixo custo e baixa emissão por barril, será extremamente importante na medida em que permitirá o atendimento da demanda resiliente de petróleo por uma oferta mais eficiente e com menor emissão que a média mundial”, diz posicionamento da empresa enviado ao JOTA.

Desafios para um petróleo ainda mais limpo

Mesmo com posição de destaque, o Brasil ainda pode fazer mais no sentido da descarbonização da cadeia de óleo e gás, mas enfrenta alguns desafios. O primeiro deles é geológico: como o combustível fóssil produzido no país é majoritariamente offshore, há intrinsecamente maior gasto energético do que quando comparado ao petróleo produzido em terra.

Isso significa que são necessárias mais tecnologias para mitigar os efeitos da exploração. O que leva ao segundo desafio, que é justamente tecnológico. Ainda que as tecnologias de descarbonização estejam avançadas no Brasil, é preciso um desenvolvimento ainda maior para dar conta dos problemas advindos da produção offshore.

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Além disso, a ANP explica que “a transição energética atual, diferente das que aconteceram anteriormente da lenha para o carvão e do carvão para o petróleo, exige que as ações sejam realizadas em um curto prazo e priorizando fontes menos eficientes e mais caras”.

Nesse cenário, a agência reforça a complexidade tecnológica e destaca que isso implica em um alto custo para a implementação de soluções de descarbonização. “[Isto] exige um programa de financiamento estruturado e a cooperação entre os diversos atores comprometidos com os objetivos do Acordo de Paris”, afirma.

Investimento em Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação

Se o Brasil se encontra hoje em posição de destaque neste âmbito, isto é, em grande parte consequência da política de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (PD&I). Desde 1998, obrigatoriamente 1% da receita bruta das empresas do setor de energia deve ser investido em pesquisa, desenvolvimento e inovação. Em 2024, os investimentos obrigatórios em PD&I totalizaram R$ 4,2 bilhões.

Dados da ANP de 2024 apontam que 56% da verba de PD&I entre 2016 e 2024 foi destinada à exploração e produção de petróleo e gás natural, a maior fatia do dinheiro. Esta verba é destinada tanto a projetos conduzidos internamente pelas empresas, quanto a centros de pesquisas externos, associados a universidades, por exemplo.

Alfredo Renault, diretor do Centro Virtual de Soluções Tecnológicas de Baixo Carbono da Coppe/UFRJ, explica que “parte relevante dos investimentos em PD&I das empresas de petróleo é voltada também para projetos que envolvam novas tecnologias para a produção de energia de baixa emissão, captura de carbono, hidrogênio e outros desafios tecnológicos que a transição energética nos trouxe”, além dos projetos que visam diminuir emissões do processo produtivo.

Entre os projetos de destaque financiados com verbas de PD&I, o HISEP da Petrobras é um dos que mais chama atenção atualmente. O High Pressure Separation (separação em alta pressão, em inglês) é uma tecnologia que separa e reinjeta o gás carbônico ainda no fundo do mar, sem necessidade de realizar o processo na superfície, como é feito normalmente.

Para o diretor do centro carioca, “essa tecnologia trará uma importante mudança no processo de produção e terá grande contribuição para diminuir ainda mais a pegada de carbono da produção de petróleo no Brasil, que já é das mais baixas do mundo”.

Outras tecnologias de descarbonização que vêm sendo desenvolvidas envolvem, por exemplo, o uso de inteligência artificial e dos chamados “gêmeos digitais”, no qual é possível reproduzir em terra todo o funcionamento de uma plataforma de petróleo, permitindo comandos remotos. Dessa forma, há uma diminuição da quantidade de pessoas na plataforma e, consequentemente, uma menor emissão de gases do efeito estufa no processo.

Além das tecnologias de descarbonização, a verba de PD&I também vem sendo investida em projetos de biocombustíveis, energia eólica offshore, entre outros. “O interesse não se restringe à descarbonização da cadeia de O&G e sim a uma busca tecnológica dos diversos temas que envolvem a transição energética”, explica Alfredo Renault.

Para o presidente do IBP, Ricardo Ardenghy, um dos pontos mais interessantes desta cláusula é o fato de que o próprio setor do petróleo financia a transição energética. “Se não tivesse esse dinheiro, hoje estaríamos comprando tecnologia. O Brasil é um dos poucos países onde tem pesquisa própria no setor de óleo e gás”, diz. “É dinheiro privado em benefício do Brasil”, completa.

Bacia de Pelotas

Depois da descoberta de petróleo na costa da Namíbia, surgiu a suspeita de petróleo também no litoral sul do Brasil. Isto porque as duas áreas eram coladas na época da pangeia, durante o final da Era Paleozoica e início da Era Mesozoica, quando os continentes eram apenas um, e por isso compartilham semelhanças geológicas.

A área da Bacia de Pelotas ocupa todo o litoral do Rio Grande do Sul e a parte sul do litoral catarinense. Ela foi dividida pela ANP em 44 blocos, que foram arrematados pela Petrobras e algumas empresas estrangeiras, como Shell, CNOOC Chevron.

Atualmente, a área ainda está em fase inicial de exploração, com estudos sendo conduzidos para verificar se de fato há petróleo e gás, se é possível explorá-los e em qual quantidade. No entanto, a região já é vista por especialistas como essencial para garantir a segurança energética do Brasil, sem necessidade de importação de combustível.

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O presidente do IBP explica que ainda é muito cedo para entender quais seriam as tecnologias de descarbonização utilizadas na Bacia, em se confirmando a presença de óleo e gás na área. Ricardo Ardenghy, porém, aponta que esta é uma oportunidade para o uso de novas tecnologias que vêm sendo desenvolvidas. “Essa parte de digitalização e de tecnologia artificial veio para ficar”, exemplifica.

Já a Petrobras afirma estar “comprometida em desenvolver essa área com as mais avançadas tecnologias de descarbonização, com segurança e a responsabilidade socioambiental reconhecida em todas as operações da Petrobras”.

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