Nova Lei de Licitações e os programas de integridade: o que esperar da CGU?

A Controladoria-Geral da União (CGU) abriu consulta pública sobre a minuta de portaria que definirá o procedimento e a metodologia para avaliação de programas de integridade no âmbito da Nova Lei de Licitações, nos termos do Decreto 12.304/2024, editado em dezembro. 

A minuta foi disponibilizada pela Secretaria de Integridade Privada da CGU, e os interessados poderão enviar contribuições até o dia 17 de abril pela Plataforma Participa + Brasil. A portaria deverá ser editada ainda no primeiro semestre e impactar a rotina de empresas que contratam com o setor público.

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A Nova Lei de Licitações prevê a obrigatoriedade de implementação de programas de integridade em três hipóteses: (a) contratações de obras, serviços e fornecimentos de grande vulto, definidos como aqueles cujo valor contratual seja superior a R$ 250.902.323,87; (b) situações de desempate entre duas ou mais propostas; e (c) processos de reabilitação de empresas sancionadas por ilícitos licitatórios ou pela prática de atos lesivos previstos na Lei Anticorrupção.

O Decreto 12.304, por sua vez, prevê que a CGU manterá rotina para recebimento de informações e evidências relativas à implantação, ao desenvolvimento ou ao aperfeiçoamento dos programas de integridade. O decreto estabelece que essas informações devem ser apresentadas pelos licitantes: (a) no prazo de até seis meses após a assinatura de contrato de grande vulto; (b) no momento da apresentação da proposta na licitação; e (c) no momento da apresentação do pedido de reabilitação por empresa sancionada. 

A portaria – esperada para as próximas semanas – será de especial importância porque detalhará os procedimentos e critérios para avaliação de programas de integridade pela CGU.

O primeiro aspecto de destaque é que os parâmetros de avaliação dos programas de integridade, previstos na minuta, estão alinhados com a legislação anticorrupção. Nesse contexto, os programas serão avaliados com base em critérios como comprometimento da alta direção, padrões de conduta, código de ética, políticas e procedimentos de integridade aplicáveis a colaboradores e terceiros, treinamentos periódicos, independência, estrutura e autoridade da função de compliance, mecanismos adequados de diligência, transparência e responsabilidade socioambiental, entre outros.

Para que seja considerado implantado pela CGU, o programa de integridade deve estar estruturado, atualizado e em efetiva aplicação, compatível com as características e os riscos relevantes das atividades da pessoa jurídica — especialmente aqueles decorrentes de contratações de grande vulto com a Administração Pública. 

Nesse sentido, a CGU avaliará as características do contrato administrativo que possam impactar os riscos à integridade, notadamente o objeto contratado, a possibilidade de subcontratação e o prazo de vigência.

A CGU avaliará o programa de integridade com base na análise de um conjunto de medidas, organizadas em dez áreas distintas. Cada quesito será pontuado individualmente, e a pontuação máxima a ser atribuída no conjunto das dez áreas será definida pela CGU quando concluída a metodologia de avaliação. Para fins de atendimento aos requisitos de integridade nas contratações de grande vulto, considera-se que o Programa de Integridade está formalmente implantado quando a avaliação conduzida pela CGU alcançar, cumulativamente: (i) pontuação global igual ou superior a quantitativo de pontos a ser estabelecido na norma; e (ii) o atingimento de percentual mínimo da pontuação prevista em cada uma das áreas de avaliação.

Nesse ponto reside a principal diferença entre a avaliação dos programas de integridade no âmbito da Lei de Licitações e aquela prevista na legislação anticorrupção. Enquanto esta última se destina essencialmente à mitigação da multa aplicável em razão de atos de corrupção — sem a exigência, a priori, de pontuações mínimas por item —, a avaliação no contexto das contratações de grande vulto parte da fixação de notas de corte: uma pontuação mínima global e percentuais mínimos por área temática, cujo atingimento será condição necessária para que o programa seja considerado efetivamente implementado. Ou seja, um programa não poderá ser totalmente deficitário em uma área específica no âmbito da Nova Lei de Licitações.

A pessoa jurídica contratada deverá submeter evidências de implementação do programa de integridade em até 30 dias após decorrido o prazo para assinatura de contrato de grande vulto, a partir do Sistema de Avaliação e Monitoramento de Programas de Integridade – SAMPI, com o preenchimento de formulários de perfil e de conformidade – a exemplo do que ocorre no âmbito de negociação de acordos de leniência.

A CGU disporá de amplo poder de diligência para a avaliação dos programas de integridade, podendo solicitar o envio, a complementação ou a atualização de informações necessárias, além de realizar diligências in loco, com visitas técnicas e entrevistas com dirigentes e colaboradores da pessoa jurídica contratada.

A avaliação do programa de integridade poderá ser dispensada (a) se o programa de integridade tiver sido considerado implantado por outro ente público federal, estadual ou municipal nos últimos vinte quatro meses, desde que observada a metodologia de avaliação a ser prevista na portaria; (b) se a pessoa jurídica contratada constar na lista da Empresa Pró-Ética da CGU; e (c) caso esteja em curso avaliação para a mesma pessoa jurídica do contexto de outro contrato.

Nos casos em que o programa de integridade não atingir as pontuações mínimas exigidas, a CGU elaborará um plano de conformidade com recomendações específicas para a empresa. A pessoa jurídica terá o prazo de até seis meses, contados do recebimento do resultado da avaliação, para implementar as medidas indicadas. 

O descumprimento desse prazo, ou a confirmação da não implementação do programa após eventual apresentação de informações complementares, sujeitará a empresa à aplicação de sanção pecuniária de 1% a 3% do valor do contrato de grande vulto, além da penalidade de impedimento de licitar e contratar. Caso, em nova avaliação, persista o descumprimento dos parâmetros mínimos de integridade, a penalidade aplicável será a declaração de inidoneidade da pessoa jurídica.

Para a hipótese de utilização do programa de integridade como critério de desempate, será considerada declaração do licitante de que possui programa de integridade no momento da apresentação da proposta do processo licitatório. 

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Para fins de aplicação do programa de integridade como critério de desempate em licitações, a comprovação será feita por meio de declaração do licitante atestando possuir programa de integridade no momento da apresentação da proposta. Essa declaração deverá ser formalizada mediante adesão ao Pacto Brasil pela Integridade Empresarial — iniciativa da CGU criada para fomentar boas práticas empresariais, nos termos da Portaria Normativa CGU nº 160/2024.

A adesão ao Pacto Brasil exige que o licitante realize uma autoavaliação estruturada das suas medidas de integridade, com base em metodologia elaborada pela própria CGU. Para que o critério de desempate seja aceito, essa autoavaliação deverá (i) indicar a existência de elementos mínimos para um programa de integridade e (ii) ser divulgada publicamente no portal do Pacto Brasil, em transparência ativa.

Embora se trate de um procedimento simplificado — proporcional ao caráter acessório do critério de desempate — o modelo adotado pela CGU inova ao condicionar o benefício à realização de um autodiagnóstico. Além disso, a norma deixa claro que a CGU poderá realizar procedimentos de verificação sobre os dados declarados pelos licitantes, o que reforça o caráter orientador, mas também fiscalizatório, da iniciativa.

Está prevista, ainda, a edição de regulamento específico pela Secretaria de Integridade Privada da CGU, com o objetivo de disciplinar os procedimentos e atribuições dos órgãos e entidades federais responsáveis pela prestação de informações sobre contratos, processos licitatórios e processos de reabilitação vinculados às avaliações de programas de integridade. 

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O regulamento também deverá tratar do encaminhamento dos resultados das avaliações realizadas pela CGU aos responsáveis pela adoção das medidas administrativas cabíveis. Espera-se que a futura norma traga maior clareza sobre o fluxo procedimental das avaliações, especialmente quanto ao intercâmbio de informações entre a CGU e os órgãos licitantes no âmbito federal.

A exigência de programas de integridade no contexto das contratações públicas é medida bem-vinda e adequada ao princípio da proporcionalidade, especialmente considerando sua aplicação restrita a contratações de grande vulto — acima de R$ 250 milhões — e a hipóteses específicas, como o critério de desempate em licitação. 

Trata-se de iniciativa alinhada à natureza de risco das contratações públicas, em que se justifica a adoção de mecanismos de integridade voltados, em particular, à prevenção e à mitigação de riscos associados ao setor público.

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