Recentemente, o ministro Gilmar Mendes declarou que ainda há um contingente significativo de magistrados da Justiça do Trabalho tomados por ideologia. Sua observação, proferida com a franqueza habitual, imediatamente me remeteu a uma pesquisa que orientei no Mestrado Profissional do IDP — e que agora transformo em resenha, às vésperas de sua publicação em forma de livro.
A dissertação de Suzanne Teixeira Odane Rodrigues, intitulada Como decide a Justiça do Trabalho? Uma análise econômica da existência de viés protetivo do trabalhador nas decisões judiciais trabalhistas, parte de uma hipótese ousada, mas sustentada em dados: há um viés protetivo estrutural no Judiciário trabalhista brasileiro, que, embora animado por boas intenções, gera efeitos econômicos adversos, como o aumento da informalidade e do desemprego.
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Sob a ótica da Análise Econômica do Direito — especialmente a partir da teoria pragmática de Richard Posner e da Nova Economia Institucional de Douglass North —, a autora examina a atuação dos magistrados trabalhistas não apenas do ponto de vista jurídico, mas também com base nas consequências práticas de suas decisões. A conclusão é clara: em nome da proteção da parte mais fraca da relação de trabalho, muitos juízes acabam por reforçar um ciclo vicioso de insegurança jurídica, que inibe contratações formais e alimenta a litigiosidade.
O que há de mais valioso neste trabalho, além de sua base teórica sólida, é a abordagem empírica. Suzanne realiza entrevistas com magistrados, analisa jurisprudência e dados quantitativos de ações judiciais. O que emerge desse esforço é um retrato preocupante da cultura institucional da Justiça do Trabalho: uma predisposição reiterada a “criar” direitos não previstos em lei, muitas vezes com base em uma leitura moralizante das relações laborais.
Há, como destaca a autora, uma espécie de “efeito bumerangue” nas decisões — decisões que, ao pretender proteger o trabalhador no caso concreto, acabam prejudicando a coletividade trabalhadora ao elevar os custos de contratação e incentivar a informalidade.
É importante deixar claro que a pesquisa não parte de um viés anti-trabalhista. Pelo contrário: parte da premissa de que a efetiva proteção do trabalhador exige um ambiente institucional funcional, previsível e que considere os efeitos econômicos de suas normas e decisões.
A crítica feita não é à existência de direitos trabalhistas, mas ao modo como o Judiciário interpreta e aplica essas normas, frequentemente desconsiderando os incentivos e desincentivos que cria no mercado de trabalho.
A pesquisa também dialoga com uma questão mais ampla, que é a da contribuição das instituições jurídicas para o desenvolvimento econômico. Douglass North já nos ensinava que instituições importam — e muito. Um sistema judicial que gera insegurança, por mais bem-intencionado que seja, compromete investimentos, reduz a produtividade e prejudica os mais vulneráveis. Como consequência, um Judiciário movido por princípios ideológicos pode acabar traindo os próprios valores que pretende defender.
No Brasil, onde quase metade da população economicamente ativa está na informalidade e as taxas de desemprego ainda são elevadas, discutir o papel do Judiciário trabalhista à luz de dados empíricos e evidências econômicas é mais do que necessário — é urgente. A Justiça do Trabalho precisa repensar seu papel, abandonando o modelo paternalista e assumindo uma postura mais consequencialista, voltada à eficiência, previsibilidade e ao fortalecimento de relações de trabalho sustentáveis.
Na mesma linha da pesquisa, mas com outra metodologia, o professor José Pastore, da Universidade de São Paulo, coordenou um estudo empírico inédito que mensurou o custo econômico da insegurança jurídica na área trabalhista. O relatório, elaborado com apoio da FecomercioSP, mostra como o ativismo judicial e a instabilidade das decisões na Justiça do Trabalho inibem investimentos, afetam a geração de empregos e comprometem a previsibilidade necessária para o desenvolvimento econômico.
A pesquisa identificou, por exemplo, que a imprevisibilidade das sentenças judiciais afasta capitais do país, prejudica empregadores e trabalhadores, e alimenta um ambiente de medo e retração no setor produtivo. Em termos financeiros, estima-se que apenas a concessão indiscriminada de justiça gratuita — muitas vezes baseada em simples autodeclarações — tenha causado um impacto superior a R$ 5,5 bilhões em perdas para os cofres públicos.
Pastore argumenta que o ativismo judicial trabalhista, marcado por decisões voluntaristas, amplia o Custo Brasil e cria um círculo vicioso de judicialização e insegurança, com efeitos sistêmicos que vão muito além do caso concreto. Esse estudo, ao lado da pesquisa de Suzanne Teixeira, evidencia a urgência de reformar não apenas a legislação, mas também a cultura institucional da magistratura trabalhista no Brasil.