Caso Marielle e Medellín: as influências no voto conjunto da ADPF das Favelas no STF

Até se chegar a um consenso sobre o voto final conjunto da ADPF das Favelas, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) debateram experiências nacionais, internacionais e os impactos das decisões da própria Corte na violência do estado do Rio de Janeiro. Entre as influências presentes no voto, estão o exemplo do plano para conter a violência em Medellín, na Colômbia, e a federalização das investigações do assassinato de Marielle Franco.

Havia entre os ministros uma premissa: deixar claro que não existe antagonismo entre a proteção de direitos humanos e fundamentais e a segurança pública.

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Já no primeiro almoço entre os ministros para se chegar a um denominador comum, Gilmar Mendes defendeu que a Polícia Federal e órgãos de inteligência da União, como a Receita Federal e o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), tivessem um papel mais ativo no combate ao crime organizado. A discussão logo foi encampada pelos demais ministros — em especial aqueles que comandaram a pasta da Justiça, como Flávio Dino, André Mendonça e Alexandre de Moraes.

Os ministros entenderam que já havia um arcabouço legal para essa participação da União nos crimes de repercussão nacional e internacional — a Lei 10.446/2002.

O exemplo da investigação da morte da vereadora Marielle Franco (PSol) e do motorista Anderson Gomes esteve nas discussões. Apenas depois da federalização do crime, em fevereiro de 2023, na passagem de Dino pelo Ministério da Justiça, o caso foi elucidado. A investigação da Polícia Federal apontou que havia dentro da própria Polícia Civil do Rio de Janeiro uma força-tarefa para impedir que se chegasse aos irmãos Brazão como culpados. O delegado responsável pelo caso, Rivaldo Barbosa, é réu e continua preso.

A partir da consideração do caso Marielle, os ministros chegaram ao consenso de que a Polícia Federal deveria entrar em investigações envolvendo crime organizado nacional e transnacional e de grave violação aos direitos humanos, assim como poderia instaurar inquérito para apurar infiltrados do crime organizado no poder público.

Os números da violência no Rio de Janeiro após as liminares concedidas pelo STF desde 2020 foram importantes para os ministros analisarem o que deu certo e o que não deu. De uma forma geral, os números foram de decréscimo da violência. O relator, Edson Fachin, destacou aos colegas que no período houve redução do número de mortes decorrentes de intervenção policial e do número de agentes policiais mortos, redução acompanhada pela queda dos índices oficiais de crimes patrimoniais e contra a vida. Ao mesmo tempo, ponderou a dificuldade de conter o aumento do número de ruas e bairros sob controle de facções.

Diante desse quadro, partiu do presidente do STF, Luís Roberto Barroso, a inspiração do que foi feito em Medellín, em que a violência diminuiu após locais antes tomados por facções criminosas serem pacificados. Por isso, Barroso trouxe a ideia de inserir no voto os princípios do urbanismo social e a determinação para que o estado do Rio de Janeiro e municípios interessados elaborassem um plano de reocupação territorial de áreas que estão atualmente sob domínio de facções criminosas.

Assim, a ideia dos ministros é viabilizar a presença permanente do poder público por meio da instalação de equipamentos públicos, de políticas voltadas à juventude e da qualificação de serviços básicos para estas regiões tomadas por organizações criminosas.

Os ministros também entraram em consenso de que o STF ainda continuará fiscalizando o cumprimento da decisão manifestada a “uma só voz”, como bradou Fachin.

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