O governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vai fazer uma grande disputa política em torno da taxação dos ricos como medida compensatória da isenção do Imposto de Renda até R$ 5 mil, mas nos bastidores já admite ceder parcialmente neste flanco.
A leitura é que, desde que esteja garantida a cobertura da conta do benefício para a classe média, há disposição de negociar mexidas no projeto que vierem a ser propostas pelo Congresso, mesmo que isso signifique começar a nova tributação em algum nível acima dos R$ 50 mil originalmente propostos ou mexer na escadinha que coloca a alíquota de 10% acima de R$ 120 mil mensais.
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O PP largou na frente nesse processo. Liderado pelo presidente, senador Ciro Nogueira (PI), o partido do centrão apresentou uma série de ideias de compensação, mirando amenizar a proposta inicial do governo. Além de subir para R$ 150 mil mensais o ponto de partida da cobrança, a proposta alonga a escadinha da taxação, que chegaria a 15% só para rendas acima de R$ 1 bilhão anuais.
Para completar a conta da compensação, o partido do qual faz parte o recém-indicado relator da matéria na Câmara, Arthur Lira (AL), também propôs uma redução linear de 2,5% em benefícios tributários, e a elevação de 5% na CSLL de bancos.
Como não seria “centrão” se o partido não fizesse algo que impactasse os gastos, a proposta também prevê que o governo federal terá que ressarcir estados e municípios pelo impacto da isenção na arrecadação dos governos regionais.
Direcionando o debate
A proposta do PP deve ser vista, nesse primeiro momento, menos ao pé de letra e mais como uma tentativa de direcionar o debate para aliviar a taxação dos ricos e buscar alternativas para a medida compensatória. A inclusão de uma redução linear de gastos tributários conversa com o que o próprio presidente da Câmara, Hugo Motta, mencionou no seu discurso no Planalto quando foi formalizado o envio do projeto de reforma do IR.
Na ocasião, Motta também colocou como alternativa compensatória a discussão sobre “eficiência do estado”, um eufemismo para corte de gastos.
A seu favor, o governo tem um leque de pesquisas internas, completado com a Quaest dessa semana, mostrando que a população apoia amplamente a taxação dos mais ricos. E isso já está inserido na disputa política no Congresso. Ou seja, ainda que tenha chances razoáveis de ser flexibilizada na tramitação, alguma cobrança de imposto adicional para o “andar de cima” deverá ser aprovada pelos parlamentares.
Cortar emendas melhoraria fiscal
A ideia de fazer uma redução linear de renúncias tributárias trazida pelo PP não é ruim. Já havia esse tipo de discussão no governo, mas o avanço sempre avançou em considerações de viabilidade política. Com o “centrão” entrando nesse jogo, a chance de fazer algo nessa “caixa preta”, como tem chamado o ministro Fernando Haddad, aumenta.
O ideal seria que tanto a taxação dos ricos quanto a diminuição de renúncias prosperassem. Afinal, o país ainda precisa avançar na melhora de sua posição fiscal e consolidar resultados primários positivos — lembrando que a meta fiscal de 2026 é de um superávit de 0,25% do PIB, algo que parece bastante desafiante.
É claro que também há desafios do lado do gasto a serem enfrentados no Brasil e isso não pode ser esquecido, o que nem de longe significa deixar de caminhar para corrigir o iníquo sistema tributário brasileiro. Atacar o sistema de privilégios remuneratórios do setor público (em especial do Judiciário), o excessivo gasto de pessoal com militares, o assombroso volume de emendas parlamentares em um orçamento já bastante engessado e a elevada rigidez dos gastos públicos também deveria ser prioridade da agenda legislativa neste ano.
Só um exemplo: se o Congresso reduzisse em R$ 15 bilhões suas emendas parlamentares (reduzindo o limite total de gastos na mesma proporção), ainda assim teriam um volume bem acima da média internacional de recursos para usarem livremente nas suas bases e pagaria mais da metade da conta da isenção.
Hugo Motta, Davi Alcolumbre e Arthur Lira terão coragem de recuar um pouco nas emendas? É improvável. Mas o debate precisa ser colocado.