A regulação da cosmetovigilância no Brasil

O setor de higiene pessoal, perfumaria e cosméticos (HPPC) ocupa uma posição de destaque no mercado global, com o Brasil figurando como o quarto maior mercado mundial[1]. No entanto, o crescimento exponencial desse setor traz desafios regulatórios significativos, especialmente no que diz respeito à segurança dos consumidores e ao dever de informar por parte dos fabricantes.

O que é cosmetovigilância?

A cosmetovigilância refere-se ao conjunto de medidas destinadas a monitorar a segurança de produtos HPPC após sua comercialização. No Brasil, esse sistema é regulado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), com base em resoluções como a RDC 332/2005 e sua substituta mais recente, a 894/2024. Essas normas exigem que fabricantes notifiquem eventos adversos graves associados ao uso de seus produtos e adotem medidas corretivas quando necessário.

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Esse mecanismo é essencial para garantir que produtos amplamente utilizados — como sabonetes, maquiagens, protetores solares e perfumes — sejam seguros para os consumidores. Dados da Anvisa mostram que cerca de 97% dos produtos cosméticos no Brasil são classificados como Grau 1 de acordo com o risco, ou seja, possuem propriedades básicas e não exigem comprovação inicial de segurança ou eficácia[2].

O dever de informar: um direito do consumidor

O Código de Defesa do Consumidor (CDC) estabelece que o fornecimento de informações claras, precisas e completas sobre produtos é um direito básico do consumidor (art. 6º, inciso III). Isso inclui alertas sobre possíveis riscos à saúde e segurança.

No entanto, esse dever não é absoluto. Questões como segredo industrial, proporcionalidade e contextos específicos podem limitar essa obrigação. Por exemplo:

  • Segredo industrial: Informações detalhadas sobre formulações podem ser protegidas por sigilo comercial.
  • Proporcionalidade: O nível de informação exigido deve ser compatível com o risco associado ao produto.
  • Uso indevido: Fabricantes não podem ser responsabilizados por danos decorrentes do uso inadequado dos produtos.

Equilíbrio entre regulação e inovação

A regulação da cosmetovigilância busca equilibrar dois interesses fundamentais: proteger os consumidores contra riscos à saúde e permitir que as empresas inovem sem serem excessivamente oneradas por exigências regulatórias. Esse equilíbrio é especialmente importante em um setor tão dinâmico quanto o de HPPC.

Por exemplo, enquanto produtos classificados como Grau 2 (como protetores solares ou maquiagens com fotoprotetor) exigem registro prévio na Anvisa, os produtos Grau 1 podem ser comercializados mediante simples notificação. Essa diferenciação reduz a burocracia para produtos considerados menos arriscados, mas também exige vigilância constante para evitar problemas.

Conclusão

A cosmetovigilância no Brasil representa um avanço significativo na proteção dos consumidores. Contudo, os limites ao dever de informar mostram que a regulação deve ser aplicada com cautela para evitar conflitos entre dois direitos tão importantes como o direito à informação e a proteção ao segredo industrial.

A discussão sobre esses limites é essencial para aprimorar o marco regulatório brasileiro, garantindo tanto a segurança dos consumidores quanto a competitividade das empresas no mercado global.


[1] Informação retirada do artigo “Cosmetovigilância: um passo a mais na segurança do consumidor”, de Lethícia C. Pereira e Emeli M. de Araújo. Disponível em <https://prouc.uff.br/cosmetovigilancia/>. Acesso em 31 de agosto de 2024.

[2] ANVISA, Relatório Final de Análise de Impacto Regulatório sobre Cosmetovigilância, disponível em <https://www.gov.br/anvisa/pt-br/assuntos/regulamentacao/air/analises-de-impacto-regulatorio/2023/arquivos-relatorios-de-air-2023-2/relatorio_air_cosmetovigilancia_versao_final_26julho23-1.pdf>. Acesso em 31 de agosto de 2024.

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