NR-1 e o gerenciamento dos riscos psicossociais

Não se nega a importância de um ambiente de trabalho equilibrado e saudável e, neste sentido, sempre foi obrigação constitucional do empregador garantir a saúde física e mental da sua população de empregados.

A edição de uma norma que viesse a definir o que seria, precisa e tecnicamente, o risco psicossocial e as diretrizes de como o identificar e mitigar, seja com ações preventivas ou corretivas, era um anseio antigo da sociedade e do mercado de trabalho.

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Ocorre que a publicação da Portaria 1.419/24 do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), a primeira regra a prever, textualmente, o dever do empregador em zelar pela saúde mental dos seus empregados e gerir os riscos psicossociais, o incluindo em seu Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR), do modo que foi estruturada e editada, ao invés de promover a esperada segurança jurídica e médica sobre o tema, apresenta algumas armadilhas que podem ser entendidas como uma carta branca para que a fiscalização do trabalho cobre dos empregadores ações não regulamentadas.

No panorama surgido a partir da publicação desta Portaria, o qual se agravará quando do início de sua vigência, ou seja, em 25 de maio de 2025, há o suspense sobre qual seria o caminho juridicamente seguro para o regular cumprimento da nova Norma Regulamentadora 1 (NR-1) e para a garantia da promoção da saúde mental dos empregados. Diante de tanta indefinição, o discurso latente é que tal não se dará até que o Judiciário delimite as fronteiras do gerenciamento do risco psicossocial.

A dificuldade surge porque, ao mesmo tempo em que a Portaria 1.419/24 pretende resguardar a saúde mental no trabalho, não é precisa em como deve ser cumprida, abrindo espaço para uma fiscalização que pode punir até quem esteja em compliance com as suas obrigações legais. Essa falta de clareza tem levado muitos empregadores a estudarem a viabilidade de se discutir o assunto judicialmente, a fim de suspender ou reduzir o alcance dessas exigências, até que a insegurança jurídica gerada seja sanada.

Importante que se deixe claro que ao optar por esta medida judicial, o empregador não estará negando a importância do gerenciamento do risco à saúde mental no trabalho, apenas questionará se o Ministério do Trabalho tem, por si só, poderes para regulamentar o tema, sobretudo quando o faz sem critérios objetivos e técnicos, bem como em contrariedade a lei, expondo os empregadores à inegável insegurança jurídica.

Neste caminho, quando uma norma em tese deriva de um ato administrativo e impõe obrigações não prevista em lei, há quem sustente a efetiva extrapolação do poder regulamentar. Este, inclusive, seria um dos argumentos hábeis a embasar o pedido de liminar em um mandado de segurança preventivo, com o intuito de se suspender os efeitos da portaria até o julgamento final da ação.

Outro argumento legítimo e que tem sido alvo de grande discussão é o conflito da Portaria com a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). A coleta de informações para mapear riscos psicossociais e promover o seu gerenciamento, envolve aspectos da vida privada do trabalhador e seu histórico médico. Portanto, o empregador corre o risco de ter de explicar ao auditor-fiscal do trabalho porque não recolheu relatórios detalhados e, ao mesmo tempo, ser processado por um empregado alegando violação de privacidade.

Assim, a norma pode levar à exposição indesejada dos dados sensíveis, oferecendo ao empregador o dilema que envolve o receio de uma autuação do MTE versos o temor de infringir a LGPD, se sujeitando a infrações de ambos os lados e a multas por razões diametralmente opostas, mas decorrentes de uma mesma ação.

Há também quem prefira discutir a pertinência de uma ação ordinária ou coletiva sobre o tema, as quais permitiriam a produção de provas mais robustas, inclusive acerca dos custos que demonstrem o peso financeiro que a nova NR-1 poderia trazer, sem a devida segurança de com ela estar em compliance, já que não há parâmetros para o efetivo cumprimento da nova norma.

Isso reforça que a regulamentação se tornou um labirinto sem saída para o empregador em que o auditor-fiscal exigirá o gerenciamento do risco à saúde mental no ambiente de trabalho, mas o MTE não determina claramente como o empregador deverá cumprir o seu dever de mapear e gerir os riscos que, naturalmente, envolve percepções subjetivas e análise e métodos científicos que não são devidamente estruturados pela NR-1 ou outra norma que trate do tema nesta esfera.

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Adicionalmente, apesar da urgência sentida pelas empresas diante da proximidade da vigência da nova norma, há quem pense em acionar confederações ou sindicatos patronais para levar a controvérsia diretamente ao Supremo Tribunal Federal (STF), pois defendem a necessidade da declaração de inconstitucionalidade da portaria por ferir os princípios da legalidade e da proporcionalidade.

Novamente se afirma que não se pode negar o valor e necessidade de se gerenciar o risco psicossocial para preservação de um ambiente de trabalho livre de estresse para a saúde metal. Entretanto, as alterações promovidas na NR-1 não são claras ou eficazes em sua forma.

Por conseguinte, enquanto o MTE não se propuser a melhor estruturar as regras para inclusão dos fatores de riscos psicossociais no gerenciamento de riscos ocupacionais, a exemplo do que acontece com os fatores de riscos ergonômicos e os decorrentes de agentes físicos, químicos, biológicos e de acidentes, as ações judiciais seguem como opção para quem teme as consequências negativas que as alterações da NR-1 podem implicar, pois não está devidamente estruturada e não traz a transparência necessária para o cumprimento de seus comandos.

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