Justiça do trabalho opera com ‘estímulos envelhecidos’, critica Gilmar Mendes

O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), defendeu a necessidade de se repensar as leis trabalhistas no Brasil. Isso por causa da percepção do aumento da terceirização e da informalidade nos últimos anos, que tem gerado maiores demandas à Justiça do Trabalho. Para ele, as mudanças nas relações de trabalho – que ultrapassam a noção de vínculo de emprego – pressionam por um olhar renovado. 

“Está havendo uma mudança significativa e nós temos que perceber isso, tentar decifrar um pouco esse fenômeno. Talvez estejamos operando com estímulos envelhecidos”, disse. A fala ocorreu durante debate sobre segurança jurídica nos contratos empresariais, promovido na Casa JOTA, em Brasília, nesta quinta-feira (20/3). 

Para o ministro, é preciso reconhecer a pluralidade dos modelos de trabalho, e entender que as relações que existem não são, necessariamente, relações de emprego. “Não podemos perder de perspectiva esse ´Brasilzão´, com múltiplas realidades. Existem assimetrias que precisamos reconhecer e rever a ideologia excessivamente protecionista, de que é só na presença do juiz ou de uma grande formalidade que se vai resolver o  problema”, completou.  

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O ministro Alexandre Agra Belmonte, do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que também participou da programação, afirmou que cabe ao parlamento redirecionar a legislação para adequar as demandas atuais e garantir a segurança do ambiente de negócios. Segundo ele, a legislação abarca conceitos que não existem mais no Brasil.

“A legislação trabalhista permanece baseada na presença física do trabalhador, na divisão do trabalho, no tempo de relógio para a permanência do estabelecimento patronal. Isso não existe mais no mundo de hoje”, disse. 

Os contratos empresariais

O entendimento de juristas participantes do debate é de que a falta de consenso sobre o tema faz com que os processos se acumulem nos tribunais e tenham resultado parecido. A tese é confirmada por estudo recente, elaborado pelo JOTA e encomendado pela Prudential. 

O levantamento de processos julgados em 2024 no STF que tratam de pedidos de  vínculo empregatício em contratos empresariais, comerciais e de franquia, mostrou que há uma tendência maior em negar o vínculo empregatício nesses casos. Dos 1.211 processos analisados, 849 (70% do total) tiveram decisões favoráveis às empresas. 

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Nos casos que envolvem franquias, as decisões consideram a Lei de Franquias (Lei 13.966/ 2019), que estabelece que não há vínculo empregatício entre a franqueadora e o franqueado. As normas também se aplicam aos empregados do franqueado, por entender que se trata de uma relação comercial entre empresas. 

Segundo o relatório, o mais comum é que o Supremo reconheça que não há vínculo de emprego quando há esses contratos e encaminhe que eles passem por nova análise da Justiça do Trabalho. Mas alguns ministros têm entendido que esses acordos alvos de reclamações devam ser submetidos, primeiro, à Justiça comum.

Alberto Bresciani, ministro aposentado do TST, em evento na Casa JOTA. Imagem: Paulo Negreiros/JOTA

Alberto Bresciani, ministro aposentado do TST, classificou como “preocupante” o número de reclamações constitucionais, que tem aumentado. “Atribuo essa situação a alguma indisciplina judiciária”, disse. Mas ele ponderou que, diante do universo das demandas trabalhistas no Judiciário, ainda é minoria os casos que chegam ao Supremo por meio das reclamações. “O fato é que, nos últimos anos, mais de um milhão de processos foram distribuídos para a Justiça do Trabalho demandando as relações de emprego em contratos empresariais”, comentou.

Franquias no centro das discussões

Um dos principais pontos do debate foi a atuação das franquias e a relação que se estabelece entre franqueados e franqueadores, no Brasil. O tema está pendente de julgamento no STF que analisa a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 1.149, proposta pelo Partido Novo.

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A sigla pede para que seja reconhecida a incompetência da Justiça do Trabalho em casos envolvendo pedidos de reconhecimento de relação trabalhista entre os envolvidos em contratos de franquias. A Procuradoria-Geral da República (PGR) se manifestou nos autos pela procedência da ADPF para declarar a competência da Justiça Comum para decidir sobre a validade do contrato do modelo de negócio. 

Para o advogado Eduardo Ferrão, que atua no segmento, a estabilidade do ordenamento jurídico e a previsibilidade das decisões judiciais, responsáveis por garantir a segurança jurídica das empresas, precisam acompanhar a evolução social, econômica e política do país.

“É o caso de contratos de franquia e de alguns contratos de prestação de serviços, cujas especificidades as colocam num patamar bem distante daqueles outros em que há a configuração do vínculo empregatício”, defendeu. Segundo Ferrão, o STF tem compreendido essa situação e “tratando de uma forma correta a diferença dessas relações.”

Assista ao evento na íntegra

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