Direito, música e o poder da conexão

Sempre acreditei no ditado de que “se você é a pessoa mais inteligente da sala, você está na sala errada”. Afinal, se somos a soma das experiências e pessoas que cruzam o nosso caminho, nada mais importante que nos rodearmos de indivíduos que nos inspiram a ir cada vez mais longe. No meio corporativo, isso se torna ainda mais relevante.

Foi com esse pensamento que iniciei em 2023 uma experiência que transformou a minha vivência jurídica até então: cursar o programa de LL.M. (Master of Laws) na New York University. Escolhi a especialização em Competition, Innovation and Information Law, focando nas minhas áreas de atuação – propriedade intelectual, privacidade e regulação de novas tecnologias.

Conheça o JOTA PRO Poder, plataforma de monitoramento que oferece transparência e previsibilidade para empresas

O auge desse meu ciclo no exterior veio com a notícia de que eu havia sido selecionada para o programa de Summer Internship da maior empresa de streaming musical do mundo, a Spotify, na sede de Nova York. O programa, que recebeu em 2024 mais de 91 mil candidaturas, dura aproximadamente três meses. O tempo era curto, mas a vontade de aproveitar ao máximo a experiência era enorme.

Estava alocada junto ao time jurídico, mas inúmeras eram as oportunidades de interagir com os outros 85 global interns das mais variadas áreas – engenharia, programação, compliance e tantas outras –, o que tornou a experiência ainda mais enriquecedora. Não demorou para eu perceber que, tão importante quanto aprofundar meu conhecimento jurídico, viver intensamente a cultura da Spotify seria uma das maiores fontes de aprendizado disponível.

Em seu Band Manifesto, a empresa compara o seu funcionamento ao de uma banda, enfatizando que todos os seus integrantes precisam estar em sincronia e dependem uns dos outros para criar a melhor experiência possível. Os valores que dão suporte a esse funcionamento são amplamente divulgados: inovação, sinceridade, entusiasmo, colaboração e diversão.

Isso resulta em uma cultura que prioriza agilidade à burocracia; promove autonomia ao invés da dependência em hierarquias tradicionais; e enxerga a inclusão como um dos pilares para a oferta de melhores produtos. Conforme analogia utilizada pela própria empresa, sem uma diversidade de instrumentos, o resultado de uma banda seria bastante monótono.

De fato, trabalhar na Spotify significou vivenciar o compromisso constante com a inovação. Participei de equipes multidisciplinares em que advogados, engenheiros e designers colaboravam para solucionar questões complexas e garantir que novos projetos fossem implementados dentro de um arcabouço jurídico robusto. Novas features são desenvolvidas a cada semana, e debates sobre melhorias aos usuários ocorrem diariamente.

Inscreva-se no canal de notícias do JOTA no WhatsApp e fique por dentro das principais discussões do país!

Estar imersa em um ambiente tão ágil e dinâmico reforçou minha convicção de que, de um lado, o Direito precisa estar em constante diálogo com as novas tecnologias para acompanhar o ritmo acelerado do mercado. De outro, de que nós, advogados, precisamos entender a fundo as peculiaridades do negócio para sermos capazes de realmente alavancar – e não empacar – a inovação.

Além disso, pude vivenciar uma cultura corporativa que celebra suas origens. Já no primeiro dia do programa, fui introduzida ao conceito de “Fika”, uma tradição semelhante ao nosso “cafezinho” – um momento de relaxamento e de conversação que faz parte da rotina dos suecos. Esse momento é amplamente difundido nas diferentes sedes da empresa, e todos são incentivados a contatar colegas para vivenciar essa pausa e fortalecer laços.

Durante o verão, participei de 20 Fikas, trocando experiências e recebendo conselhos valiosos (de carreira e de vida) de pessoas de diferentes backgrounds – desde estagiários até a General Counsel da empresa, que reporta diretamente ao CEO e fundador da Spotify. Aprender sobre a história de cada uma dessas pessoas, o que as motiva e o que as faz permanecer na empresa não era exatamente o conhecimento que eu esperava adquirir quando iniciei o programa, mas, sem dúvidas, foi o mais importante deles.

Ao lado do reconhecimento das suas raízes, a valorização da diversidade está presente no dia a dia da companhia de maneira tangível e impactante. Mais de 15 belonging communities são responsáveis por criar espaços de pertencimento para os “membros da banda” (como os funcionários são chamados). Atitudes que podem parecer simples, como variar o cardápio do refeitório para refletir diferentes culturas – desfrutei desde tacos mexicanos até habichuelas dominicanas –, aumentam o senso de pertencimento de forma imensurável em um time global.

Tal pertencimento é amplificado por iniciativas pioneiras como a Wellness Week, que, há quatro anos, concede a todos os funcionários da empresa uma semana de descanso simultaneamente e em escala global. Como relatado pela companhia, essa prática também se inspira em suas raízes: durante o verão sueco, é comum ver escritórios inteiros fechando enquanto os funcionários aproveitam ao máximo os longos dias e absorvem a tão esperada luz do sol.

Minha impressão é que a memória da origem da empresa traz clareza e entusiasmo em relação ao que vem pela frente. E todos esses detalhes, dos mais singelos aos de maior impacto, criam um senso de comunidade único e demonstram que é possível equilibrar produtividade e bem-estar.

Em um mundo cada vez mais tomado por burnouts e pedidos de demissão, ver pessoas genuinamente motivadas no trabalho foi um suspiro de alívio e uma verdadeira inspiração. Talvez isso mostre que tão (ou mais) importante que investir nas tecnologias mais recentes seja investir na criação de culturas autênticas e engajadas, capazes de promover senso de pertencimento e propósito.

Adicionar aos favoritos o Link permanente.