Vetos da reforma tributária ameaçam fundos de investimento

Em janeiro deste ano, em cerimônia no Palácio do Planalto, o presidente da República sancionou o PLP 68 de 2024, agora Lei Complementar 214 de 2025, que trata da tão falada reforma tributária do consumo.

A reforma tributária trouxe consigo diversas mudanças no Sistema Tributário Nacional, dentre as quais se destaca a instituição do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e da Contribuição Social sobre Bens e Serviços (CBS), que serão impactantes para os setores econômicos do país.

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De início, cabe ressaltar que os novos tributos possuem como fato gerador todas as operações onerosas, decorrentes de qualquer tipo de ato ou negócio jurídico, que resultem no consumo de bens, serviços e direitos. Não obstante isso, incidem também sobre determinadas operações não onerosas, como o fornecimento de bens e serviços para o uso e consumo pessoal do próprio contribuinte, se pessoa física, ou de empregados e administradores, quando pessoa jurídica, alcançando, também, operações realizadas a valor inferior ao de mercado.

Além da sanção, o presidente apresentou um total de dezoito vetos, destacando-se aqueles que, na prática, tornam quaisquer fundos de investimentos como possíveis contribuintes do IBS e da CBS. Em relação a esses vetos em particular, a justificativa foi a de que não há autorização constitucional para que tais fundos de investimentos, e os fundos patrimoniais, deixem de ser considerados contribuintes dos novos tributos.

Vale lembrar que os fundos são mecanismos de investimentos coletivos que reúnem recursos financeiros de diversos investidores, sejam eles pessoas físicas ou jurídicas, com o objetivo de obter ganhos a partir da aplicação conjunta em ativos financeiros, como títulos e valores mobiliários.

Constituídos sob a forma de condomínio e sem personalidade jurídica, os fundos de investimento operam de acordo com as normas da CVM e possuem regulamento próprio, em que estão detalhadas as regras sobre o seu objetivo, sua política de alocação de recursos, os tipos de ativos negociados, os riscos envolvidos, as taxas de administração e demais despesas, além do regime de tributação e outras informações essenciais aos participantes.

Assim, sob a óptica jurídica, nota-se que, independentemente de haver ou não previsão constitucional nesse sentido, o mero ato de junção de recursos para serem investidos conjuntamente não faz dos fundos de investimento contribuintes dos novos tributos, uma vez que, via de regra, não praticam os seus respectivos fatos geradores (operações que proporcionam o consumo de bens, serviços ou direitos).

Nos parece claro que os vetos tiveram como objetivo sujeitar ao IBS e à CBS os fundos que efetivamente realizam atividades sujeitas à incidência tributária, tal como os Fundos de Investimento Imobiliário (FIIs), que cobram aluguéis de seus imóveis, ou os Fundos de Investimento em Cadeias Agroindustriais (Fiagro), por exemplo. Contudo, ao mesmo tempo, dos vetos resultam a possibilidade de tributação sobre os demais fundos, o que, em nosso entendimento, contraria a nova legislação complementar e a própria Constituição Federal.

Dito de outro modo: com os vetos, o Poder Executivo acaba por trazer insegurança jurídica aos investidores, ao permitir a possibilidade de que esses, ainda que em tese, tenham que arcar financeiramente com a tributação pelo IBS e CBS, consequentemente reduzindo seus ganhos, a partir de uma equivocada e extensiva interpretação dos fatos geradores desses tributos, alcançando de forma indevida os fundos de investimento.

Nesse ponto, vale destacar que não estamos aqui a tratar do serviço de assessoria e administração dos fundos, que é prestado por um gestor, com o intuito de realizar as aplicações e executar as decisões previamente definidas pelos investidores. Essa atividade efetivamente corresponde ao fato gerador dos novos tributos e, por isso, já está contemplada na nova lei complementar.

Ocorre que, diante dessas circunstâncias, parece-nos claro que, em nome da segurança jurídica e da adequada interpretação dos fatos geradores do IBS e da CBS, é necessária uma profunda reflexão se os fundos de investimentos indistintamente devem constar como potenciais contribuintes desses novos tributos, dado que, em geral, não praticam os seus fatos geradores. Isso porque, com os vetos, não apenas os FIIs ou o Fiagro serão contribuintes dos novos tributos, mas, sim, todos os fundos, que poderão, como consequência, perder sua atratividade no mercado financeiro.

Muito provavelmente esse cenário resultante dos vetos comprometerá diretamente o planejamento financeiro dos agentes envolvidos com os fundos de investimento, tendo em vista as suas expressivas movimentações financeiras. Por essa razão, é importante e recomendável que o Congresso pondere, com muita parcimônia, sobre a possível derrubada desses vetos presidenciais, mantendo a segurança jurídica dos investidores e a própria coerência das novas regras da tributação sobre o consumo.

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