Decisões judiciais limitam atuação técnica da Aneel em alguns casos, avalia diretor-geral

Risco hidrológico, leilão emergencial e transferência do controle da Amazonas Energia. Em comum a todos esses casos citados como exemplo está a interferência do Poder Judiciário nas discussões, que, por muitas vezes, afeta o trabalho da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Em entrevista ao JOTA, o diretor-geral do órgão, Sandoval Feitosa, avalia que decisões proferidas pela Justiça acabam, em alguns casos, limitando a atuação técnica, o que enfraquece a agência.

Feitosa afirma que a interferência do Judiciário é legítima, quando se trata de cumprimento de ritos, por exemplo, mas não sobre os aspectos técnicos. Contudo, ressaltou que parte desse problema é gerado justamente por agentes que atuam no setor elétrico, que, em muitos casos, buscam apoio no Judiciário quando não têm pleitos atendidos pelo regulador.

“É legítima a interferência do poder judiciário? Sim, na minha humilde opinião, na discussão sobre forma, na discussão sobre cumprimento de ritos, nunca sobre a tecnicidade da matéria”, afirma. “O setor regulado, de uma forma geral, também contribui para essa judicialização, na medida em que, ao não ter os seus pleitos atendidos na agência, recorre ao Poder Judiciário, e muitas das vezes levando discussões técnicas.”

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O caso mais recente, envolvendo a Amazonas Energia, é classificado como um processo decisório “confuso” por Feitosa. Sem consenso na diretoria, a agência reguladora teve de, por força de decisão judicial, aprovar a transferência de controle para a Âmbar Energia, do grupo J&F, nos termos propostos pela empresa.

“É um cenário confortável? Não é, em absoluto”, diz. “Em algum momento essa questão judicial tem que ser pacificada com a Advocacia Geral da União, com a empresa e a agência reguladora. É uma prioridade da agência resolver esse imbróglio, porque nós não podemos deixar, de maneira alguma, uma concessão de serviço público sem a certeza da continuidade do serviço, que é premissa basilar de uma concessão de serviço público, principalmente de distribuição.”

No que se refere ao Poder Legislativo, Feitosa defende a necessidade de os aprimoramentos feitos por parlamentares levarem em conta a análise de impactos técnicos e tarifários, para que se possa chegar à melhor legislação possível. Segundo o diretor-geral, a relação com o Congresso “nunca esteve tão boa”, ressaltando que os diretores da agência têm tido amplo acesso aos parlamentares que atuam no segmento.

Sobre a relação com o Executivo, marcada por críticas públicas do ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, em relação à agência, Feitosa diz acreditar que a sociedade de forma geral ganha quando há um alinhamento entre o Poder Concedente, ministérios e as agências reguladoras. “É o que permanentemente busco e procuro. A forma de atuação da agência, institucionalmente, sempre foi de busca incessante e incondicional de diálogo”, disse.

Prioridades para 2025

A diretoria da Aneel retoma nesta terça-feira (21/1) as reuniões ordinárias semanais. Para além de concluir análises em andamento e dos temas previstos na agenda regulatória, a agência reguladora tem, entre as prioridades neste ano, cumprir o cronograma para as regulamentações dos leilões de energia e para a renovação das concessões.

No caso dos leilões, os processos já foram distribuídos a diretores relatores no primeiro sorteio realizado neste ano. Já a discussão sobre a renovação das concessões está em andamento. A previsão, conforme cronograma posto pela relatora, diretora Agnes da Costa, é aprovar a minuta do termo aditivo em 25 de fevereiro. “Obviamente, há toda uma dinâmica da própria agência, que pode escorregar um pouco, mas é a data que estamos perseguindo.”

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O aprimoramento das regras que tratam de cortes de geração, conhecidos como curtailment no setor, também é visto como prioridade, segundo o diretor-geral. O tema vem ganhando grande espaço no setor elétrico e gera preocupação nos agentes, que já recorreram ao Judiciário para tratar da questão. A Aneel tenta reverter uma liminar, favorável aos geradores, no Superior Tribunal de Justiça (STJ).

“Consideramos importante concluir os aprimoramentos necessários [sobre a regra de curtailment], mas tendo a perspectiva que defendemos a crença de que é uma atividade que tem riscos para os empreendedores e consumidores, e o tamanho desse risco já foi decidido pela Aneel em 2021. Obviamente, uma norma sempre merece aprimoramentos e o que está sendo relatado: o que compensar e como ratear esse custo entre geradores e consumidores”, afirma.

Também estão na lista de prioridades matérias associadas ao mercado de energia elétrica, como monitoramento do mercado e questões sobre o comercializador varejista. Ainda no radar estão temas relativos ao crescimento do mercado livre de energia elétrica, o fim das concessões de transmissão e discussões sobre o armazenamento de energia.

Em relação às contas de luz, outro ponto de atenção da agência, o diretor-geral afirmou que ainda não é possível prever qual será o impacto tarifário neste ano. Há, segundo ele, pendências que ainda podem ter reflexos nesse cálculo, como a análise, pelo Congresso, de trechos que foram vetados na lei que criou o marco legal das eólicas offshore. Caso sejam derrubados, o impacto financeiro de algumas das medidas deverá ser englobado nas tarifas já em 2025.

“A decisão de veto ou, eventualmente, aprovação é uma decisão que compete aos Poderes Executivo e Legislativo. A agência, sempre que acionada para se manifestar, se manifesta com isenção. Obviamente que trazer mais custos para a tarifa preocupa, e a preocupação do Executivo vetando esses artigos vem ao encontro do princípio da modicidade tarifária, que é o princípio que está em uma das missões institucionais da Aneel”, ressalta.

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