Países podem enfrentar entraves para sair da lista de paraísos fiscais

O governo federal detalhou os procedimentos para que países possam ser excluídos da lista de paraísos fiscais. Embora a medida tenha o objetivo de estimular investimentos estrangeiros ao Brasil, especialistas ouvidos pelo JOTA apontam que a subjetividade do texto pode criar entraves e comprometer sua efetividade, levando a uma baixa adesão internacional.

As regras constam na Portaria 2.029/2024, publicada no Diário Oficial da União (DOU) de 20 de dezembro. A norma estabelece que a retirada de países da lista está condicionada à realização de investimentos diretos por meio do governo estrangeiro ou fundos soberanos ou, ainda, empresas públicas, sem a intermediação de entidades sediadas nos países, exceto quando pertencentes ao próprio interessado em sair da lista. Além disso, define que, para acessar o benefício fiscal, os países devem apresentar uma solicitação formal de afastamento da lista, com documentos comprobatórios, ao Ministério da Fazenda, que será responsável por analisar e decidir pela aprovação ou rejeição do pedido.

A normativa disciplina o Decreto 12.226/2024, publicado em outubro, que detalhou as regras para exclusão de países dessa classificação. Entre os pontos ainda em aberto, segundo advogados, está se a solicitação pode ser realizada com base na intenção de efetuar os aportes ou apenas após sua concretização. Também, o texto não esclarece o valor mínimo do investimento, nem se aportes realizados antes do decreto serão considerados válidos, tampouco detalha a possibilidade de recorrer em caso de solicitação negada.

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Para o advogado Milton Schivitaro Neto, do escritório Finocchio & Ustra Advogados, a portaria abre espaço para que o pedido de retirada da lista de paraísos fiscais seja feito com base na intenção de efetuar os aportes, sem deixar claro se isso deveria obrigatoriamente acontecer apenas após sua concretização. Ele complementa que, “se o país tiver uma legislação fechada, ao ponto de não permitir acesso às informações das pessoas jurídicas domiciliadas, não adianta investir no Brasil, porque através dessa normativa ele não vai conseguir sair da lista”.

Esse é justamente o ponto em que, para o advogado Bernardo Leite de Queiroz Lima, do ALS Advogados, a portaria apresenta uma falha. Ele explica que a normativa exige que, para realizar a solicitação de retirada dos paraísos fiscais, seja apresentada uma série de informações que, em princípio, estariam protegidas por sigilo, o que pode gerar dificuldades na adesão da norma. Na prática, o país interessado deve protocolar documentos comprobatórios de investimento, inclusive com consentimento do titular das informações, analisa.

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“[Essa obrigação] pode vir a ser um ponto de atrito entre os países, mas é uma exigência que o Brasil está fazendo (…). Pode ser que algumas exigências prejudiquem a prática do efetivo recebimento de rendimentos. Tem que ver também se, dentro do contexto global, isso pode ter um impacto mais amplo”, disse.

Critérios para os investimentos

O advogado Douglas Odorizzi, do Dias de Souza Advogados, diz que a portaria falha ainda em definir os critérios de relevância para os investimentos. O texto menciona a necessidade de que os aportes sejam proporcionais ao PIB do país investidor, mas não especifica os parâmetros para avaliar essa proporção, deixando margem para interpretações subjetivas.

O pedido de retirada da lista ao Ministério da Fazenda pode ter efeito suspensivo, o que significa que o órgão pode suspender a classificação de paraíso fiscal do país antes da análise completa dos documentos. Apesar disso, os especialistas apontam que não há clareza quanto à possibilidade de recorrer, caso o pedido seja negado.

Além disso, fica a cargo do Ministério da Fazenda também decidir os efeitos práticos em caso de não cumprimento das regras, como por exemplo o período mínimo de cinco anos. A portaria não descreve quais seriam as sanções, embora uma delas deva ser, acreditam os especialistas, a volta do país à lista de paraíso fiscal. As sanções serão definidas por meio de instrução normativa, conforme a portaria.

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