Leilão pode reduzir o estrangulamento da capacidade portuária de contêineres

O tão aguardado leilão do novo terminal de contêineres no Porto de Santos (SP), o Tecon Santos 10, se bem realizado, terá o poder de reduzir o estrangulamento da capacidade portuária de contêineres. O tema merece destaque em razão das previsões nada animadoras: o Porto de Santos deve esgotar a capacidade de receber cargas até 2028. A explicação é de Bernardo Macedo, sócio da LCA Consultoria. Ele participou nesta sexta-feira (23/05) do segundo webinar organizado pelo JOTA em parceria com o ICTSI. 

Na conversa, o especialista defende a restrição da participação de armadores no leilão e alerta que a concentração de armadores a operadores portuários já é alta no país. Para ele, uma eventual vitória dessas empresas vai prejudicar ainda mais a concorrência no setor.

Com a expectativa de que seja realizado até o fim deste ano, a principal questão em debate é se armadores (empresas de transporte marítimo, donas de navios) ou operadoras de terminais que já atuam em Santos devem poder participar – ou não – do certame, e em quais condições. O motivo é a possibilidade de uma concentração ainda maior do mercado no maior porto do Brasil e da América Latina, caso uma dessas empresas vença.

Atualmente, há quatro terminais de contêineres em Santos, sendo que somente dois movimentam 76% de toda a carga conteinerizada no porto: BTP e Tecon. Ambos os terminais são “verticalizados”, ou seja, controlados por armadores, e apresentam preços médios por TEU (unidade de medida para contêineres) mais elevado. O terminal DPW, que é de “bandeira branca”, movimentou 23% da carga em contêineres em Santos. Pelo Porto de Santos passam 39% da carga em contêineres do país. 

Macedo afirma que no Brasil a concentração dos armadores é maior que a média global, já que as duas maiores empresas respondem por metade do volume transportado nos portos brasileiros. Do lado dos portos, Santos responde por 30% de toda a carga transportada pelos portos organizados no Brasil.

As concentrações são de empresas que têm grande participação no transporte e na estrutura portuária. O que faz com que elas tendam, ou pelo menos tenham um estímulo econômico, a operar nos suas próprias estruturas portuárias”, explica o especialista.

“É difícil fazer uma regra geral, mas o que a gente sabe olhando os outros países é que essa conexão entre armadores e operadores portuários tem gerado questões concorrenciais importantes mundo afora. E os players são os mesmos, porque é um oligopólio global”, completa.

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Macedo ressalta que reduzir ao máximo as barreiras à entrada para atrair o maior número possível de competidores no leilão vai aumentar a concorrência, o que em tese fará com que o governo arrecade mais com a outorga. 

A questão é de longo prazo. Ter uma arrecadação maior por conta da concessão no curtíssimo prazo supera o custo que você terá ao longo de todas as décadas em que essa empresa vai operar o porto? Se ela fizer ações anticompetitivas contra os seus concorrentes, que são os outros portos e outros operadores de navios, pode tornar mais ociosa e consequentemente mais custosa a operação das outras empresas. E isso é algo que não se deseja num mercado tão sensível”, diz.

O especialista adverte que um eventual prejuízo à competitividade no setor pode gerar custos muito maiores por décadas. “Estamos falando de concorrência de grandes empresas. É por isso que a discussão está tão encerrada porque a concorrência é grande. Eu diria que entre a concorrência para o leilão especificamente e a concorrência olhando para o período de usufruto da concessão de décadas, eu privilegiaria esse segundo olhar. E, portanto, pensaria duas vezes antes de habilitar os armadores para participar desse leilão.”

Macedo defende que a Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) e o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) sejam chamados para participar agora das discussões sobre a melhor forma de realização do leilão.

“Uma concessão como essa vai durar algumas décadas. Não consigo imaginar uma situação em que depois de 5 anos operando uma concessão, o governo detecte uma prática anticompetitiva e decida refazer o leilão. Isso não vai acontecer, exatamente porque tem um custo gigantesco”, afirma o especialista.

“No desenho do leilão é o momento que você tem a possibilidade de evitar fatos consumados. É muito mais simples lidar com esse tipo de problema antes que ele aconteça. É mais fácil prevenir do que remediar.”

Assista a entrevista com Bernardo Macedo na íntegra.

O JOTA já realizou duas entrevistas sobre infraestrutura portuária, com foco no leilão do novo terminal portuário, o Tecon Santos 10. A terceira e última entrevista da série será na próxima sexta-feira (30/05), com Floriano de Azevedo Marques Neto, professor de Direito Administrativo da USP.

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