Ao julgar o Tema 935, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a constitucionalidade da contribuição assistencial prevista em normas coletivas, desde que garantido o direito de oposição aos trabalhadores não sindicalizados. A decisão pacificou uma questão polêmica, mas também trouxe à tona um debate crucial: até onde se estende a retroatividade (efeito ex tunc) nesta nova interpretação, especialmente quando confrontada com decisões anteriores que declaravam a inconstitucionalidade de tais cláusulas?
Para compreender os desdobramentos desta mudança, é necessário analisar o Tema 733 do STF, o qual trata da modulação dos efeitos das decisões que declaram normas constitucionais ou inconstitucionais, além de pontos do Código de Processo Civil e da Constituição Federal.
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O artigo 102, § 2º, da Constituição, por exemplo, estabelece que decisões de mérito proferidas em ações diretas de inconstitucionalidade e declaratórias de constitucionalidade têm eficácia vinculante e efeito erga omnes. Da mesma forma, a Lei 9.868/99 determina que tais decisões devem ser seguidas por todas as instâncias do Judiciário e todos os órgãos da Administração Pública.
No caso da contribuição assistencial, tendo a decisão do STF efeito vinculante e erga omnes, a retroatividade ex tunc poderia anular decisões passadas que declararam a cobrança inconstitucional, impactando até mesmo execuções em curso.
O artigo 525, § 12, do CPC, prevê que uma decisão do STF declarando constitucionalidade de uma norma pode tornar inexigível a obrigação imposta em decisões anteriores, extinguindo a execução. Por sua vez, o § 14 reforça essa ideia, ao permitir que a parte executada invoque a decisão do STF como fundamento para a desconstituição da obrigação.
Entretanto, a aplicação irrestrita do efeito retroativo pode gerar insegurança jurídica e colidir com princípios como a coisa julgada e a prescrição. A modulação dos efeitos da decisão torna-se, portanto, essencial para evitar distorções e garantir equilíbrio entre a necessidade de respeitar os novos entendimentos do STF e a segurança de relações jurídicas já estabelecidas.
Reforço, aqui, o argumento de que não se pode reabrir indiscriminadamente processos já consolidados sob a ótica da inconstitucionalidade anterior. Assim, embora a decisão do STF no Tema 935 tenha pacificado a questão da contribuição assistencial, a aplicação retroativa deve ser analisada com cautela.
O ideal é que a aplicação do efeito ex tunc seja ponderada à luz dos dispositivos legais mencionados, levando em consideração a existência de decisões transitadas em julgado e o princípio da segurança jurídica. A delimitação da retroatividade, portanto, deve equilibrar o respeito ao novo entendimento jurisprudencial com a proteção das relações jurídicas já consolidadas.
Trato continuado sobre instrumentos coletivos posteriores
Em prestações de trato continuado, como na imposição de cláusulas convencionais reiteradas ao longo do tempo, a superação do entendimento anterior pelo STF pode ter implicações diretas sobre decisões judiciais já transitadas em julgado. Em situações nas quais a decisão judicial determinou que sindicatos se abstivessem de replicar a cláusula de contribuição assistencial em convenções coletivas futuras, a nova orientação jurisprudencial pode ser invocada para afastar essa restrição.
O entendimento firmado no Tema 935 consolida que a cláusula é constitucional, desde que resguardado o direito de oposição. Dessa forma, cláusulas anteriormente consideradas inconstitucionais não apenas deixam de ser passíveis de anulação, mas passam a poder ser livremente negociadas em novos instrumentos coletivos. O artigo 525, § 12, do CPC, permite a revisão dessas decisões judiciais sob o fundamento de que a norma anteriormente considerada inválida sempre esteve em conformidade com a Constituição.
Da mesma forma, como a obrigação transitada em julgado possui caráter continuado, é possível argumentar que sua manutenção representa restrição ilegítima às novas negociações coletivas. Nos termos do artigo 505, inciso I, do CPC, a coisa julgada não pode impedir a aplicação da nova jurisprudência quando a obrigação imposta afeta situações futuras e reiteradas.
A revisão dessas decisões, portanto, pode ser requerida com base na modificação do entendimento do STF, respeitando-se o princípio da coisa julgada progressiva, que permite a adaptação de obrigações contínuas a novos entendimentos jurisprudenciais.
Portanto, mesmo diante de decisões que proibiam a repetição da cláusula em convenções coletivas futuras, a aplicação do novo entendimento do STF permite a retomada da negociação sobre a contribuição assistencial, garantindo-se o direito de oposição dos trabalhadores.
Assim, a superação da jurisprudência anterior não apenas influencia a validade das cláusulas já pactuadas, mas também afasta limitações impostas a negociações futuras, assegurando a autonomia coletiva na formulação de normas convencionais.
Impacto sobre execuções do MPT
No contexto das execuções promovidas pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), em que foram impostas multas com base na obrigação de não fazer, a nova decisão do STF impacta diretamente a exigibilidade dessas penalidades. Caso as multas tenham sido aplicadas devido à inserção de cláusulas convencionais então consideradas inconstitucionais, a decisão do Tema 935 altera o cenário, ao reconhecer a validade de tais disposições e anulando as multas.
Nos termos do artigo 525, § 12, do CPC, a obrigação que serviu de base para a imposição da multa se torna inexigível, já que a decisão do STF retroage ao nascedouro da norma questionada. Assim, qualquer execução em curso que tenha por fundamento a suposta inconstitucionalidade dessas cláusulas deve ser reavaliada, sob pena de manter sanção baseada em entendimento já superado.
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Ademais, a natureza continuada da obrigação imposta às entidades sindicais reforça a inaplicabilidade dessas multas. Como a nova jurisprudência do STF reconhece que as cláusulas sempre foram constitucionais desde que respeitado o direito de oposição, não há razão jurídica para manter penalidades decorrentes da replicação de tais disposições em convenções coletivas posteriores. A imposição dessas multas, sob a ótica da nova decisão, representaria uma violação aos princípios da segurança jurídica e da proporcionalidade.
Diante deste argumento, portanto, as execuções promovidas pelo MPT com base na obrigação de não fazer devem ser revistas, pois perderam seu fundamento jurídico. A aplicação retroativa do entendimento do STF torna as penalidades desprovidas de suporte legal, cabendo aos tribunais reconhecer sua inexigibilidade à luz da nova jurisprudência.
Em síntese, a decisão do STF no Tema 935 representa um marco importante na discussão sobre a contribuição assistencial, mas sua aplicação retroativa exige análise cuidadosa, equilibrando o respeito ao novo entendimento jurisprudencial com a proteção das relações jurídicas já consolidadas e, especialmente, com a segurança jurídica.