O regime de tributação das subvenções fiscais

O objetivo deste artigo é endereçar o tratamento tributário das subvenções, que sempre foi objeto de controvérsias, especialmente no que se refere à sua exclusão da base de cálculo do IRPJ e da CSLL.

Para compreendê-lo, relevante partir de panorama histórico da evolução normativa e jurisprudencial que moldaram o entendimento sobre o tema:

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  • Parecer Normativo CST 112/1978[1]: A Receita Federal distinguiu subvenções para investimento, voltadas à implantação ou expansão de empreendimentos, das de custeio, ligadas a redução de despesas, o que orientou o contencioso por décadas.
  • Lei 12.973/2014: O art. 30 permitiu a exclusão das subvenções para investimento da base do IRPJ/CSLL, condicionada à reserva de lucros específica. O art. 50 estendeu isso à CSLL.
  • LC 160/2017: A norma simplificou a classificação, incluindo §§ 4º e 5º no art. 30 da Lei 12.973/14, reconhecendo como subvenções para investimento os incentivos fiscais de ICMS concedidos por Estados e DF.
  • SC Cosit 11/2020[2]: A RFB passou a admitir a exclusão dos benefícios fiscais de ICMS da base do IRPJ/CSLL, alinhada à LC nº 160/2017.
  • SC Cosit 145/2020: Posteriormente, a RFB restringiu esse entendimento, exigindo comprovação do vínculo dos incentivos com investimento. Essa posição foi reiterada nas SCs nº 12/2022 e 15/2022.
  • Embargos de Divergência em RE 1.517.492 (STJ) – 2019: O STJ passou a discutir a competência da União para tributar benefícios fiscais estaduais, à luz do pacto federativo.
  • RE 1.968.755/PR (STJ)[3] – 2022: Distinguiu os créditos presumidos de ICMS de outros benefícios, atribuindo-lhes tratamento jurídico distinto quanto à tributação federal. Enquanto o crédito presumido foi considerado como receita tributável para fins de IRPJ e CSLL, os demais benefícios foram compreendidos como desonerações da carga tributária que não geram acréscimo patrimonial direto, podendo, portanto, ter tratamento tributário diferenciado.
  • Tema Repetitivo 1.182 (STJ) – 2023: Firmou a tese de que inexigível comprovação prévia da destinação para investimento para a exclusão das subvenções, mas a RFB pode fiscalizar o uso dos valores.
  • Lei 14.789/2023 – Conversão da MP 1.185/2023: Revogou o art. 30 da Lei 12.973/2014, encerrando a exclusão das subvenções da base do IRPJ/CSLL. Em seu lugar, instituiu-se crédito fiscal de 25%, condicionado a requisitos legais.
  • Ato Declaratório Interpretativo 04/2024 – Reforçou que os valores, quando efetivamente representarem acréscimo patrimonial e observarem os requisitos legais e contábeis, poderão ser excluídos da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, equiparando, para fins de exclusão, os incentivos e benefícios fiscais ao ICMS.

Com a entrada em vigor dessa nova lei, em 1º.1.2024, inaugurou-se um novo tratamento das subvenções fiscais, impactando diretamente as empresas que antes as excluíam da base de cálculo do IRPJ e da CSLL. Com isso, surgiram questionamentos sobre as novas regras, levando contribuintes a buscar esclarecimentos junto à Receita Federal.

Publicada em 18.2.2025, a Solução de Consulta Cosit 11, tratou da exclusão de receitas decorrentes de benefícios fiscais de ICMS da base de cálculo do IRPJ e da CSLL. A consulta foi feita por uma empresa atacadista de frutas e hortaliças, que questionou a possibilidade de excluir os valores referentes à isenção de ICMS concedida pelo estado de Mato Grosso do Sul.

Em resposta, a RFB confirmou que, até o fim do ano-calendário de 2023, as empresas que cumprissem os requisitos do Ato Declaratório nº 4/2024 e da legislação vigente poderiam excluir a receita de subvenções para investimento da base do IRPJ e da CSLL. Para isso, definiu 3 condições:

  • Reconhecimento contábil adequado, conforme os princípios contábeis e o regime de competência, com correta classificação como receita de subvenção para investimento e segregação em contas específicas;
  • Existência de documentação que comprove a concessão do benefício fiscal; e
  • Comprovação de efetivo acréscimo patrimonial para a empresa.

Nesse novo regime, as subvenções para investimento passaram a ser integralmente tributadas pelo IRPJ, CSLL, PIS e COFINS, permitindo, em contrapartida, a apuração de créditos fiscais de 25% (art. 8º), como forma de mitigar os efeitos da tributação sobre essas receitas.

O crédito fiscal poderá ser utilizado para compensação de tributos federais ou para ressarcimento em dinheiro, desde que observadas as condições legais, e é restrito a empresas do lucro real que recebam subvenções voltadas à implantação ou expansão de empreendimentos econômicos.

A lei exige ainda que o ato de concessão do benefício seja anterior à implantação ou expansão e que preveja expressamente as condições e contrapartidas exigidas. Ademais a empresa deve solicitar habilitação junto à Receita Federal e estar em situação regular perante o fisco.

Dessa forma, a Solução de Consulta Cosit 11/2025 reflete a nova realidade tributária das subvenções fiscais após a revogação do art. 30 da Lei 12.973/2024.

O novo regime impõe desafios relevantes, exigindo que as empresas avaliem os impactos financeiros e adotem estratégias como (i) revisar a natureza das subvenções recebidas; (ii) assegurar o correto reconhecimento contábil dessas receitas; (iii) analisar a viabilidade do crédito fiscal de 25%; (iv) retificar declarações anteriores, se necessário; e (vi), quando cabível, considerar a oportunidade de discutir judicialmente a incidência tributária sobre subvenções concedidas sob a vigência de regimes anteriores – tudo com foco na conformidade e mitigação de riscos.

Vale destacar que a utilização desse crédito poderá ser interpretada como aceitação do novo regime de tributação das subvenções, o que pode representar renúncia tácita ao direito de discutir judicialmente a constitucionalidade ou legalidade da tributação instituída pela nova lei.

Nesse cenário, cabe uma decisão estratégica por parte dos contribuintes: aderir ao regime com crédito fiscal ou buscar discutir a tributação judicialmente, sobretudo no caso de subvenções reconhecidas antes da mudança legislativa.


[1] As Subvenções Correntes para Custeio ou Operação integram o resultado operacional da pessoa jurídica; as Subvenções para Investimento, o resultado não operacional. Subvenções para Investimento são aquelas que apresentam características específicas, realçadas no presente Parecer. As Isenções ou Reduções de impostos só se classificam como subvenções para investimento, se presentes todas as características exigidas para tal. As Subvenções para Investimento, se registradas como reservas de capital, não serão computadas na determinação do lucro real, desde que obedecidas as restrições para a utilização dessa reserva. As Isenções, Reduções ou Deduções do Imposto de Renda devido pelas Pessoas Jurídicas não poderão ser tidas como subvenção para investimento. Aplica-se, a todas as pessoas jurídicas sujeitas à tributação pelo imposto de renda com base no lucro real, o disposto no art. 38, § 2º do Decreto-lei nº 1.598/77. As contas do ativo permanente e respectivas depreciação, amortização ou exaustão, que registrem bens oriundos de Subvenções, são corrigidas monetariamente. (g.n.)

[2] Conclusão

30 À vista do exposto, responde-se a consulente que:

31 As subvenções para investimento podem, observadas as condições impostas por lei, deixar de ser computadas na determinação do lucro real e da base de cálculo da CSLL. A partir do advento da Lei Complementar nº 160, de 2017, consideram-se como subvenções para investimento os incentivos e os benefícios fiscais ou financeiro-fiscais relativos ao ICMS concedidos por estados e Distrito Federal. (g.n)

[3] TRIBUTÁRIO EXCLUSÃO DE BENEFÍCIOS FISCAIS (A TÍTULO DE ISENÇÃO E REDUÇÃO DA BASE E CÁLCULO DE ICMS) DA BASE DE CÁLCULO DO IMPOSTO DE RENDA DA PESSOA JURÍDICA – IRPJ E DA CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O LUCRO LÍQUIDO – CSLL. LUCRO REAL. INAPLICABILIDADE DOS ERESP. N. 1.517.492/PR QUE SE REFEREM ESPECIFICAMENTE AO BENEFÍCIO DE CRÉDITO PRESUMIDO DE ICMS. ACÓRDÃO EM LINHA COM A RATIO DECIDENDI DE PRESERVAÇÃO DO PACTO FEDERATIVO. POSSIBILIDADE DE EXCLUSÃO DA BASE DE CÁLCULO DO IRPJ E DA CSLL ATRAVÉS DA CLASSIFICAÇÃO DA ISENÇÃO DE ICMS COMO SUBVENÇÃO PARA INVESTIMENTO. APLICAÇÃO DO ART. 10, DA LEI COMPLEMENTAR N. 160/2017 E DO ART. 30, DA LEI N. 12.973/2014.

(REsp n. 1.968.755/PR, relator Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 5/4/2022, DJe de 8/4/2022.)

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