Regulação de planos de saúde: riscos e oportunidades na consulta pública da ANS

A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) abriu a Consulta Pública 145 para debater mudanças na regulamentação dos planos de saúde coletivos. A Associação Brasileira de Liberdade Econômica (ABLE), por nós representada, apresentou sua manifestação destacando preocupações quanto ao impacto regulatório das propostas e a necessidade de um ambiente normativo que promova previsibilidade, concorrência e eficiência econômica.

Com notícias da Anvisa e da ANS, o JOTA PRO Saúde entrega previsibilidade e transparência para empresas do setor

Dentre os principais pontos abordados, destacam-se:

Reajuste e rescisão contratual: segurança jurídica e equilíbrio econômico

A ABLE defende ajustes nas propostas da ANS para garantir maior segurança jurídica nos contratos coletivos, especialmente no que diz respeito às regras de rescisão e prazos de vigência. A ausência de critérios claros pode levar a um cenário de incerteza, aumentando os riscos para operadoras e consumidores.

Sem previsibilidade regulatória, operadoras podem restringir a oferta de planos ou repassar custos adicionais aos beneficiários, comprometendo o equilíbrio econômico do setor e trazer externalidades negativas ao mercado (composto por empresas e consumidores) e ao próprio sistema público de saúde (que pode ser sobrecarregado em caso de perda de clientes de plano de saúde por empresas privadas).

Regulação econômica ineficiente: riscos da imposição de limites rígidos

A ANS propõe limitações para coparticipação e franquia nos planos de saúde, restringindo os valores que podem ser repassados aos beneficiários. A ABLE argumenta que essa interferência excessiva na estrutura financeira dos contratos pode gerar consequências indesejadas, como o aumento dos preços dos planos, a redução da oferta de produtos e o desestímulo à inovação no setor.

Além disso, a manifestação destaca que a ANS pode estar extrapolando sua competência ao criar restrições sem respaldo legal. O tema já foi objeto de discussão no Supremo Tribunal Federal (STF), que suspendeu norma semelhante sob o argumento de que modificações dessa natureza devem passar pelo devido processo legislativo, garantindo um debate mais amplo e democrático.

A Suprema Corte dos Estados Unidos também recentemente emitiu julgado atribuindo certos limites ao poder regulatório das agências reguladoras, que precisam respeitar a legislação.

Venda online de planos de saúde: liberdade econômica e concorrência

Outro ponto de preocupação é a proposta da ANS de tornar obrigatória a comercialização de planos de saúde no ambiente digital. A ABLE sustenta que a decisão fere princípios da liberdade econômica e pode gerar efeitos negativos sobre a concorrência e a proteção ao consumidor.

Atualmente, a intermediação por corretores desempenha um papel relevante ao orientar consumidores na escolha do plano mais adequado às suas necessidades. A venda obrigatória no ambiente online pode reduzir essa personalização, levando a decisões de compra equivocadas e, consequentemente, a um aumento na insatisfação e na judicialização de contratos.

Além disso, há preocupações quanto ao impacto sobre pequenas e médias operadoras, que podem não ter os mesmos recursos para investir na digitalização de seus canais de vendas. A imposição regulatória pode gerar um cenário de concentração de mercado, favorecendo grandes operadoras em detrimento da concorrência.

Revisão técnica: necessidade de maior transparência e rigor técnico

A proposta da ANS prevê a revisão de contratos de planos individuais e coletivos para ajustes financeiros e adequação às novas regras. No entanto, a ABLE alerta para a falta de critérios objetivos no processo de revisão técnica, o que pode gerar insegurança jurídica e dificultar a previsibilidade para operadoras e consumidores.

A ausência de parâmetros claros pode resultar em decisões arbitrárias da agência reguladora, ampliando o risco de litigância e desestabilizando economicamente operadoras de planos de saúde. Para mitigar esse risco, a ABLE sugere que a revisão técnica seja fundamentada em análises atuariais robustas, acompanhadas de auditorias independentes e transparência nos critérios utilizados para eventuais ajustes contratuais.

Finalmente, a ABLE entende que a revisão técnica deve servir para reequilibrar contratos e não apenas, como a sugestão da ANS parece dar a entender, apenas para situações de empresas em situação de dificuldades.

A perspectiva de Law & Economics: falhas de governo e riscos de externalidades negativas

Sob a ótica da Análise Econômica do Direito (Law & Economics), a manifestação da ABLE alerta para a ausência de uma Análise de Impacto Regulatório (AIR) robusta na formulação das propostas da ANS. A AIR, tal como exigida pela Lei das Agências Reguladoras (LAR) e pela Lei de Liberdade Econômica (LLE) é uma ferramenta essencial para avaliar os custos e benefícios de uma nova regulação, garantindo que suas consequências sejam devidamente mensuradas antes da implementação.

A falta de uma AIR estruturada pode levar a falhas de governo, ou seja, situações em que a intervenção estatal gera distorções no mercado, em vez de solucioná-las. Isso pode ocorrer, por exemplo, quando uma regulação excessiva reduz a concorrência e restringe a oferta de produtos, prejudicando os consumidores.

Além disso, há o risco de externalidades negativas, ou efeitos colaterais não previstos, como:

  • Aumento da judicialização: regras pouco claras podem levar a um crescimento de disputas judiciais entre consumidores e operadoras, gerando custos adicionais para o sistema de saúde suplementar;
  • Redução da inovação e da concorrência: exigências regulatórias excessivas podem inibir novos entrantes no mercado e desencorajar investimentos em novos produtos e serviços; e
  • Encarecimento dos planos de saúde: ao impor restrições rígidas sobre reajustes e modelos financeiros, a regulação pode elevar os custos operacionais das operadoras, levando a preços mais altos para os consumidores.

Conclusão: riscos e oportunidades na regulação da ANS

A regulação dos planos de saúde é fundamental para garantir previsibilidade ao mercado e proteção ao consumidor. No entanto, para que seja eficaz, precisa ser baseada em dados sólidos, previsibilidade jurídica e respeito aos princípios da liberdade econômica e da concorrência.

A Consulta Pública 145 representa uma oportunidade para aprimorar o marco regulatório do setor, mas é essencial que as propostas da ANS sejam precedidas de uma análise criteriosa de seus impactos econômicos e jurídicos. A ausência de uma AIR robusta e de critérios técnicos bem definidos pode resultar em um cenário de maior insegurança, prejudicando tanto consumidores quanto operadoras.

O equilíbrio entre regulação e liberdade econômica é crucial para a inovação setorial e mesmo para a sustentabilidade do setor de saúde suplementar no Brasil.

Adicionar aos favoritos o Link permanente.