A recente reeleição de Donald Trump como presidente dos Estados Unidos provocou mudanças significativas nas políticas relacionadas a ESG (Ambiental, Social e Governança), tema que vinha ganhando força nos últimos anos.
As primeiras medidas adotadas pela nova administração já indicam um reposicionamento em relação a pautas que, até então, eram tratadas como prioridades em diversas esferas, especialmente no que diz respeito às questões sociais e ambientais.
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Embora essas alterações estejam, em um primeiro momento, restritas ao território norte-americano, é importante reconhecer que, dado o peso econômico e político dos Estados Unidos no cenário internacional, o impacto dessas decisões tende a extrapolar fronteiras. Assim, seus efeitos devem ser sentidos em diferentes partes do mundo, inclusive no Brasil, onde políticas de ESG vêm se consolidando como parte fundamental da estratégia de sustentabilidade e responsabilidade social das empresas.
Uma das primeiras ações adotadas pelo presidente Trump em seu novo mandato foi a assinatura da Ordem Executiva 14.173. Essa ordem estabelece a proibição de que organizações privadas implementem programas de diversidade e inclusão para empregos gerados por contratos federais. Na prática, isso significa que quaisquer iniciativas internas voltadas à promoção da diversidade ou à inclusão social, quando relacionadas a postos de trabalho financiados por contratos com o governo federal, estão vedadas.
Essa medida tem impacto direto sobre empresas que mantêm relações comerciais com o governo dos Estados Unidos, impondo novas limitações às políticas corporativas que, até então, buscavam promover ambientes de trabalho mais diversos e inclusivos.
No Brasil, subsidiárias de empresas americanas, bem como aquelas que têm interesse em captar investimentos provenientes do mercado norte-americano, podem se ver diante de pressões para reavaliar suas iniciativas de ESG. Essas pressões tendem a se concentrar, em especial, nos planos voltados à diversidade e inclusão, áreas que tradicionalmente fazem parte das práticas de responsabilidade social corporativa.
Apesar de a legislação trabalhista brasileira já conter dispositivos que promovem a igualdade e proíbem a discriminação nas relações de trabalho, o país tem sido cada vez mais influenciado pelas diretrizes e práticas advindas de políticas corporativas internacionais. Essa influência externa, em muitos casos, tem servido como um fator de motivação para avanços relevantes na implementação de ações concretas que buscam tornar os ambientes de trabalho mais justos, diversos e inclusivos.
As práticas de ESG, especialmente no aspecto social, têm sido fortemente impulsionadas por demandas de investidores internacionais. Além da evolução tangível dos programas de diversidade e inclusão — voltados à contratação e promoção de grupos subrepresentados (como mulheres, pessoas negras, pessoas com deficiência e LGBTQIA+) — outras iniciativas também avançaram nos últimos anos.
Exemplos incluem programas de saúde, segurança e bem-estar dos trabalhadores (com foco em saúde mental, ações contra a síndrome de burnout e benefícios ampliados, como licenças parentais mais longas e horários flexíveis), o trabalho remoto e formatos híbridos de trabalho, além do fortalecimento no combate ao trabalho análogo à escravidão e ao trabalho infantil (como auditorias nas cadeias de fornecimento para garantir conformidade com as normas trabalhistas e maior transparência nos relatórios corporativos sobre práticas laborais).
Todas essas iniciativas reforçaram o compromisso dos empregadores brasileiros com o pilar social do ESG. É natural, portanto, especular se a nova postura do governo dos EUA poderá desestimular empresas brasileiras a implementar ou até mesmo divulgar suas metas sociais.
Ainda não existe um termo equivalente, na esfera trabalhista, ao fenômeno conhecido como greenhushing — a prática de silenciar iniciativas sustentáveis para evitar críticas em ambientes politicamente desfavoráveis. Embora ainda não haja um termo amplamente difundido no contexto social, já é possível notar que algumas empresas adotaram o chamado Silent ESG, evitando divulgar suas iniciativas sociais para escapar de críticas.
Diante desse cenário, é fundamental que as empresas brasileiras avaliem cuidadosamente suas políticas de ESG, considerando tanto as demandas do mercado internacional quanto as obrigações impostas pela legislação trabalhista nacional. Manter o equilíbrio entre atender às expectativas globais de sustentabilidade e inclusão e adaptar-se às mudanças políticas internacionais será essencial para a competitividade e a reputação das empresas brasileiras no mercado global.
Também é importante destacar que o Brasil possui algumas iniciativas sociais exigidas por lei. Essas obrigações garantem proteções sociais mínimas, formando uma base de direitos trabalhistas fundamentais (previstos na Consolidação das Leis do Trabalho), como limitações de jornada, normas detalhadas de saúde e segurança (incluindo novas previsões de saúde mental na Norma Regulamentadora NR-1), programas de saúde ocupacional, prevenção de riscos ambientais, igualdade e não discriminação no trabalho (com cotas para pessoas com deficiência e igualdade salarial entre homens e mulheres) e proteção contra assédio moral e sexual no ambiente de trabalho.
Portanto, embora as recentes mudanças nos Estados Unidos possam trazer impactos relevantes para as políticas corporativas implementadas no Brasil, continuará existindo um conjunto mínimo de obrigações que as empresas deverão observar para manter a conformidade com a legislação trabalhista e com as normas de ESG brasileiras.
Essas exigências, previstas em leis e regulamentações nacionais, formam uma base obrigatória que as organizações não poderão ignorar, independentemente de eventuais pressões externas ou mudanças no cenário político internacional. Nesse contexto, será interessante acompanhar quais organizações escolherão continuar ir além do mínimo legal, optando por adotar políticas voluntárias que extrapolem as exigências básicas e demonstrem um compromisso genuíno com práticas sustentáveis e socialmente responsáveis.
De qualquer forma, as empresas precisam permanecer atentas e proativas, revendo e ajustando suas estratégias de maneira contínua para se adaptarem com agilidade e segurança a esse ambiente em transformação, preservando sua competitividade e reputação no mercado.