A recuperação judicial é uma importante ferramenta para empresas em dificuldades financeiras, quando esgotadas todas as possibilidades negociais. Contudo, muitos pedidos são indeferidos devido a falhas na documentação e inconsistências contábeis.
Segundo dados inéditos levantados pelo Business Intelligence do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em 2024, o Brasil registrou 20.250 processos relacionados à recuperação judicial e falência. São Paulo liderou com 7.477 casos, seguido pelo Rio de Janeiro (5.549) e o Distrito Federal (3.885). Só entre janeiro e fevereiro de 2024, foram registrados 2.224 novos processos, sendo 1.106 somente em São Paulo.
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A ausência de documentos exigidos pela Lei 11.101/2005, como o balanço patrimonial e a relação nominal de credores, compromete a análise inicial. Além disso, erros na escrituração e registros contábeis podem levantar suspeitas de fraudes ou de falta de transparência, dificultando a avaliação da viabilidade do plano de recuperação. A introdução da perícia prévia, em 2020, permite ao administrador judicial solicitar informações complementares antes do deferimento do pedido, ajudando a identificar essas falhas mais cedo.
Embora a oposição de credores não justifique automaticamente o indeferimento do pedido, ela pode ganhar força ao longo do processo, especialmente se vier acompanhada de indícios de má-fé ou de inviabilidade do plano.
Em muitos casos, empresas tentam ocultar patrimônio de maneira amadora, sem perceber que os registros contábeis serão analisados detalhadamente, o que torna essas tentativas de fraude mais evidentes. Em outros casos, um acúmulo de valores na conta caixa sugere retiradas indevidas, ou procedimentos negociais que não comungam com regras de compliance.
A falta de um planejamento estratégico adequado é outra grande falha. Muitas empresas recorrem à recuperação judicial como última alternativa, sem um plano sólido ou uma negociação prévia com credores. A falta de controle contábil, a confusão entre bens pessoais e empresariais e a ausência de um pró-labore definido comprometem a credibilidade do pedido.
Há casos em que empresários utilizam recursos da empresa para financiar imóveis pessoais ou realizam saques sem justificativa, gerando registros contábeis que levantam suspeitas sobre a real situação financeira da empresa. Além disso, a ausência de suporte técnico qualificado, como advogados e consultores especializados, também contribui para o fracasso do processo.
Muitos empresários evitam contratar especialistas para economizar custos, mas essa decisão pode colocar toda a operação em risco. Podemos citar um exemplo extremo de um caso que ocorreu com uma empresa na Bahia que, faltando apenas 15 dias para o prazo final, descobriu que seu jurídico desconhecia a exigência de apresentar o plano em 60 dias. O erro só foi identificado quando o empresário leu uma matéria sobre o assunto, o que obrigou a empresa a agir rapidamente para evitar a falência.
A jurisprudência tem reforçado a importância do cumprimento rigoroso dos requisitos legais, da apresentação de documentação completa e da viabilidade do plano de recuperação. O indeferimento do pedido pode resultar em grandes prejuízos, expondo a fragilidade da empresa e permitindo que credores tomem medidas drásticas, como a retenção de produtos, arresto de bens e bloqueio de valores. Além disso, o indeferimento pode prejudicar a confiança de clientes, fornecedores e funcionários, comprometendo ainda mais a recuperação da empresa.
É provável que 2025 seja lembrado como o ano das recuperações judiciais no Brasil. Há um conjunto de fatores econômicos que apontam nessa direção: o endividamento excessivo de empresas durante e após a pandemia, com vencimentos concentrados nos anos de 2024 e 2025; a taxa de juros ainda elevada e a restrição ao crédito, que sufocam o caixa de empresas com estrutura de capital frágil; a queda no consumo e a desaceleração do PIB, principalmente nos setores de varejo e construção civil; a inflação em insumos e a pressão cambial, que reduzem as margens de lucro; e a lentidão nas reformas estruturais, que mantém o ambiente de negócios instável.
Diante desse cenário, muitas empresas, inclusive grandes marcas, devem buscar na recuperação judicial uma saída para reorganizar seu passivo e tentar ganhar fôlego. No entanto, só terão reais chances de sucesso aquelas que se prepararem, estruturarem um plano consistente e contarem com apoio técnico qualificado.