A Consulta Pública 1.325/25 da Anvisa reacende debate importante para o setor regulado: o equilíbrio entre proteção à saúde e a previsibilidade regulatória. A proposta procura ampliar o conceito de novos alimentos e ingredientes para incluir alguns constituintes não avaliados pela Anvisa em alguns tipos de alimentos, inclusive chás e óleos e gorduras vegetais.
Ocorre que, possivelmente, tais constituintes não exijam os mesmos níveis de comprovação de segurança atribuídos a substâncias inéditas, refletindo em insegurança e eventual ilegalidade na atuação da agência.
Com notícias da Anvisa e da ANS, o JOTA PRO Saúde entrega previsibilidade e transparência para empresas do setor
O texto propõe que passem a ser categorizados como novos alimentos e ingredientes:
- constituintes antes autorizados apenas para suplementos alimentares ou alimentos para fins especiais,
- espécies vegetais não listadas para uso como chás ou especiarias, e
- espécies vegetais não previstas para a produção de óleos e gorduras vegetais.
A expansão conceitual, embora justificada pela Anvisa como esforço de alinhamento à legislação vigente, levantaria questões jurídicas relevantes. Ponto crucial seria o potencial endurecimento de evidências para comprovar a segurança de uso, com necessidade de apresentação de substanciais estudos toxicológicos e dados técnico-científicos.
Não se questiona a necessidade de comprovar a segurança dos constituintes. No entanto, considera-se que os requisitos atuais já são equilibrados e claros. Em outras palavras, a mudança pode elevar o nível de exigência para a comprovação, aplicando o rigor regulatório previsto para novos alimentos e ingredientes a constituintes que, necessariamente, não demandariam o mesmo grau de rigor.
Neste sentido, itens hoje considerados de uso tradicional — como determinadas plantas em chás regionais ou óleos de sementes não listadas — podem ter sua autorização barrada ou retardada.
Em termos processuais, a mudança pode resultar ainda em:
- aumento nos prazos de análise pela agência, devido a exigências desnecessárias para certos tipos de constituintes; e
- insegurança regulatória, com interpretações divergentes sobre a aplicação da futura norma. Isto é, prazos de avaliação poderão ser estendidos por eventuais interpretações divergentes entre Anvisa e companhias sobre aplicabilidade de algum item aos constituintes, sobretudo em termos de comprovação de segurança.
Assim, tem-se que a proposta pode representar retrocesso – ou entrave – em termos de segurança regulatória, contrariando princípios do Direito Administrativo, como proporcionalidade, isonomia e proteção da confiança legítima do administrado.
Embora se compreenda o esforço da Anvisa em padronizar a legislação, pode ser questionável alterar o cenário atual, que já oferece mecanismos suficientes para analisar e controlar constituintes não aprovados em determinados alimentos. A mudança pode gerar entraves desnecessários ao desenvolvimento de novos produtos alimentícios, sem ganho proporcional à proteção da saúde.