STF limita prazo para rescisória, e decisão não deve impactar tese do século

O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) fixou, nesta quarta-feira (23/4), tese que define que ações rescisórias só poderão ser propostas até dois anos após o trânsito em julgado da decisão da Corte sobre o assunto do processo, atingindo apenas os cinco anos anteriores ao seu ajuizamento. Embora houvesse a expectativa, o entendimento não deve impactar nas rescisórias da “tese do século”, já que os efeitos serão válidos apenas para o futuro.

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O entendimento é válido para os casos em que o tribunal não modulou especificamente os efeitos dos precedentes vinculantes. Ainda, por meio do posicionamento, o Supremo terá mais autonomia para definir qual o prazo para propor ações rescisórias, voltadas a anular os efeitos de entendimentos judiciais que já transitaram em julgado.

A primeira parte da tese fixada pela Corte nesta quarta prevê que o Supremo poderá, a depender de cada caso, modular os efeitos temporais das decisões, restringindo a extensão do efeito retroativo dos precedentes vinculantes para fins de ação rescisória. A Corte também pode avaliar o cabimento desse tipo de ação considerando o “risco de lesão à segurança jurídica ou interesse social”.

Outro item da tese trata dos casos de execução de sentença e do cumprimento de sentença contra a Fazenda Pública. O texto aprovado assegura ao interessado o direito de alegar a inexigibilidade do título executivo judicial baseado em interpretação ou norma já considerada inconstitucional, mesmo que a decisão do STF tenha sido proferida antes ou depois do trânsito em julgado da sentença, desde que não haja preclusão.

A controvérsia central no julgamento tratava dos artigos 525 e 535 do Código de Processo Civil (CPC). Os dispositivos estabelecem prazo de dois anos para entrar com a ação rescisória, a partir do trânsito em julgado da decisão. Contudo, o Código também prevê que, caso uma decisão definitiva conflite com entendimento posterior do STF, o prazo para ajuizar a ação passa a ser de dois anos a partir da decisão da Corte.

Impactos na “tese do século”

Fontes consultadas pelo JOTA afirmam que o entendimento não deve impactar as ações rescisórias relacionadas à “tese do século” (RE 574.706), no qual o tribunal afastou o ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins. O julgamento aconteceu em 2017, mas a modulação de efeitos foi definida apenas em 2021.

A tributarista Carolina Oliveira Rigon, do ALS Advogados, explica que o Supremo fixou que a interpretação dos dispositivos do CPC deve acontecer conforme a Constituição e com efeitos ex nunc, ou seja, somente serão válidos para o futuro. Com isso, a tese não vai valer para os precedentes vinculantes do STF que já transitaram em julgado.

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A advogada Isadora Barbar, do escritório Finocchio & Ustra Sociedade de Advogados, afirma que “as novas regras sobre o prazo para ajuizamento de ação rescisória somente se aplicam a partir da publicação da ata do julgamento da AR 2876”.

Para ela, “a PGFN não poderá utilizar a decisão para justificar novas ações rescisórias com base na tese do século, se já ultrapassado o prazo de dois anos desde a modulação da decisão em 2021. As rescisórias que não tenham sido propostas até 2023, portanto, não poderão ser ajuizadas com fundamento nessa nova interpretação, uma vez que os efeitos da decisão do STF são exclusivamente prospectivos”.

A percepção é de que, a partir de agora, a União deve diminuir o número de ações rescisórias com o objetivo de reverter decisões favoráveis. Outro especialista ouvido sob reserva, porém, entende que ainda há a possibilidade de a Fazenda se opor à execução do julgado pelo contribuinte, ainda que não tenha rescisória, com base no julgamento dos embargos de declaração.

Justificativas da tese

O único trecho aprovado com ressalvas dos ministros Luiz Fux, Edson Fachin e Dias Toffoli foi o que delimitou o prazo para o ajuizamento da ação e os efeitos retroativos. A justificativa para o texto fixado pela maioria foi a tentativa de estabelecer “um regime mais comedido” para conceder efeitos retroativos de precedentes.

“O item destaca, assim, a necessidade de motivação específica do STF para a eficácia retroativa de seu julgado, estabelecendo, ainda, um regime supletivo, caso o precedente paradigma permaneça omisso”, diz o texto divulgado pelo STF.

Já o terceiro item da tese foi extraído de uma nova proposta do relator, ministro Gilmar Mendes, com o objetivo de evitar a “perpetuação de eficácia de uma interpretação considerada constitucionalmente inadequada pela Suprema Corte”.

O caso começou a ser analisado no plenário virtual, quando o relator votou pela inconstitucionalidade do prazo. No entanto, a discussão foi levada para o plenário físico por um pedido de destaque do presidente da Corte, ministro Luís Roberto Barroso.

Nesta quarta, o presidente afirmou que a tese foi firmada a partir do ponto de vista da maioria dos julgadores, mas não foi proclamado o resultado do julgamento. Barroso frisou que o Plenário apenas fixou a tese na questão de ordem. Agora, caberá a Gilmar Mendes pautar a ação rescisória, ainda sem data prevista para o julgamento de mérito.

Confira a íntegra da tese na AR 2876

“O § 15 do art. 525 e o § 8º do art. 535 do Código de Processo Civil devem ser interpretados conforme à Constituição, com efeitos ex nunc, no seguinte sentido, com a declaração incidental de inconstitucionalidade do § 14 do art. 525 e do § 7º do art. 535:

1. Em cada caso, o Supremo Tribunal Federal poderá definir os efeitos temporais de seus precedentes vinculantes e sua repercussão sobre a coisa julgada, estabelecendo inclusive a extensão da retroação para fins da ação rescisória ou mesmo o seu não cabimento diante do grave risco de lesão à segurança jurídica ou ao interesse social.

2. Na ausência de manifestação expressa, os efeitos retroativos de eventual rescisão não excederão cinco anos da data do ajuizamento da ação rescisória, a qual deverá ser proposta no prazo decadencial de dois anos contados do trânsito em julgado da decisão do STF.

3. O interessado poderá apresentar a arguição de inexigibilidade do título executivo judicial amparado em norma jurídica ou interpretação jurisdicional considerada inconstitucional pelo STF, seja a decisão do STF anterior ou posterior ao trânsito em julgado da decisão exequenda, salvo preclusão (Código de Processo Civil, arts. 525, caput, e 535, caput).”

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