O parcelamento da licitação, também conhecido como divisão em lotes ou adjudicação em itens, consiste na prática de segmentar o objeto divisível de uma contratação em diversas partes ou itens distintos, os quais são subsequentemente licitados ou adjudicados de forma individualizada.
A Lei 8.666/93 já previa o parcelamento do objeto da licitação quando fossem técnica e economicamente viáveis, com o objetivo de ampliar a competitividade da concorrência ao possibilitar a participação de um maior número de licitantes, especialmente micro e pequenas empresas.
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A Lei 14.133/21, a nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, revogou a Lei 8.666/93, mas manteve a mesma diretriz no que diz respeito ao parcelamento da licitação.
Ainda na vigência da Lei 8.666/93, o Tribunal de Contas da União publicou a súmula 247, pacificando o entendimento de ser “obrigatória a admissão da adjudicação por item e não por preço global, nos editais das licitações para a contratação de obras, serviços, compras e alienações, cujo objeto seja divisível, desde que não haja prejuízo para o conjunto ou complexo ou perda de economia de escala, tendo em vista o objetivo de propiciar a ampla participação de licitantes que, embora não dispondo de capacidade para a execução, fornecimento ou aquisição da totalidade do objeto, possam fazê-lo com relação a itens ou unidades autônomas, devendo as exigências de habilitação adequar-se a essa divisibilidade.”
Regra Geral e o Foco na Eficiência Econômica
As contratações realizadas pelas estatais, são regidas pela Lei 13.303/16 (“Estatuto Jurídico das Empresas Públicas e Sociedades de Economia Mista”) que no inciso III do artigo 32, estabelece o dever de observar “o parcelamento do objeto, visando a ampliar a participação de licitantes, sem perda de economia de escala, e desde que não atinja valores inferiores aos limites estabelecidos no art. 29, incisos I e II;”
A ressalva sobre a “perda de economia de escala”, demonstra o foco na vantagem econômica como vetor primordial nas contratações das estatais. Não basta ser possível o parcelamento, ele deve representar um benefício econômico para a estatal, evitando-se a pulverização excessiva que possa acarretar custos administrativos e operacionais superiores aos ganhos de competitividade.
Dessa maneira, se alinha a administração das estatais com a sua natureza e finalidade, evitando-se interpretações meramente abstratas que poderiam conduzir a um fracionamento desnecessário e antieconômico do objeto.
A exigência sobre a economia de escala impulsiona o gestor a realizar uma análise criteriosa sobre a forma mais eficiente de contratar
Assim, a súmula 247 do Tribunal de Contas da União se aplica às estatais no sentido de que o parcelamento é a regra geral, quando o objeto for divisível, mas nem sempre será adotado, deve-se buscar a solução que represente maior eficiência econômica e otimize o uso dos recursos disponíveis.
Justificativa para não parcelar
A estatal deve realizar um estudo técnico aprofundado para analisar, em primeiro lugar, a viabilidade técnica da divisão do objeto em itens ou lotes. Em caso positivo, a análise deve prosseguir para avaliar a viabilidade econômica do parcelamento, buscando identificar se essa estratégia se mostra mais vantajosa em comparação com a contratação global.
Devem ser considerados diversos fatores, tais como o potencial de ampliação da competitividade, o melhor aproveitamento do mercado fornecedor, a possibilidade de obtenção de melhores preços em cada item ou lote, e, crucialmente, a manutenção da economia de escala, requisito previsto no inciso III do artigo 32 da Lei 13.303/16.
Caso o estudo técnico e econômico conclua que a licitação global apresenta uma vantagem econômica, ela deverá ser adotada.
Para tanto, é imprescindível que a decisão de não parcelar seja devidamente motivada e acompanhada das justificativas técnicas levantadas nos estudos que a fundamentaram. A transparência e a demonstração da racionalidade econômica da decisão são elementos essenciais para a conformidade com os princípios da legalidade e da motivação dos atos administrativos.
Breve análise do Acórdão 45/2025
O Tribunal de Contas da União, em sessão plenária, proferiu o Acórdão 45/2025, resultante da análise de representação sobre irregularidades em Pregão Eletrônico conduzido por uma estatal, cujo objeto consistia na contratação de serviços de segurança privada para suas unidades nos estados de Sergipe, Alagoas e Ceará.
A representante alegou a ausência de justificativa prévia para licitação em lote único abrangendo os três estados. Tal conduta violaria o disposto no art. 32, inciso III, da Lei 13.303/2016 e no enunciado da Súmula TCU 247.
A estatal argumentou haver a justificativa técnica e econômica para a não divisão do objeto, mas não apresentou pesquisa consistente e dados objetivos que comprovassem a existência de mercado suficiente para atender ao objeto em lote único, nem sobre a economia de escala e ganhos operacionais.
A unidade técnica do TCU constatou não haver indícios de prejuízo para a competitividade do certame em razão do não parcelamento do objeto e o Plenário, com fundamento nos arts. 143, III, 235 e 237, VII, do Regimento Interno e no art. 9º, I, da Resolução TCU 315/2020, conheceu da representação para, no mérito, considerá-la parcialmente procedente e adotou como medida a expedição de ciência à estatal sobre a impropriedade identificada na licitação, consubstanciada na ausência de justificativa adequada para a adjudicação por preço global e não por itens ou lotes. Trata-se de uma decisão declaratória, cujo objetivo é induzir a estatal a adotar medidas internas preventivas em futuras licitações semelhantes, especialmente no que tange à comprovação dos critérios para o não parcelamento, em conformidade com o art. 32, III, da Lei 13.303/2016 e a Súmula TCU 247.
Conclusão
O parcelamento do objeto da licitação na Lei 13.303/16 deve objetivar a ampliação da competitividade e não pode comprometer a busca pela eficiência econômica nas contratações das empresas estatais.
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Portanto, a adjudicação por itens configura-se como regra geral, mas a busca pela eficiência econômica da contratação também é de suma importância, e a legislação condiciona o parcelamento à manutenção da economia de escala, exigindo do gestor uma análise técnica e econômica criteriosa. A decisão de parcelar ou não deve ser fundamentada em estudos que demonstrem a viabilidade técnica e a vantajosidade econômica da estratégia adotada.
O Acórdão 45/2025 do TCU evidencia a importância de se observar essas diretrizes e reforça a necessidade de justificativas consistentes para a não adoção do parcelamento, em consonância com os princípios da legalidade, da eficiência e da economicidade que regem a administração pública. A correta aplicação do artigo 32, inciso III, da Lei 13.303/16 contribui para uma gestão mais transparente e eficiente dos recursos públicos nas empresas estatais brasileiras.