Grandes empresas de diversos setores já estão se mobilizando para enfrentar o novo cenário trazido não só pela reforma tributária, como para seu período de transição. Representantes de empresas como Tigre, Mercado Livre e IBM explicaram como suas operações já estão mudando para abraçar a substituição de tributos atuais por um Imposto sobre Valor Agregado (IVA) dual durante o evento SYNERGY 2025, promovido pela Thomson Reuters em São Paulo, nesta terça-feira (18/3).
Diante dessa revolução no sistema tributário brasileiro, empresas e especialistas avaliaram que o sucesso da transição dependerá da capacidade das organizações de se adaptarem rapidamente às novas regras. Além disso, a harmonização dos processos internos, a capacitação de profissionais e os investimentos em tecnologia serão essenciais para garantir a conformidade e minimizar impactos financeiros.
O futuro é tech
Um dos pontos mais controversos da reforma é o chamado split payment, sistema que permitirá a retenção automática do imposto no momento da transação financeira. Segundo Daniel Loria, que trabalhou na Secretaria Extraordinária da Reforma da Previdência e participou da discussão, esse modelo reduzirá a inadimplência fiscal e aumentará a transparência no recolhimento dos tributos. Entretanto, já implementado em países como Europa e Polônia, o sistema é alvo de críticas principalmente pelo acúmulo de créditos e demora na compensação.
“O modelo brasileiro levou em consideração todas essas críticas do que foi implementado na Europa e o aprimorou”, diz Melina Rocha, especialista em tributação internacional que também trabalhou na reforma. “Lembrando que a União Europeia agora que está começando a implementar a nota fiscal eletrônica. A gente já tem desde o final da década de 90 aqui”.
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Assim, o split payment exigirá uma integração avançada entre sistemas bancários e ERPs (Enterprise Resource Planning) das empresas, demandando investimentos robustos em tecnologia e segurança cibernética. No Mercado Livre, por exemplo, a empresa já iniciou adaptações tecnológicas para garantir conformidade com o novo sistema.
“Nosso foco tem sido preparar nossa infraestrutura para operar de forma fluida dentro do novo modelo de tributação, garantindo que os vendedores da plataforma também consigam se adaptar sem grandes impactos”, explicou João Lima, Chief Financial Officer no Mercado Livre. Segundo o executivo, a empresa também participou ativamente dos debates sobre a regulamentação da reforma para garantir que o setor de marketplaces tenha uma transição adequada.
A IBM, por sua vez, estruturou um Project Management Office (PMO) dedicado exclusivamente à implementação da reforma. “Estamos investindo na revisão completa de nossos processos fiscais e na integração com novas plataformas que permitirão o cálculo automatizado dos tributos”, disse Leonardo Dias, Chief Financial Officer na IBM. A empresa também está conduzindo benchmarks com outras corporações para entender as melhores práticas de adaptação.
Guerra de talentos
Com a complexidade da nova legislação e a necessidade de um conhecimento técnico especializado, o mercado de profissionais da área tributária deve ficar cada vez mais competitivo, segundo Ribeiro. Empresas estão investindo na retenção de talentos e na contratação de novos especialistas para garantir que suas operações estejam alinhadas com o novo modelo fiscal. “Os especialistas em tributos serão altamente valorizados. Empresas que não investirem na capacitação e retenção desses talentos podem enfrentar dificuldades durante a transição”, afirma Ribeiro, do IBEF.
A Tigre, por exemplo, já reformulou seu time tributário. “Contratamos novos profissionais com experiência em BI e análise de dados para otimizar nossa gestão. A capacidade de transformar informações complexas em dados acionáveis será fundamental para manter a conformidade com a nova legislação”, defendeu Viviane Valente, CFO no grupo.
Pequeno vs grande
A preparação prévia das grandes companhias contrasta com a realidade verificada nas empresas médias e pequenas, geralmente atendidas por contadores, a partir de pesquisa da Reuters. Em um levantamento com 179 profissionais da indústria tributária e contábil, verificou-se que a maioria dos escritórios ainda está nos estágios iniciais de adaptação à reforma tributária.
“É um negacionismo, porque não é uma reforma do departamento de impostos, não é da área de imposto, é de negócio”, disse João Batista Ribeiro, Vice-Presidente do IBEF-SP, durante o evento. “Então tem que estar todo mundo envolvido, desde o vendedor, que tem que saber agora como é que calcula o imposto, qual o impacto; o pessoal de finanças, que tem que recalcular a margem para ser competitivo ou não; o pessoal de logística, que tem que definir como é que é a nova distribuição da companhia, e assim por diante”.
Na pesquisa, cerca de 61% dos entrevistados classificaram suas organizações como “incipientes” ou “iniciantes”, indicando que ainda estão avaliando informações e acompanhando atualizações, mas sem um planejamento estruturado para a transição. Apesar disso, 88% dos profissionais preveem que as mudanças terão um impacto médio a muito alto em suas operações, o que reforça a necessidade de uma preparação mais proativa para evitar contratempos no futuro.