Município quer mudar decisão com recurso especial inadmissível em caso sobre ISS

Tramita no Superior Tribunal de Justiça (STJ) o Recurso Especial 2098242/RJ, interposto pelo município de Mangaratiba contra acórdão que reconheceu o direito da Vale S.A. de anular débito fiscal, sob o fundamento de que não houve falsidade na indicação de preços praticados, o que impede a cobrança do tributo com base no artigo 148 do Código Tributário Nacional (CTN)[1], como pleiteia o referido município.

O recurso está fundamentado em suposta violação aos artigos 148 do CTN e 7º da Lei Complementar 116/2003, segundo as quais o ISS terá como base de cálculo o preço do serviço e será arbitrado quando “omissos ou não mereçam fé as declarações ou os esclarecimentos prestados” pelo contribuinte. O município argumenta que a disparidade entre o preço praticado no caso concreto e o preço médio de mercado autorizaria o arbitramento do valor devido a título de imposto.

Esse é um clássico exemplo de inadmissibilidade de recurso especial, conforme expresso no Enunciado 7 da Súmula do STJ[2].

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O tribunal local entendeu que, quanto ao preço apontado nas operações portuárias, base de cálculo do ISS, “não houve falsidade, e, portanto, não é caso de aplicar o art. 148 do CTN”. Ou seja, o acórdão definiu que a hipótese fática de incidência do artigo 148 do CTN não se materializou, pois o elemento do tipo tributário (“não mereçam fé as declarações”) não aconteceu.

Saber se as declarações do contribuinte são críveis ou não (se merecem fé ou não) é uma discussão sobre fato (elemento de aplicação da norma), e não uma questão de direito. Seria questão de direito, por exemplo, se o tribunal, a despeito de constatar falsidade na declaração do contribuinte, não aplicasse o artigo 148 do CTN.

Eventual reforma da decisão implicaria nova análise dos fatos: seria preciso avaliar se, ao contrário do que foi decidido, houve mesmo falsidade. Para isso, seria necessário reexaminar os fatos que levaram à conclusão de que não houve falsidade.

O STJ já proferiu decisões em que entendeu, corretamente, que recurso especial para discutir os pressupostos fáticos de incidência da norma do artigo 148 do CTN, examinando se a declaração do contribuinte foi ou não correta, versa sobre matéria fática e não deve, por isso, ser admitido.[3]

Esse foi exatamente o posicionamento da ministra Maria Thereza, que na sessão de julgamento do dia 15/10/2024, afirmou “(…) que o acolhimento da pretensão recursal fundado na alegação de que restou comprovado um subfaturamento exigiria uma nova análise das provas contidas nos autos o que a meu ver é vedado no Recurso Especial”.

Essa é a interpretação adequada e está em linha com o entendimento do tribunal sobre os requisitos de admissibilidade do recurso especial.


[1] Art. 148. Quando o cálculo do tributo tenha por base, ou tome em consideração, o valor ou o preço de bens, direitos, serviços ou atos jurídicos, a autoridade lançadora, mediante processo regular, arbitrará aquele valor ou preço, sempre que sejam omissos ou não mereçam fé as declarações ou os esclarecimentos prestados, ou os documentos expedidos pelo sujeito passivo ou pelo terceiro legalmente obrigado, ressalvada, em caso de contestação, avaliação contraditória, administrativa ou judicial.

[2] “A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial.”

[3] STJ, 2ª T., REsp 1.790.898/BA, rel. Min. Francisco Falcão, j. em 25.10.2022, publicado em 21.12.2022; STJ, 2ª T., REsp n. 1.816.701/SP, rel. Min. Herman Benjamim, j. em 25.06.2019, publicado em 28.06.2019.

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