O que esperar do novo comando do Congresso

O novo comando do Congresso que será eleito neste sábado (1/2) deve representar um continuísmo sem continuidade no próximo biênio. Isto é, vai seguir avançando no protagonismo da agenda do país, privilegiando a pauta econômica e avesso a temas ideológicos no plenário. É um norte que poderá mudar a depender da dinâmica da eleição presidencial, pois os novos presidentes da Câmara e do Senado sentarão na cadeira já interessados na busca pela reeleição ao cargo, em 2027.

A gestão de Hugo Motta (Republicanos-PB) terá o desafio de suceder Arthur Lira (PP-AL), o mais forte presidente da Câmara da história recente, capaz de contar nos dedos as derrotas em plenário ao longo de quatro anos – e ainda vitorioso na escolha do sucessor. Na lógica de expoentes do centrão, Motta é hoje o nome mais capacitado dentro da Casa para a tarefa. Até porque, o deputado já era a escolha preferida do então presidente da Câmara, Eduardo Cunha, para sucedê-lo se não tivesse sido cassado, em 2026.

Motta, de 35 anos, chega como o mais jovem mandatário a assumir a função com experiência de gente grande, adquirida tanto nos quatro mandatos como deputado, como em casa, no DNA da família que comanda o município de Patos Paraíba, desde a década de 50. Termos como ‘bom negociador, diálogo, dócil, de palavra’ são alguns dos mais repetidos entre deputados a respeito do perfil do novo presidente.

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O novo comando da Câmara chega preocupado em não envelhecer rápido no cargo, disposto a ser menos analógico na comunicação e mais atento à opinião pública. Quer fugir da polarização. Pretende suavizar a centralidade das negociações da era Lira, sendo mais aberto ao diálogo com as bancadas que deve o eleger quase por aclamação. É esperado que as comissões permanentes possam retomar algum grau de relevância, assim como mais previsibilidade na pauta de votações, debatida com o colégio de líderes que deve seguir sendo o principal termômetro para medir o amadurecimento dos temas.

O Planalto aposta em uma melhora na governabilidade com Motta à frente da Câmara. Seja porque o parlamentar, egresso do MDB, possui excelente relação com nomes como o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e o ministro dos Transportes, Renan Filho. Seja porque, antes de o PT fechar apoio ao nome dele, Lula teria feito chegar a Motta um pedido de apoio para a tramitação do projeto de isenção do Imposto de Renda, ainda a ser enviado. O entorno do deputado do Republicanos rechaça qualquer compromisso de agenda, embora as pautas econômicas devem seguir sendo priorizadas, de modo em que a Câmara deve seguir sendo fiadora das negociações.

Já em relação ao retorno de Davi Alcolumbre (União Brasil-AP) no comando do Senado, o governo avalia que a relação entre poderes deve piorar. Não à toa, o Planalto cedeu, no fim do ano passado, metade das indicações de agências reguladoras para o senador, mantendo o mesmo patamar de indicação que obteve na gestão de Jair Bolsonaro. Isso sem considerar que Alcolumbre já foi o padrinho da indicação do ministro de Integração e Desenvolvimento Regional, Waldez Góes, no início de Lula 3.

Nos corredores da Esplanada, o futuro presidente da Casa é conhecido como um político que exige muito em termos de emendas e indicações na máquina, sem ter o mesmo apetite para cumprir acordo na entrega de votações estratégicas. No Senado, mesmo na gestão de Rodrigo Pacheco, Alcolumbre era chamado por colegas como o presidente efetivo da Casa, porque era o responsável pelas negociações orçamentárias envolvendo os senadores e o governo.

Ao contrário da Câmara, em que a aparente neutralidade de Lula ajudou a unificar o consenso por Motta mesmo que isso implicasse em comprar ruído com o PSD de Gilberto Kassab, no Senado, Davi Alcolumbre já estava eleito independentemente da estratégia do PT no jogo da sucessão. Isso significa que o senador retorna ao cargo com mais liberdade para negociar a agenda, sobretudo com a oposição que, ao contrário da segunda eleição de Pacheco, não lançou candidatura própria e vai assumir a Primeira Vice Presidência com Eduardo Gomes (PL-TO).

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Há meses, Alcolumbre tem traçado a aliados em conversas privadas que espera um Senado ainda mais à direita depois da renovação de ⅔ da Casa, ano que vem. E é diante desse desenho que deve calcular os passos na tramitação de pautas que envolvem, por exemplo, limitação ao poder de atuação do Supremo Tribunal Federal (STF).

É do STF, aliás, que repousa a maior ameaça apresentada até aqui para o avanço da nova gestão. Sobretudo uma investigação relacionada a desvio de emendas parlamentares com maior potencial de estrago da própria gestão, que investiga a conexão de nomes do União Brasil com o empresário Marcos Moura, conhecido como Rei do Lixo. O caso está sob as mãos do ministro Kassio Nunes Marques.

Fontes dos Três Poderes projetam meses de tumulto neste primeiro semestre, em meio a desdobramentos dessa e de outras investigações que podem atingir parlamentares. Não se deve esperar uma nova Lava Jato, de acordo com essas fontes, já que o atual Procurador Geral da República (PGR), Paulo Gonet, não tem intenção de repetir Rodrigo Janot, ex-PGR, e não há centralidade do ministro Flávio Dino, até aqui, na relatoria de todos os casos envolvendo emendas na Corte. Ainda assim, é sobre esse gelo fino que tanto Motta quanto Alcolumbre terão que caminhar para buscar preservar as prerrogativas do Congresso na gestão orçamentária.

Depois que assumirem os cargos, o novo comando do Congresso deve ser ouvido por Lula sobre a reforma ministerial. A tendência é para que o nome do líder do MDB na Câmara, Isnaldo Bulhões (MDB-AL) seja levado para comandar a pasta da articulação política tocada pelo ministro Alexandre Padilha.

O PT resiste à entrada do centrão no Planalto. Mas há quem no Congresso vislumbre que, se a troca ocorrer, pode ser uma repetição do modelo adotado por Jair Bolsonaro na segunda parte do mandato, com a chegada do senador Ciro Nogueira (PP-PI) na Casa Civil, que representou uma melhora significativa na relação entre poderes.

Na ocasião da posse do cardeal do centrão, o então presidente da República se referiu à chegada do novo ministro como “a entrega da alma do governo”. Dessa vez, a entrega da fatura da principal pasta responsável pela negociação de emendas poderia dar vantagem para estabelecer uma aliança mais sólida com parte do centro no palanque de 2026. Na atual piora da popularidade observada nas pesquisas recentes, hoje é Lula quem precisa dar mais do centrão do que o contrário.

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