Nomeação para diretoria suspende contrato de trabalho? Nem sempre

A discussão sobre a natureza jurídica do contrato de trabalho do diretor de empresa envolve um ponto central do Direito do Trabalho: a compatibilidade entre autonomia e subordinação.

O desafio está em diferenciar o diretor-estatutário, que não mantém vínculo empregatício, do diretor-empregado, cuja relação com a empresa pode permanecer regida pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), desde que estejam presentes os elementos que caracterizam a relação de emprego.

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A CLT define o empregado como aquele que presta serviços com pessoalidade, onerosidade, não eventualidade e subordinação ao empregador. O contrato de trabalho, por sua vez, estabelece essa relação de dependência, colocando o trabalhador sob o poder diretivo e disciplinar da empresa. Diante desse conceito, surge a questão: um diretor pode ser, simultaneamente, empregado? A resposta reside na análise da subordinação jurídica, aspecto fundamental para a caracterização do vínculo celetista.

O Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (TRT-1) analisou, no processo 0010105-12.2015.5.01.0049, a situação de um trabalhador que foi nomeado Diretor Estatutário. A corte concluiu que, ao assumir essa posição, o autor passou a exercer atividades distintas daquelas desempenhadas anteriormente, recebendo remuneração significativamente maior.

A sujeição ao Conselho de Administração, por si só, não caracteriza subordinação, uma vez que decorre da própria estrutura das sociedades anônimas prevista na Lei 6.404/76. Esse critério se mostra determinante para afastar a hipótese de fraude contratual e confirmar a inexistência de vínculo celetista.

A distinção entre diretor-empregado e diretor-estatutário se manifesta, sobretudo, na autonomia para tomada de decisões. O diretor-estatutário é eleito pelo Conselho de Administração e conduz suas atividades sem estar sujeito ao poder disciplinar da empresa.

Já o diretor-empregado, caso continue a seguir regras e jornadas como os demais trabalhadores, poderá manter seu contrato sob o regime celetista. Essa distinção reflete, inclusive, na forma de remuneração: enquanto o diretor-estatutário recebe pró-labore, sem incidência de verbas trabalhistas, o diretor-empregado pode ter salário e benefícios garantidos pela CLT.

Fundamentos do Direito do Trabalho

Para compreender melhor essa distinção, é essencial recordar alguns institutos fundamentais do direito tutelar. O artigo 3º da CLT define empregado como toda pessoa natural que presta serviços a outrem, com pessoalidade, onerosidade, não eventualidade e subordinação. Esses são os pilares da relação de emprego e orientam tanto a jurisprudência quanto a doutrina trabalhista.

O contrato de trabalho, por sua natureza, estabelece uma relação de sujeição do empregado ao empregador, mas dentro dos limites pactuados. O acordo pode ser tácito ou expresso e deve respeitar a natureza cogente das normas tutelares, ou seja, regras imperativas que garantem a dignidade e a proteção do trabalhador. Como afirmam Orlando Gomes e Elson Gottschalk[1], a subordinação hierárquica é decisiva na caracterização do contrato de trabalho. Assim, sempre que houver essa relação de dependência, há vínculo empregatício.

O contrato de trabalho também se distingue pelo seu caráter de trato sucessivo, ou seja, sua vigência é contínua e sem prazo determinado, salvo exceções legais. Durante sua execução, podem ocorrer interrupções ou suspensões. A interrupção ocorre quando o empregado não trabalha, mas continua recebendo salário e tendo seu tempo de serviço computado. Já a suspensão paralisa todas as obrigações principais do contrato, sem contar como tempo de serviço.

A suspensão do contrato de trabalho

A suspensão do contrato de trabalho é um elemento-chave nesse contexto. Ela ocorre quando o empregado não presta serviços e não recebe salário, interrompendo o cômputo de tempo para fins trabalhistas. No entanto, se a subordinação persiste, o contrato não é suspenso, mas apenas interrompido, garantindo ao trabalhador os direitos celetistas.

No agravo de instrumento 101843-60.2017.5.01.0001, o TST reafirmou essa lógica ao reconhecer que, mesmo ocupando o cargo de Diretor Financeiro, o autor manteve sua condição de empregado subordinado. Nesse caso, a empresa foi condenada ao pagamento das verbas trabalhistas, pois não havia justificativa para suspender o contrato.

Esse entendimento reforça o princípio da primazia da realidade, pelo qual a avaliação do vínculo empregatício deve considerar a realidade dos fatos, e não apenas a formalidade dos documentos. O recurso de revista 0203800-35.2008.5.15.0097 exemplifica essa abordagem: o TST reconheceu o vínculo celetista de um diretor que, apesar do título, permanecia subordinado ao presidente da empresa, recebendo salário, benefícios e tendo FGTS e INSS recolhidos regularmente. Diante dessas evidências, concluiu-se que a nomeação foi uma tentativa de mascarar a relação empregatícia e sonegar direitos trabalhistas.

A dualidade diretor-empregado e diretor-estatutário

A empresa, enquanto estrutura organizacional, divide seus membros entre aqueles que exercem funções técnicas e aqueles que exercem funções de comando. Como aponta Rubens Requião[2], no campo técnico, os colaboradores executam funções operacionais ou estratégicas, enquanto no campo jurídico, concretiza-se a atividade empresarial por meio de decisões e diretrizes. O diretor-estatutário se insere neste segundo grupo, exercendo comando e não mera função subordinada.

A legislação societária estabelece que os diretores de sociedades anônimas são eleitos e destituídos pelo Conselho de Administração, sem vínculo empregatício. Essa autonomia no desempenho do cargo, bem como a ausência de controle sobre sua jornada e funções diárias, afasta a subordinação jurídica necessária para configurar um contrato de trabalho.

Contudo, no caso do diretor-empregado, há uma peculiaridade: ele pode ser eleito para um cargo de comando sem que seu vínculo celetista seja rompido, desde que continue subordinado às diretrizes empresariais. Essa situação configura uma alteração substancial do contrato de trabalho, pois o empregado passa a representar o empregador e a ter um poder de iniciativa muito maior.

Por isso, o TST consolidou o entendimento de que a nomeação para cargo de diretor suspende o contrato de trabalho, salvo se permanecer a subordinação. Essa diretriz evita fraudes trabalhistas e garante segurança jurídica às relações laborais.

Conclusão

A natureza jurídica do contrato de trabalho do diretor de empresa exige uma análise detalhada da subordinação existente. A escolha entre o regime celetista e a posição estatutária não pode ser pautada apenas pela denominação do cargo, mas sim pela realidade da relação de trabalho.

Se houver subordinação efetiva, o vínculo empregatício permanece, assegurando ao trabalhador direitos como FGTS, férias e 13º salário. Caso contrário, prevalece a natureza estatutária, afastando esses direitos e restringindo a relação a um vínculo exclusivamente civil e societário.

A distinção entre diretor-empregado e diretor-estatutário é essencial para garantir a segurança jurídica e evitar fraudes que possam prejudicar os direitos trabalhistas. O Direito do Trabalho, amparado pela primazia da realidade, continua a proteger os empregados contra tentativas de descaracterização do vínculo celetista por meio de investiduras meramente formais em cargos de diretoria.


[1] GOMES, Orlando; GOTTSCHALK, Elson. Curso de direito do trabalho. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, p. 152.

[2] REQUIÃO, Rubens. Curso de direito comercial. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 1984, p. 134-135.

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